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O jazz contemporâneo do Sinequanon
O Sinequanon é um grupo de jazz contemporâneo que nasceu da parceria entre os músicos Lupa Santiago e Carlos Ezequiel. Após experimentarem vários formatos e gravarem o CD “Images” – indicado ao Grammy Latino como Melhor Álbum de Jazz em 2000 – formaram o quarteto em 2001.
A Eonline conversou com o bateirista Carlos Ezequiel, entre outros temas, sobre seu trabalho com o Sinequanon e a relação com o saxofonista David Binney, convidado especial para a série de shows que foi apresentada no Sesc Jazz & Blues 2014: “O jazz é uma música que não pertence mais aos EUA, está por toda a parte. Como diz o Wayne Shorter, jazz quer dizer "eu te desafio. Nós nos desafiamos constantemente - às vezes dá certo, às vezes não tanto. Mas aceitamos o risco”. Atualmente integram a banda, além de Carlos na bateria e Lupa na guitarra, o saxofonista Vitor Alcântara e o Sidiel Vieira no contrabaixo.
Confira na íntegra a entrevista com Carlos Ezequiel.
Eonline: Você nasceu em Maceió e já escreveu um livro sobre baião e ritmos nordestinos. Ao mesmo tempo você tem um contato intenso com a música de diferentes países. Estas duas vivências se conectam no seu processo de criação?
Carlos Ezequiel: Sim, com certeza. Minhas primeiras experiências ouvindo e tocando música instrumental foi através do repertório de artistas como Hermeto Pascoal e Egberto Gismonti, que sempre exploraram elementos da música nordestina brasileira, enquanto ao mesmo tempo incorporavam referências do jazz e da música erudita. Minha carreira acabou seguindo a mesma direção, embora por caminhos diferentes.
Como você define a música que faz com o Sinequanon?
C.E.: O Sinequanon é um grupo de jazz contemporâneo. Trabalhamos bastante com elementos como harmonia não-funcional, polirritmia e improvisação coletiva, que são características bastante frequentes no trabalho de artistas de jazz de todo o mundo, assim o som do grupo não se define muito geograficamente. O jazz é uma música que não pertence mais aos EUA, está por toda a parte. Como diz o Wayne Shorter, jazz quer dizer "eu te desafio". Nós nos desafiamos constantemente - às vezes dá certo, às vezes não tanto. Mas aceitamos o risco.
Sinequanon no Instrumental Sesc Brasil em 2010.
Em entrevista ao site Paulicéia do Jazz, em 2013, você disse que estava escutando incessantemente a música de David Binney, como uma referência. Nesta turnê você estará se apresentando com ele. Como se deu esta aproximação?
C.E.: Pois é, já há alguns anos eu admiro o trabalho do Binney, e curiosamente um contrabaixista irlandês com quem toco frequentemente, o Ronan Guilfoyle, me convidou pra um possível projeto em que o Binney faria parte. Infelizmente o projeto ainda não aconteceu, mas acabamos mantendo contato, e acabamos convidando ele pra participar de alguns shows do Sinequanon. Ele curtiu o som do grupo, e aí aconteceu está oportunidade tocarmos no Festival Jazz & Blues. O Binney tem uma agenda muito intensa, então na verdade tivemos muita sorte de dar tudo certo.
O que você admira no trabalho de Binney?
C.E.: O seu estilo de composição é muito rico. Como também sou compositor, isso me atrai bastante. Ele emprega recursos que muitos compositores hoje em dia dispensam, coisas aparentemente simples como o uso de uníssono entre dois ou três instrumentos, um cuidado muito bacana com texturas, que instrumentos tocam que partes da melodia... Além disso tudo, ele é um improvisador incrível, então é um artista de jazz dos mais completos que temos hoje.
Performance de David Binney Halifax Jazz Fest, em 2010.
O que muda no produto final de uma música em que a bateria é executada como elemento melódico?
C.E.: Na verdade, grandes bateristas sempre foram grandes melodistas. Isso é perceptível tanto em músicos de jazz como Elvin Jones e Art Blakey, como em bateristas brasileiros como Edson Machado e Milton Banana. A música é a melodia (não existe direito autoral sobre padrões rítmicos ou sequências de acordes), então se você não incorpora a melodia no que você toca, não está tocando música - está tocando outra coisa... Se for pra tocar células e padrões rítmicos, uma bateria eletrônica ou um computador sempre farão um trabalho melhor do que a gente. Mas eles não são capazes de tocar música, de reagir às ideias melódicas sendo tocadas pelos outros instrumentistas. Enquanto os computadores não souberem fazer isso, nosso trabalho está garantido.
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