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Para com por São Paulo

Por Ricardo Muniz Fernandes

Visitando o prédio do Sesc 24 de maio me emocionei. Chapei naquele lugar, onde vivi minha juventude, minha paternidade, lá eu soube que ia ser pai. E hoje agora vi esta declaração de amor à São Paulo e seu lado mulher: Mesbla.

Sesc 24 de maio!

O prédio é todo cinza, mas tem alguns detalhes fundamentais que são rosa pálido. Que não sustentam, mas feminilizam e adoçam o prédio, dão o feminino/fundamento a ele, o molecular que é o que vale hoje. A suavidade necessária e contrária às mordidas.

As rampas que vão nos elevando, nos levando ao cume, e lá do alto, uma homenagem e leitura de São Paulo, os pedaços de que ele é feito: os fundos do municipal, o pico do banespa, o barroco do martinelli, o stalinista cúbico do banco do brasil e tudo suportado por um imenso azul espraiado e refletindo o céu.

A água da piscina é a água, mulher!

E as grades de segurança tão macias nos trançados de cabos de aço, suaves emaranhados.

Doces grades: também mulher!

E o melhor de tudo é o diálogo entre o espaço de exposição, ao mesmo tempo longe e perto do cubo branco, querendo ser cubo branco, mas quebrado por muitas colunas e perspectivas e ainda mais pela cidade do lado de fora, uma cidade vívida, desgastada, usada, abusada, invasivo centro velho dolorido e vivo. O espaço devassa e é devassado pelas lojas miseráveis e contingentes. Vernaculares rítmicas do reggae. É impactante o contraste, o confronto. É São Paulo! Demais SP. E a brancura de colunas, imaculadas frente a sujeira, ao acúmulo, ao desgaste e confusão. Centrão. Espaço de exposição e reflexão sobre a cidade.

Num café no topo, cinza espalhado, rebaixado, e no fundo um armário gigante cor de rosa. Um bloqueio do deslize do olhar pela cor suave. Como um naco anguloso de pele entrevisto entre o geométrico vestido. Rosa na borda vizinha de espelho d'água, borda de riacho construído para molhar os pés, atravessar e chegar na outra margem, parapeito para a cidade com sua ginga, existência plena e confusa. Riacho para a outra margem, a terceira margem daqui e de lá. Do cubo e do disforme.

Este riacho de concreto e as paredes rosas, suas escarpas, modulam o ritmo sobe e desce das rampas. E ao lado das rampas um aramado sobre o vidro, geometria poética gigante sobreposta ao vídeo e quebrada, esfacelada nos pés dos bancos amarelos que montam conversa com o vidro e com as janelas a balbúrdias dos escritórios vizinhos. Sentar no amarelo dos bancos, de frente aos aramados, sobreposto ao vidro que não esconde a cidade sem planos, é ficar balançando entre a cinza cidade e o branco centro cultural como funâmbulos, ser passagem e não destino. Pensar em Nietzsche. Em Jurupari. Ficar sentado é poder sonhar e brincar de ser malabarista, ou macaco naqueles emaranhados e geometria.

Mas o que fica, o que nos fisga e fica ao sair dali e mergulhar na multidão dos camelôs, das galerias de rock e reggae, da balbúrdia e acúmulo e mistura do pavimento das ruas e calçadas, é o rosa delicado que recobre a gigante coluna sustentação do todo. Relação entre a força e a delicadeza, de coluna Atlas mitológico, osso e o que o recobre sua pele e seu rosa. O olhar se faz mão deslizando sobre a suavidade da cor, do rosa e os ângulos retos do cinza do duro das paredes. Relação íntima Sesc e Paulo Mendes da Rocha em declaração e ação de amor na cidade, com a cidade e para a cidade.

Ricardo Muniz Fernandes é editor da N-1, produtor cultural que traz Bob Wilson para estrear o teatro do Sesc 24 de Maio.

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