Sesc SP

Matérias do mês

Postado em

Bikes e Becos da Capital

Por Renata Falzoni

Foi de bicicleta pelo centro da cidade que me apaixonei por São Paulo. Eram os anos 70 e naquela época nossa metrópole ainda estava aberta as pessoas. Minha diversão consistia em pedalar sem as mãos no guidão, equilibrando-me enquanto surfava a magrela pelos calçadões da cidade. Com os olhos para o alto, reconstruía mentalmente a arquitetura dos edifícios, erguidos no princípio do século 20. Naquela época só era possível “ver” as fachadas na imaginação, pois elas jaziam tampadas por imensos cartazes dos comércios.

Embora São Paulo ainda fosse acessível, a tal da “modernidade” já era eficiente em escondê-la... matá-la de todas as formas. 

Um dos roteiros que mais gostava era rodear o Páteo do Colégio, de um lado abria-se a ampla baixada do Rio Tamanduateí e o Parque Dom Pedro encoberto por viadutos; de outro, a colina onde São Paulo se firmou a salvo das enchentes e das doenças dos charcos.

Hoje um estacionamento de automóveis ocupa e cerca parte do Páteo e com isso não se pode mais observar a baixada, o Parque Dom Pedro, muito menos dar a volta pelo Colégio.

Esse é um dos milhares de exemplos de “pequenas perdas” de espaços, que ao se acumularem pelas décadas seguintes, acabou com o acesso à cidade de São Paulo.

Sempre que passo pela Rua Dr. Bitencourt Rodrigues, a parte baixa do Largo, paro em frente ao que seria a saída do Beco do Pinto, uma escadaria entre a Casa da Imagem de São Paulo e o Solar da Marquesa de Santos. A passagem está, fechada, gradeada, isolada, perdida no tempo. Entristece por ser mais um testemunho vivo da segregação de espaços a que condenamos nossa cidade.

Mas o bom da vida é que ela persiste e sempre nasce uma luz no fim do túnel. Com a Lei da Cidade Limpa literalmente redescobrimos as fachadas, com a remodelação de calçadas e o centro mais vivo, recuperamos o prazer de ir e vir a pé, as ciclovias então, deram o tom cosmopolita que toda a cidade sintonizada no século 21 já tem.

Fica o meu convite, pegue a sua bicicleta, convide a sua melhor companhia e venha pedalar pelo Centro de São Paulo. Se for em um domingo bingo, tem ciclofaixa de lazer e muita gente turistando pela nossa querida São Paulo.

Não deixe de passar no Páteo do Colégio, intrigue-se com o Beco do Pinto e convido-o a fazer uma travessura. Procure o sino, isso mesmo, tem um sino no canto do Largo do Colégio, dê uma badalada e sorria... você terá soado o Marco da Paz.

Renata Falzoni é arquiteta, jornalista e cicloativista.