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Entre o rádio de pilha e o download

Banda Seu Chico
Banda Seu Chico

“Quem Te Viu, Quem Te Vê” parte de um samba até se transformar em uma versão de “Paranoid Android”, da banda inglesa de rock alternativo Radiohead. O compasso ternário de “João e Maria” é mantido e emendado na introdução de “La Valse d’Amelie”, valsa composta pelo francês Yann Tiersen para o filme “O Fabuloso Destino de Amélie Poulain”.

Reunindo-se em Recife (PE), o vocalista da Banda Seu Chico, Tibério Azul; os percussionistas, Bruno Cupim, Negro Grilo e Amendoim; os violonistas, Vinícius Sarmento e Rodrigo Samico (sete cordas); e o pianista, Vitor Araújo, revisitam, com ouvidos atentos também ao que vem de fora do Brasil, canções de Chico Buarque.

O registro das releituras está no CD e DVD ao vivo “Tem Mais Samba”, lançados em 2010. No making of da gravação em vídeo, vale destacar o trecho no qual os integrantes jogam bola e conversa fora com o compositor carioca, que, paralelamente à carreira musical, fundou o time de futebol Politheama.

Tibério Azul contou à EOnline sobre a trajetória da Banda Seu Chico, o perfil do público que assiste aos shows, a repercussão de sua carreira solo, entre outras curiosidades. Os principais trechos da conversa você pode conferir a seguir:

EOnline: O cantor e compositor China disse, em entrevista à Rádio Estadão, que o grupo pernambucano Del Rey começou o projeto para “tomar cerveja de graça”. E a Banda Seu Chico? Desde o início buscava uma seriedade ou a intenção era essa também?
Tibério: Aqui em Recife quando uma criança duvida da outra costuma desafiá-la dizendo: duvido de ó dó! Acho que a Seu Chico começou assim, nos sentimos desafiados. A obra de Chico nos desafiava, e estávamos sedentos por algo assim. Até hoje não temos seriedade na banda, não traçamos metas, projetos ou algo do tipo. Curtimos o desafio como quem salta de paraquedas, mas rindo alto, se divertindo. Nossa única meta é ser divertido, e de preferência muito.

 

EOnline: Como foi a turnê pelo Brasil de divulgação do CD e DVD ao vivo “Tem Mais Samba”? Vocês pensam em gravar um disco no estúdio?
T. A.: Viajamos quase o Brasil inteiro. A única região em que ainda não tocamos foi o sul do país. Fomos para lugares incríveis, sempre com um público incrível. Às vezes só gostaria de ter mais tempo em cada lugar para conhecer melhor os recantos brasileiros.

Não pensamos em nada sobre o futuro da Seu Chico. O futuro da banda vai surgir como tudo surgiu até agora, de forma espontânea, sem pressão ou planos mirabolantes. O que vai surgir disso nem nós sabemos, essa é a magia do grupo: levamos o improviso às suas últimas consequências, em cima do palco e fora dele.

EOnline: É comum pais e filhos estarem juntos na plateia assistindo aos shows? Os seus pais admiram o trabalho de Chico Buarque? Acompanham a sua carreira?
T. A.: Nos shows da Seu Chico é muito comum os filhos trazerem os pais para o show, e é lindo. Na maioria das vezes nossas apresentações são em lugares mais jovens, tumultuados, na madrugada, e acabam por afastar as pessoas de mais idade. Por isso nosso público foi cada vez mais migrando para os jovens. Mas sempre tivemos esse leque de aceitação das gerações. Tocar no Sesc é maravilhoso por poder juntar de forma mais aconchegante essas gerações.

Na minha casa, se ouvia o que tocava no rádio simplesmente. Venho de uma família de interior que ralou demais para alcançar algum conforto e não teve caminho para "curtir" arte e cultura. Então quase não se ouvia Chico. Mas hoje me acompanham com uma voracidade e prazer incríveis. Estão sempre nos shows, perguntando, oferecendo alguma ajuda, sugerindo.

EOnline: As canções que a Banda Seu Chico revisita são as mais famosas do compositor ou vocês as escolheram depois de estudar a discografia dele?
T. A.: Nós não estudamos a discografia de Chico. Oficialmente, nosso vínculo é com as canções e não com o artista. Na verdade, eu considero que a banda Seu Chico ao invés de fazer uma homenagem a Chico, faz mesmo é uma bela sacanagem. A gente rouba as canções, se apropria delas como se fossem nossas.

Dessa forma, a escolha se dá de forma egoísta: escolhemos as canções que os arranjos ficaram mais legais e que a gente mais se diverte. Se ela foi ou é um sucesso, não nos importa. E para arranjar, surge sempre de forma espontânea alguém que puxa de repente no show uma ideia aleatória que funciona.

EOnline: Você costuma comprar CDs ou prefere baixar as músicas na internet? Considera importante os discos serem ouvidos por inteiro ou acredita ser mais proveitoso escutar apenas os hits?
T. A.: Eu adoro discos, compro muitos e sempre estou comprando novos. Gosto do cheiro das coisas, gosto de sentir, pegar. Considerando o conceito de "álbum" importantíssimo, no meu trabalho solo levo isso às máximas consequências. Agora, por exemplo, estou finalizando as composições do meu segundo disco solo e o processo que sigo é antigo, valorizando o tema do disco, o título, contando uma história com começo, meio e fim.

Mas, ainda assim, sou a favor dos novos caminhos e entendo perfeitamente essa nova geração que tem perdido o vínculo com o disco físico através do download. O download hoje me serve como teste, eu baixo o disco, ouço. Se curtir, vou lá e compro. Acho que todo caminho é válido e o mercado caminha para um modelo menos autoritário e mais recortado: terá quem compre discos, baixe o disco completo, baixe só os hits, compre vinil, prefira fita k7. Vejo esse caminho com bons olhos.

EOnline: Como está sendo a repercussão do seu primeiro disco solo, “Bandarra”? Fãs da Banda Seu Chico e de Mula Manca estão elogiando o trabalho?
T. A.: Uma repercussão fantástica, bem além do que eu poderia imaginar. Recebi uma série de abraços desde a gravação e produção do disco até sua divulgação, shows e imprensa. E fiquei impressionado como o disco se capilarizou pelo público da Seu Chico e mais ainda pelo saudoso público da Mula Manca.

Em pouco tempo passei pelos principais festivais do país, vendi mais de 5 mil discos, mais de 40 mil downloads, meu clipe ultrapassou as 60 mil visualizações no Youtube, fui para São Paulo, Rio, Curitiba, Natal, Maceió, Crato, Recife... Vixe. Demorei um pouco para assimilar isso tudo, com a rapidez das coisas.

Agora estou finalizando as composições do meu segundo disco, que será lançado no ano que vem. Quero ainda apresentar o “Bandarra” por aí em shows, saraus, bate-papos, pockets. Meu conceito no trabalho autoral é bem solto indo em busca das pessoas. Acho que, nesse ponto, sofro uma enorme influência da Seu Chico...