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Hospitalidade ou hostilidade?

Elisa Carareto
Elisa Carareto

Em sua terceira edição, o Ciclo de Reflexões Ética no Turismo acontece neste mês de maio no Centro de Pesquisa e Formação do Sesc São Paulo com a temática “Hospitalidade e Hostilidade”. O evento tem por objetivo difundir os valores do Código Mundial de Ética no Turismo (do qual o Sesc é signatário desde 2015), e traz especialistas para debater os dilemas éticos da hospitalidade nos dias atuais.

“A proposta de abordagem do tema da hospitalidade (e de seu contrário, a hostilidade) no contexto do ciclo ética em turismo, em sua terceira edição, vai ao encontro da relevância que o assunto tem adquirido nas décadas mais recentes, em função dos diversos episódios relacionados ao terrorismo, violência, preconceito, xenofobia, intolerância e racismo, em todo o mundo. infelizmente, muitos desses episódios têm sido registrados no âmbito das mobilidades turísticas, contrapondo residentes e visitantes, anfitriões e hóspedes, locais e turistas. Tendo essas questões em mente, resolvemos reunir pesquisadores e estudiosos do tema, a fim de que possamos ter maior amplitude de visão sobre a importância dos conceitos de hospitalidade e hostilidade e sua aplicação no contexto das viagens.” -  explica Ana Paula Spolon, responsável pela curadoria e mediação no evento. 

A forma como somos acolhidos e simples interações como uma escuta mais aberta, um cumprimento, um sorriso, pode mudar toda a perspectiva sobre o local visitado, a cidade e até mesmo as pessoas que ali vivem. Quem nunca ouviu dizer, por exemplo, que o povo brasileiro é um dos mais hospitaleiros? A imagem do povo cordial, alegre, afetuoso e agregador contrasta com os casos de intolerância e preconceito que nem sempre são tão noticiados mas acontecem com uma frequência preocupante.

Sérgio Buarque de Hollanda, em seu livro “Raízes do Brasil”, defendeu a “cordialidade” no significado etimológico da palavra, que deriva de “coração”. Segundo o historiador, o povo brasileiro costuma ser muito passional, ou seja, se orienta muito mais pelos sentimentos do que a razão. Nas palavras do autor: “a inimizade bem pode ser tão cordial como a amizade, visto que uma e outra nascem do coração”.

A origem da palavra hospitalidade vem do latim “hospitium” (ato de receber e hospedar o estrangeiro), e quando analisamos o seu significado sobre a ótica das viagens, da relação do turista com o local visitado, ela ganha algumas dimensões que vão além de atitudes baseadas em um código moral particular ou no comportamento altruísta de cada um. Estas são características muito particulares, mas será possível pensar em hospitalidade no sentido de uma ética universal e de uma política internacional?

"O que é hospitalidade e por que estamos falando tanto disso?" é o tema da palestra de abertura, no dia 22/05, com os professores Ana Paula Spolon (Universidade Federal Fluminense) e Leandro B. Brusadin (Universidade Federal de Ouro Preto), refletindo sobre os significados das ideias e das práticas de hospitalidade e hostilidade no contexto social contemporâneo do turismo em nível mundial, por meio de estudos e pesquisas nas mais diversas áreas do conhecimento.

Segundo o professor Luiz Octávio de Lima Camargo ( Universidade Anhembi Morumbi e Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo), a hospitalidade pode ser entendida também como um ritual de passagem com marcações precisas e leis claras, ainda que não escritas, com a função de transformar o desconhecido em hóspede ou, em fórmula mais simples, para restituir o calor humano perdido nas relações cotidianas. O minicurso Fundamentos da Hospitalidade, ministrado por ele no dia 22/05, apresentará as noções de hospitalidade, hospitabilidade, inospitalidade e hostilidade, lançando olhar sobre a atualidade da discussão sobre o tema.

Tratada como o bem receber, reconhece-se a hospitalidade como uma construção humana da relação com o outro, quer cidadão ou imigrante. No encontro “Fenômenos Migratórios e Dilemas da Hospitalidade: Cultura Urbana e Turismo”, que acontece no dia 24/05, a abordagem é centrada no fenômeno imigratório para discussão de políticas públicas para minorias e a estruturação da Lei Municipal para População Imigrante, bem como a influência do turismo para a preservação e recriação dos atributos do legado imigrante na cidade de São Paulo. Para debater sobre este assunto os convidados são Paulo Illes (Centro de Direitos Humanos e Cidadania do Imigrante – CDHIC) e Sênia Bastos (Universidade Anhembi Morumbi).

Os desafios globais de convivência, postos no início do século 21, com restrições dadas ao turismo por conta do terror e do medo social, são enormes. Em cidades mundiais de expressão turística, diversos atentados e ameaças foram e têm sido registrados, levando-nos a pensar sobre como a hostilidade pode se constituir em fator restritivo para as viagens e como a mídia e as artes, e em especial, como a literatura e o cinema, colaboram com o processo de propagação do medo, junto às sociedades contemporâneas. Estes dilemas serão abordados na palestra “Turismo e Medo Social: Hostilidade, Fatores Restritivos e Propagação do Terror”, com Luiz Trigo (Doutor em Educação pela Universidade Estadual de Campinas e Livre Docente em Lazer e Turismo pela ECA/USP), que irá encerrar o ciclo no dia 29/05 no Centro de Pesquisa e Formação.

A realização do 3º Ciclo de Ética no Turismo  antecede o Seminário Internacional Turismo e Direitos, que pretende discutir em 12 e 13 de junho, as contradições do setor e a democratização do acesso às práticas turísticas. O Sesc São Paulo comemora, até dezembro de 2018, 70 anos de suas ações em Turismo Social. Nesse sentido, e por acreditar que a promoção de excursões e passeios deve caminhar em paralelo com as reflexões sobre os impactos gerados pelo turismo, a instituição promove várias iniciativas nesse período.

Saiba mais em sescsp.org.br/eticanoturismo