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Carrossel Performático



Em novembro o Sesc Consolação recebe O Carrossel Performático de Fyodor: de cabeça para baixo – ideia original do russo Fyodor Pavlov-Andreevich. O Carrossel é uma estrutura rotativa dividida em oito partes, cada uma delas ocupada por um artista e sua obra.

Nesta montagem - que passou por Viena e Buenos Aires - estão quatro brasileiros e quatro estrangeiros.

A instalação reage a cada novo local, tempo e contexto; na edição paulistana estão artistas convidados de São Paulo e do resto do mundo. Esta edição também é parte integrante da programação do Festival do Sul, uma parceria entre o Goethe-Institut e o Sesc São Paulo.

O De cabeça para baixo que consta no título da instalação se deve a noção de sul, como elemento fundamental de Episódios: geograficamente – a outra parte do hemisfério; historicamente – a colonização e as consequentes questões culturais, sociais e políticas. “O sul é localizado na porção inferior do mapa. O sul é quente. Mas o sul do Brasil é sua porção mais fria.  E, se pusermos o globo de ponta-cabeça, o sul então ficaria no topo. Em outras palavras, parece estar numa posição invertida, de cabeça para baixo, tornando-se, assim, seu oposto. Por isso a terceira edição do Carrossel é dedicada ao antipodismo – a tentativa de apreender como tudo seria se as circunstâncias fossem exatamente o oposto”, explica Fyodor Pavlov-Andreevich, que assina também a curadoria em parceria com Margarita Osepyan.

Inspiração

Um dos pontos de referência para a criação de O carrossel performático é a experiência antropológica do Edifício Narkomfin (1930) em Moscou – ‘um lar para um novo estilo de vida’, dos arquitetos Moissey Ginsburg e Ignatiy Milinis.

O edifício foi habitado por funcionários de todos os escalões do Ministério das Finanças soviético, possuía celas ao invés de apartamento que eram usadas como espaço de trabalho/estar. Não havia cozinhas privativas, apenas uma comunitária, e uma área única de refeições para todos os residentes. Sem chuveiros privativos, apenas privadas, e sem quartos – apenas um dormitório comum com 1000 camas, com um palco para a orquestra que tocava a noite toda músicas recomendadas por médicos para bloquear o som do ronco alheio.

Este esquema utópico deu errado desde o princípio. Os residentes logo começaram a instalar chuveiros privativos junto às privadas e fogões ilegais sobre suas pias. O sonho construtivista resultou em uma busca tediosa por privacidade.

O objetivo do Carrossel performático é abrir um precedente para a manifestação do desejo coletivo e, quem sabe, até de um inconsciente coletivo’, complementa Fyódor.  Por isso mesmo, como parte deste desejo coletivo, a participação do público é imprescindível para o sucesso de Carrossel.

O público deve chegar com uma hora de antecedência para retirar o ingresso e, uma vez iniciada a sessão, não será permitida a entrada nem saída no espaço.

A experiência se inicia com a passagem pela ‘Capela de Check-in’, uma parte introdutória, em que o público conhecerá os artistas por meio de projeções concebidas pelo videoartista e cineasta Ilya Pusenkoff e seus respectivos trabalhos; segundo os curadores, uma forma de experimentar a comunhão de desejo artístico. Se o visitante optar por conhecer o Carrossel ele deverá permanecer no espaço por cinquenta minutos, ou seja, a duração total de cada sessão. Cada visitante pode escolher se atuará como espectador ou se participará das performances pelo tempo que quiser (não há regras de tempo para a interação com os artistas em suas cabines abertas). Não há a necessidade de interagir com os artistas a não ser que exista o desejo de adentrar os nichos ou cabines e participar ativamente das experiências propostas.

O público só participa diretamente da estrutura rotativa do Carrossel por meio das estações de bicicletas ao redor da estrutura. O Carrossel gira à medida que os visitantes pedalam as bicicletas, três no total.

Os artistas e suas performances no Carrossel

Jamie Lewis Hadley
Manobra: O vazio
Manobra: O vazio usa a imagem icônica Saut dans le vide (1960), de Yves Klein como ponto de partida para criar uma performance-instalação que explora as relações entre performance e escultura, duração e espetacularização. Por meio da construção repetida de caixas de papelão e o consequente preenchimento do espaço, a obra busca também levantar, sutilmente, questões contemporâneas a respeito de migração e deslocamento. As caixas de papelão múltiplas e idênticas são esteticamente sutis, numa referência à escultura minimalista, mas, ao mesmo tempo, são fundamentais, do ponto de vista conceitual, representando a universalidade e materializando o deslocamento literal do espaço por meio do ato da construção, do reposicionamento e, em última instância, da destruição das caixas.

Jamie Lewis Hadley é artista visual e curador. Sua experiência como lutador profissional ainda se manifesta em suas performances, que usam luta greco-romana profissional como ponto de partida para criar obras que exploram as noções de dor, perseverança, sangue e espetáculo. Jamie também é diretor do Blank Billboard, uma nova companhia dedicada à produção de obras e festivais únicos, com foco em patrocinar generosamente artistas e expandir o público desse tipo de obra na Grã-Bretanha e em outros locais. Ele se apresentou pelo mundo afora e recebeu patrocínios e comissões de instituições como Arts Council England, The Wellcome Trust e Live Art Development Agency. Jamie vive e trabalha em Londres.

PASHIAS
Côncavo
Ao estabelecer o ato de ‘olhar’ como processo de perspectiva que promove o autoconhecimento e, consequentemente, o conhecimento do ambiente, o artista se fecha em uma ‘caverna’ limitada por espelhos. Permitindo-se apenas olhar para si através de seu reflexo na água de um lago ou de sua imagem invertida produzida por um espelho côncavo, PASHIAS inicia um diálogo de ‘contemplação’ entre sua presença corpórea e a imagem dela, como uma ‘ideia’ produzida e rearranjada por variáveis exógenas. Como visto no mito grego de Narciso, o público é convidado a participar desse processo de ‘observação’ e satisfação de desejo, agindo como espelhos, auxiliando o artista no ato fútil do consumo de sua própria imagem.

PASHIAS faz performances, instalações, fotografias e trabalha com seu próprio corpo como matéria-prima. Seus trabalhos focam na exploração da ‘situação’ e do ‘ambiente’, baseada na relação da unidade com o grupo, similarmente à maneira como todos os ambientes sociais percebem uma pessoa – através do estabelecimento da presença, troca e coexistência. PASHIAS participou de exposições individuais e em grupo ao redor do mundo, colaborou com organizações culturais como o Marina Abramovic Institute, o Museu de Arte Contemporânea da Estônia e a Bienal Mediterrânea de Arte Contemporânea. Em 2013, PASHIAS foi cofundador da epitelesis – Performance Art Foundation e trabalhou como professor/palestrante em diversos programas acadêmicos. PASHIAS vive e trabalha no Chipre e na Grécia.

Rafael Menôva
É vento
Através da manipulação de elementos e imagens para comunicar, instigar e reunir pessoas em espaços que promovam conexões interpessoais, o artista lança luz sobre questões latentes de pertencimento e aceitação. A partir da pesquisa em escultura, ocupado com a criação de padrões corporais na história da arte até transportar tais questões para o universo da performance, o artista propõe situações e questões que atravessam seu próprio universo, se aproximam ou, melhor dizendo, são o reflexo da interferência do grupo na intimidade. A performance É vento reconstrói uma paisagem de piscina, sol e verão, mas a deturpa a partir dos elementos plásticos que, juntamente com o convite do artista à participação do espectador, envolvem e ressoam, seja por tocarem nos limites do pudor alheio até desejo, entretenimento…

Rafael Menova se dedica à construção de experiências etéreas como estopim de sua pesquisa artística. Há algum tempo, dedica-se a entender processos de transformação física, seja através do questionamento e busca por padrões estéticos no corpo até a construção de eventos-proposições, geralmente em espaços subutilizados que se transformam em plataformas para encontros/trocas. Festa como ativismo. É também um dos idealizadores do Projeto IScream, que promove ocupações artísticas através da mobilização de jovens artistas. Sua pesquisa sobre identidade passa pela escultura e performance, mas vai além, ao pensar os possíveis lugares para contato e trocas entre público e artista. Rafael vive e trabalha em São Paulo.

Anguezomo Mba Bikoro
Memórias da Casa dos Budas Ditosos
A performance convida a uma reflexão que mergulha nas contradições entre real e imaginário, entre o processo histórico de colonização e a narrativa. A proposta desmonta a lógica de transação e barganha em um espaço de reflexão íntima sobre a inequidade socioeconômica brasileira e suas consequências, como a pobreza e a violência, que advêm do processo de colonização e da complexa composição étnica da população. Com reflexões sobre a implicação pessoal, a performer tenta negociar sua empatia por um processo de doação. Nesse processo, o público lava dinheiro. Você é capaz de trocar sua moeda, vender suas confissões ou lavar seus pecados? Você é capaz de encarar sua história? Consegue enfrentar seu futuro? Quem cuidará de você quando você sair de casa? Baseada na poesia e na prosa de João Ubaldo Ribeiro, a artista força uma reflexão sobre como nossas trocas monetárias mantêm sistemas de exclusão e celebra as batalhas atuais de povos indígenas por direitos humanos.

Anguezomo Mba Bikoro é artista visual que trabalha com performances, filmes, arqueologia, arquitetura de guerrilha e literatura. Seu processo crítico é pautado em discursos históricos, arquivos e teorias sobre o pós-colonialismo, diáspora, migração, identidades, afro e altermodernidade e cultura. Seu trabalho revela e cria momentos de síntese e harmonia entre corpos de conhecimento, tradições culturais e sistemas de valores aparentemente díspares.
Anguezomo Mba Bikoro se une a comunidade contestando a economia das artes, política, literatura, ecologia e filosofia, combinando estratégias alternativas em performance e prática para descontruir narrativas sociais. Ela nasceu no Gabão e reside em Berlim.

Evamaria Schaller
Instituição de segurança
Instituição de segurança levanta questões sobre o pensamento pós-colonial. Quanto vale um ser humano? Quais as características ideais de um ser humano? Não há diferença perceptível se compararmos o “acolhimento” dos escravos africanos na América, bem como o tratamento dos povos indígenas pelo poder branco e os experimentos médicos na Alemanha nazista. Nesta performance, um ser humano torna-se um objeto a ser medido. E não fica claro o que é medido, nem qual informação exatamente a artista busca do público.

Evamaria Schaller trabalha com performance, vídeo, filme e instalação. Seu corpo é o epicentro de suas obras e sempre aparece em interação direta com o ambiente social e espacial em situações-limite. Em suas performances ao vivo, Schaller foca em gestos, ações cotidianas e seus absurdos. Evamaria Schaller recebeu diversas bolsas por sua prática artística e é sócia-fundadora do PAErsche – o laboratório de performances da Renânia do Norte–Vestfália, Alemanha, que organiza encontros entre performers e público. Nascida na Áustria, hoje vive em Colônia, na Alemanha.

Clarissa Sacchelli
As coisas como são
Uma performance que parte do desejo de questionar e inverter posições preestabelecidas, propondo a construção de uma situação que se dá entre o que se move para imobilizar e o que está imóvel para mover. A partir da tentativa de imobilizar e fazer desaparecer um ponto no espaço, revela-se o movimento que existe ao redor desse ponto, deixando transparecer as relações presentes entre os diversos pontos desse espaço. Um trabalho que propõe a imobilidade como estratégia para revelar, provocar e reconfigurar movimento. Uma performance que só pode existir na inter-relação entre imobilidade e movimento, entre performers e público, no contrato que se estabelece entre dominação e submissão, entre desejo e manipulação. Quais as relações de poder que prendem e, ao mesmo tempo, sustentam os corpos de pé?

Clarissa Sacchelli é uma artista que trabalha prioritariamente com as artes performáticas, transitando entre dança, performance e escrita. Interessa-se pela relação entre produção, produto e recepção, questionando como a forma de produção de uma obra de arte revela o discurso produzido por ela. Atualmente, trabalha em ideias de reprodução, indagando se é possível produzir sem reproduzir e como práticas cotidianas podem ser entendidas como ensaios que sempre produzem herança e arquivo. Recebeu diversos financiamentos e apresentou-se em projetos de Eszter Salamon, Tino Sehgal e Claudia Müller, entre outros. Clarissa vive em São Paulo.

Guta Galli
Sobre lágrimas e melancias
Esta performance propõe uma releitura cômica e contemporânea das grandes mães arquetípicas que aterrorizam nosso inconsciente coletivo há tempos imemoriais. Em que ponto o afeto encontra o abuso? Quais são as fronteiras entre o cuidado e o controle? Com quantas lágrimas se esgota um ser humano?  Inspirada pelo terror e poder de sedução de Medéia, Lilith, Lâmia e outras rainhas, bruxas e demônios míticos, esta performance problematiza estas questões junto com o público, que é convidado a dividir o espaço performático para interagir com a artista, que lhes oferece melancias, dá ordens, compaixão e lágrimas.

Guta Galli é artista transmídia e trabalha com performance, fotografia, vídeo e instalação. Suas pesquisas atuais estudam as intersecções entre gênero, poder, raça, sexualidade e violência. Exibiu seu trabalho em exposições individuais e coletivas em Roterdã (Brazil Rotterdam Festival / Holanda), São Paulo (SP-ARTE), Rio de Janeiro (RIO-ARTE), Brasília (Caixa Cultural), Santiago (Ch.acco), Roma (Bienal) e nos EUA, onde fez performances. Participou de exposições coletivas em São Francisco, no San Francisco Art Institute, SOMArts, Berkeley Art Museum, De Young Museum, Root Division Gallery, Swell Gallery, Diego Rivera Gallery e Walter Maciel Gallery (LA). Guta nasceu em São Paulo.

Fyodor Pavlov-Andreevich
Prove-me eu sou você
Em pareceria com Atelier Playtronica e Arto Lindsay.
Nos últimos anos, Fyodor Pavlov-Andreevich vem explorando os limites que separam o espectador do objeto na performance. Atenuar esses limites e formar uma relação entre a plateia e o corpo do artista – é isso que Fyodor segue buscando com este trabalho, PROVE-ME, EU SOU VOCE, desenvolvido em colaboração com o compositor radicado no Brasil Arto Lindsay e com o coletivo internacional Atelier Playtronica. 
O corpo como instrumento musical que toca através da energia, da intenção e intensidade humana, que recebe desejo ou tristeza, pensamentos ou instintos; esse corpo de acesso comum está completamente exposto a tudo que o espectador dirige a ele e reflete sobre si mesmo.

Fyodor Pavlov-Andreevich é artista visual, curador, diretor de museu, escritor,  diretor de teatro e cinema. Cria performances e instalações site specific, intervenções de guerrilha e trabalhos de longa duração que apresenta ao redor do mundo sob a curadoria de Hans Ulrich Obrist, Roselee Goldberg e Marina Abramovic, dentre outros. O Carrossel performático de Fyodor foi exibido pela primeira vez em 2014, no Faena Arts Center, em Buenos Aires, e ganhou o Grand Prix do Kuryokhin Art Prize 2015. Pavlov-Andreevich vive e trabalha entre Moscou (onde cuida da Solyanka State Gallery, gerida inteiramente por artistas), Londres e São Paulo.
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Sesc ao pé do ouvido
Playlists criadas especialmente por artistas convidados e outras inspirações estão no perfil do Sesc SP.
Bom para acompanhar você quando estiver correndo, com saudade do Angeli e do Laerte dos anos 80 e outras cositas más. Chega mais!