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Habitar Palavras: Deidimar Brissi

Feliz 2021?

Dois mil e dezenove foi ruim. Nos desestabilizamos. Buscamos o reequilíbrio.
Mas, dois mil e vinte chegou!
Festa! Alegria! Êxtase!
Ficamos felizes sem pensar em quem sofria!
Nossa egoísta felicidade explodiu, ignorando todo sofrimento humano e do planeta.

Dois mil e vinte chegou. Melhorou? Não, piorou muito!
Nos horrorizamos com as mortes. Uma!... Cinco!!...  Cem!!! Mil!! Cem mil! Que horror!
Depois fomos normalizando. Já não nos escandalizamos mais.
A gente se acostuma fácil demais com o que não deveríamos acostumar!

Continuamos buscando a estabilidade. O equilíbrio. A constância.
Buscamos a nossa felicidade, mas, e o outro será que está bem?
Só importa se eu estou bem?

Continuamos buscando a estabilidade. O equilíbrio. A constância.
E quando muda, sentimo-nos deslocados, perdidos...
Desejamos o que nunca mais vai voltar!
Daí vem a saudade!!!

Continuamos buscando a estabilidade. O equilíbrio. A constância.
Mas, esquecemos de Heráclito, “a única constante é a mudança”.

A flecha do tempo só passa em uma direção: o futuro!
Não adianta resistir à correnteza do tempo.
Nos resta apreciar a paisagem, aproveitar e não ter nada do que nos arrependermos!

Tudo muda! Tudo passa!
São tantos sentimentos...
Estou feliz?

As vezes sofremos muito. 
Mas, as vezes a dor não é tão insuportável a ponto de nós mudarmos!
Estamos cansados de sofrer. 
Por quê não mudamos?

Pessoas queridas partiram. E agora?
Não conseguiremos resistir à mudança. 
Esperaremos dois mil e vinte e um?
Vamos esquecer tudo?
Vamos nos embriagarmos na ilusão e na hipocrisia?
Vamos continuar os mesmos?

Estamos agora diante do futuro que nos suga e arrasta!
“José, para onde?”

 

Reflexões de um caipira

Esti tar de corona
É um bichim danado
Foi só ele aparecê
Pro mundo ficá virado

Imagini qui discubriro
Que o Brazí é disiguar
Que tem até gente invisivi
Na tar escala sociar

O vírus é pra todos
Desdi o são até o loco
Mas o hospitá é deferente
Nesta hora de sufoco

Teve quem mandou trabaiá
Garantino qui trabaio é virtudi
Mais eis memo ficaro em casa
E tinha inté prano de saúdi

Ficô mais aparecido um caso
Qui só num vê quem num qué
Qui tem muito homi covardi
Qui bate sem dó nas muié

O tar de distanciamento
Tumbém mi deichô veiaco
Como pódi ficá longi
Uma dúzia num barraco?

Enquantu o rico fica em casa
Com o dinheiro no cofri
O pobri passa aperto
E é os preto qui mais sofri

Eu num intendu esti povo
Fazendu estas discuberta
Puis eu sempre subi que pobre
Tem bem mais curta a cuberta

 

O retorno

Começou a quarentena e eu voltei para casa
Encontrei um homem morando lá
Achei ele estranho

Ele era esquisito
Complexo
Contraditório
Iludido
Hipócrita
Solidário
Entusiasmado
Tolo
Apaixonado
Idealista
Triste
Ansioso
Alegre

Aos poucos fui gostando dele
Que surpresa assustadora eu tive
Meu Deus, este homem era eu!

 

Sobre o autor

Deidimar Alves Brissi é professor, pesquisador, escritor, editor e palestrante. É casado e tem três filhos. Trabalha como professor de Física do IFSP, campus Birigui. Como escritor tem três livros de poesia publicados, três de divulgação científica e cinco coletâneas literárias. Realiza pesquisa nas áreas de Astrofísica, ensino de Física e Astronomia, cultura popular, jogos educativos, divulgação científica e Astronomia Indígena. Como editor tem atuado como voluntário na Editora Pindorama, lançando diversos autores na área de literatura e relançando grandes mestres (esquecidos) da literatura nacional, como Catullo da Paixão Cearense. Como palestrante, tem se dedicado à popularização da ciência e realizados sarais em diversos espaços.


Habitar Palavras - Biblioteca Sesc Birigui

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