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Dia Mundial do Refugiado: migrar é um direito humano

Por Victor Del Vecchio*

A migração é, por definição, o deslocamento de populações pelo espaço. A espécie humana sempre migrou, desde o seu surgimento na África, passando pela Europa e Ásia até a chegada ao Continente Americano, a mobilidade foi ponto central na nossa evolução e no sucesso que permitiu nossa existência enquanto espécie, inclusive em momentos de escassez de alimentos, de condições climáticas desfavoráveis ou mesmo de disputas com outros bandos, que faziam com que nos movêssemos para locais com comida mais abundante, climas mais amenos e regiões mais pacíficas.

Se avançamos na história, notamos que não foi diferente: os deslocamentos populacionais foram forjando as sociedades e viabilizando a sobrevivência e as trocas entre as culturas, sobretudo de mercadorias e conhecimentos. Foi em decorrência dessas trocas que expedições de caravelas cruzaram oceanos e chegaram ao que hoje chamamos de América, local que já era habitado por indígenas, povos originados a partir dos grupos humanos que há milênios migraram para esta terra.

Na atualidade, o tema das migrações com frequência toma a mídia e vem cada vez mais sendo abordado também em salas de aula e pela população de modo geral. E não é para menos, afinal, o ser humano nunca se moveu tanto como nos dias de hoje. Por diversos motivos, que vão desde um grande crescimento populacional em regiões de emigração, isto é, de onde saem migrantes, até outros fatores como avanços tecnológicos que barateiam o acesso a meio de transportes, aumentam malhas rodoviárias e facilitam a comunicação com outras partes e pessoas do mundo. 

Ainda, devemos mencionar também um triste fator que se soma a essa cifra: os deslocamentos forçados, isto é, aqueles que ocorrem quando as pessoas não têm escolha de ficar nos seus locais de origem, onde suas próprias vidas são ameaçadas. Isto ocorre em situações de conflitos armados, de perseguições, de grave e generalizada violação de direitos humanos e também por questões ambientais, como desastres naturais, tomando de exemplo o terremoto que afetou o Haiti em 2010 e os ciclones de 2019 que atingiram Moçambique. Dentro destas questões ambientais, vale mencionar também os fatores climáticos, por vezes relacionados à ação humana no meio ambiente, e que promovem processos de desertificação, aumento do nível de oceanos, entre outras condições que podem inviabilizar a vida de pessoas. Imagine se a propriedade onde você e sua família plantam e da qual dependem para sobreviver começasse a secar e toda colheita morresse? Ou ainda, se fosse inundada pelas águas do mar? 

Quando os motivos são as perseguições, as Nações Unidas classificam como refugiadas aquelas pessoas que fogem por terem suas vidas ameaçadas por motivos de raça, religião, etnia, opiniões políticas e pertencimentos a grupos sociais. É o caso, por exemplo, de budistas que não toleram muçulmanos no país asiático de Mianmar, de grupos políticos rivais em Angola, ou de mulheres trans que sofrem ameaças de morte no país que mais as mata no mundo: o Brasil. Muitos países também consideram refugiadas aquelas que fogem de grave e generalizada violação de direitos humanos, como é o caso dos venezuelanos, que procuram outros países para evitar a fome, a escassez de remédios e serviços essenciais, como de saúde.

Essas pessoas que se deslocam de maneira forçada somam hoje mais de 70 milhões de indivíduos. Mais de 70 milhões de pessoas que tiveram de deixar seus lares, seus locais de origem para trás para poder sobreviver. É por isso que dia 20 de junho  marca o Dia Mundial do Refugiado, para que possamos refletir sobre os problemas que afetam tantas pessoas, e também para que possamos trabalhar para que nós mesmos não sejamos mais um fator de agressão na vida delas, o que ocorre a partir do momento em que não as aceitamos em nossas sociedades.

Assim, ter consciência da questão das migrações e do refúgio, é entender que esses são fenômenos que moldaram as sociedades em que vivemos e a gente que somos, e que cabe a nós exercer a empatia e solidariedade com essas pessoas que muitas vezes buscam mais do que sobreviver, também se integrar, serem felizes, poderem sonhar e batalhar pelas suas conquistas.

O Dia Mundial do Refugiado, assim como todos os outros do ano, é um dia para desconstruirmos a xenofobia, que é o preconceito contra migrantes e sua cultura, e para abrirmos os braços e ouvidos para essas populações que se somam a nossa sociedade e muito podem nos ensinar, não só agregando culturas e modos de vida diferentes, mas também em termos de resiliência. Migrar é humano, migrar é um direito. Migrar é um direito humano e deve assim ser respeitado!

 

* Victor Del Vecchio é advogado e mestrando pela USP, atuou como Consultor jurídico da ONU Migração (OIM), membro do ProMigra - Projeto de Promoção dos Direitos de Migrantes da USP, sócio do Bastos & Del Vecchio - Consultoria em Migração, e professor da ESPM - Escola Superior de Propaganda e Marketing de São Paulo. 

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