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Declaração Universal dos Direitos Humanos chega aos 70: e o Brasil com isso?
"O Brasil é um país fundado em violações de direitos humanos", avalia Rogério Sottili, diretor executivo do Instituto Vladimir Herzog. Para ele, apesar de avanços fabulosos, a cultura de violência instalada na sociedade e a constante aplicação de instrumentos de esquecimento na construção da história do país – no lugar de políticas voltadas à valorização da memória, da verdade e da justiça – têm condenado o Brasil à reprodução de erros do passado e à manutenção de alguns instrumentos de violação de direitos humanos como referenciais
Pouco mais de três anos após o fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e a fundação da Organização das Nações Unidas (1945), a Assembleia Geral da ONU, com o voto favorável do Brasil e da ampla maioria dos países membros à época, adotou e proclamou, em Paris, no dia 10 de dezembro de 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH).
O documento, com seus célebres 30 artigos, parte do entendimento de que o "desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da humanidade". O horror às guerras, à escravidão de povos, às inúmeras violências, explorações e opressões promovidas pelo mundo – mas, principalmente, a convicção de que o respeito à dignidade humana, garantido por lei e efetivamente assegurado pelos Estados, é fundamental para a promoção da liberdade, da justiça e da paz – impeliram representantes de diferentes trajetórias políticas, sociais e culturais a formatarem, há 70 anos, um compromisso, um ideal para a construção de relações mais igualitárias entre os indivíduos e os povos.
De lá para cá, nem tudo foram flores, no entanto. Basta abrir um livro de história ou passar os olhos nas manchetes dos jornais. Seja no Brasil ou em outras partes do planeta, avanços, retrocessos – e mudanças que teimam demais em acontecer – vêm marcando essas décadas e, em níveis variados, as vidas de todos nós. Ainda que a perspectiva de uma visão "universal" para a defesa da pessoa humana não seja imune a críticas – afinal, é possível mesmo falar em "valores universais" estimados pela totalidade dos mais diversos povos que habitam a Terra?, ideias como "todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos" (artigo 1 da DUDH), ou "ninguém será arbitrariamente preso, detido ou exilado" (artigo 9) e "todo ser humano tem o direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar do progresso científico e de seus benefícios" (artigo 27), só para citar alguns exemplos, parecem guardar uma potência de transformação que não é trivial.
Exposição "Para Respirar Liberdade - 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos" (Sesc Bom Retiro) | Foto: Anderson Rodrigues
A partir dessa potência, o artista plástico e ativista político paulistano Otávio Roth (1952-1993) tomou cada um dos 30 artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos e elaborou representações gráficas em diversas línguas e técnicas (como a xilogravura e a aquarela). Desde o final dos anos 70, o material circula em mostras realizadas em vários países; e uma série e três álbuns chegaram a ser adquiridos pela ONU. Até 27 de janeiro, algumas das obras e instalações do artista estão expostas no Sesc Bom Retiro, na mostra Para Respirar Liberdade - 70 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, com a curadoria Fábio Magalhães e Isabel Roth. A exposição é realizada pelo Sesc São Paulo em parceria com o Instituto Vladimir Herzog e com o apoio do Acervo Otávio Roth.
Para tentar entender por que, em 2018, no Brasil, uma parcela considerável da população se manifesta contrariamente à defesa dos Direitos Humanos e uma parcela ainda maior, apesar de apoiá-los, não compreende exatamente a noção (veja a pesquisa da Ipsos), a EOnline foi à sede do Instituto Vladimir Herzog, em São Paulo, e conversou com seu o atual diretor executivo, Rogério Sottili. Ele é mestre em História pela PUC-SP e, recentemente, foi Secretário Especial de Direitos Humanos no Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos (2015-2016) e Secretário de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo (2013-2015).
O Instituto Vladimir Herzog atua, desde 2009, na promoção da democracia, dos Direitos Humanos e da liberdade de expressão a partir da memória da vida do jornalista Vladimir Herzog, assassinado em 25 de outubro de 1975 por agentes da ditadura militar (1964-1985).
Debates, mostras, shows e palestras têm sido promovidos nas unidades do Sesc São Paulo para refletir os 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos e para pensar a promoção dos valores contidos no documento. Entre essas ações, além da exposição Para Respirar Liberdade - 70 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, está a conferência com o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos, no dia 18/12, também no Sesc Bom Retiro, com transmissão ao vivo no link: facebook.com/sescsp