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Potencial desperdiçado
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O brasileiro é antes de tudo um empreendedor. A afirmação, recolhida de matéria desta edição de Problemas Brasileiros, surpreende à primeira vista. De fato, não é essa a imagem que normalmente se tem do país.
Um exame mais atento, porém, comprova a realidade. Em primeiro lugar, há números, registrados por órgão internacional, o Global Entrepreneurship Monitor, de Londres, Inglaterra, que colocam o Brasil entre as nações que mais desenvolvem atividades empreendedoras, em companhia de México, Nova Zelândia, Austrália e Coréia, e à frente dos gigantes Estados Unidos, Alemanha, França e outros. Um em cada sete brasileiros adultos, refere o estudo, é um empreendedor. Nos outros países pesquisados a média é um para dez.
É conhecida também a alta taxa de natalidade empresarial, anotada nos registros das juntas comerciais. Adicione-se a isso o número de pessoas que tentam a vida trabalhando por conta própria, seja como vendedores ambulantes sem nenhum registro, seja na prestação de serviços diversos, ou ainda nos milhares de ofícios informais escondidos nos fundos de quintal pelo país afora.
Infelizmente, essa energia tem um vício de origem: trata-se do que os técnicos chamam de empreendedorismo de necessidade. Em outras palavras, são as empresas, quase todas micro, que nascem porque seus criadores perderam o emprego e sentem dificuldades para recuperá-lo. Segundo a mesma pesquisa, nesse aspecto o Brasil está em terceiro lugar, superado apenas por Índia e México. O problema é que tais empresas, que não nascem do planejamento nem do senso de oportunidades comerciais, ou têm vida curta ou possibilidades reduzidas de crescimento.
As micro e pequenas unidades, aliás, compõem a grande maioria do empresariado brasileiro – segundo o IBGE, 98% dos 3,5 milhões de companhias são micro ou pequenos estabelecimentos. E respondem por nada menos que 67% do total de pessoas empregadas.
Esses novos empreendedores, cuja maior parte fugiu das agruras do desemprego, para tocar suas empresas enfrentam uma bateria sem fim de dificuldades, que começam na papelada exigida para a própria abertura, um ato revestido de impressionante pompa burocrática. Na seqüência, surgem as taxas, emolumentos, impostos e gastos de todos os tipos, sem falar em despesas corriqueiras de aluguel, serviços públicos, etc. Se houver empregados, os custos aumentam consideravelmente, por conta dos encargos sociais.
A dificuldade para obter capital – crédito raro e caro – é outro fator, este muitas vezes determinante, da sobrevida da empresa. Por essas e outras razões, diz o Sebrae, 71% dos empreendimentos encerram suas atividades antes de concluir o quinto ano de vida. Entre as outras razões, a entidade relaciona a falta de planejamento, o despreparo dos novos empresários e seu relativo desconhecimento do meio em que pretendem operar.
Os obstáculos no caminho do mercado externo também estão presentes na realidade vivida pelas micro e pequenas empresas. De fato, a logística para exportar é complexa, assim como a burocracia, o excesso de papéis e, por último, as exigências de qualidade e de garantia de fornecimento apresentadas por compradores estrangeiros.
Acrescente-se a isso o despreparo tecnológico da maioria dos micro e pequenos empreendedores, provocado muitas vezes por baixa escolaridade, falta de capital e ausência de apoio dos órgãos oficiais, principalmente no que se refere a financiamento e oferta de oportunidades, como a participação em feiras e seminários no exterior.
Considerando o papel que as micro e pequenas empresas exercem na economia, sua importância social no que se refere ao número de pessoas a quem oferecem trabalho, esse setor mereceria melhor sorte. Ser objeto de pesquisas, nacionais ou internacionais, não satisfaz nem abre portas para a sobrevivência. Cabe aos detentores do poder político eliminar o cipoal de entraves e obstáculos que os pequenos empresários têm de superar, para garantir o desenvolvimento.
O espírito empreendedor do brasileiro é uma energia latente que poderia ajudar o país a crescer rapidamente. Se a burocracia e uma legislação arcaica não atrapalhassem tanto.