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A dádiva de Grande Sertão: Veredas

O contista, romancista, novelista e diplomata João Guimarães Rosa (1908 - 1967) é uma daquelas figuras controversas da literatura brasileira que as pessoas tendem a amar ou a odiar, com a mesma intensidade.

Muito disso se dá pelo estilo único e incomparável do escritor, muito apegado à suas raízes sertanejas, saberes simples porém nunca simplórios, do homem da terra e seus famosos neologismos, justamente a causa principal de opiniões tão extremas referentes à sua obra.

Usando o sertão e sua aridez de múltiplos sentidos, como pano de fundo, Guimarães Rosa faz paralelos entre a vida e a morte, trabalho, relações interpessoais e questiona até mesmo a razão de nossa existência por meio de seu realismo mágico, liberdade de linguagem e trechos milimétrica, semiótica e semanticamente perfeitos, escritos especialmente para abalar as estruturas e certezas do leitor que se atreve a conhecê-lo.

Foi exatamente isso que aconteceu com a cineasta e diretora de teatro Bia Lessa, que decidiu levar para os palcos a obra mais intensa e conhecida do escritor: "Grande Sertão: Veredas", em temporada de dois meses (setembro e outubro) no Sesc Consolação, célebre por abrigar grandes montagens teatrais paulistanas.

O que chama a atenção na transposição vislumbrada por Lessa, no entanto, já que falamos de estruturas, é justamente o espaço usado para a encenação da peça: uma estrutura metálica tubular, que mais lembra uma gaiola, um picadeiro, uma arena. Nela, o público pode assistir à exibição quase como coadjuvante, dividindo o mesmo ar, espaço e energia com atores, compartilhando assim da intensidade e riqueza do texto de Guimarães Rosa que a diretora fez questão de manter na íntegra: "Todas as palavras do espetáculo são de Guimarães, quisemos deixar a linguagem dele viva", elucida Bia Lessa.

Ainda com a ideia de manter o texto do autor vivo, foi criada uma instalação, com cenário e objetos concretos, que fazem menção ao sertão mineiro, com espaço para as interpretações dos atores Caio Blat e Luiza Lemmertz. Durante o dia, a instalação-palco fica aberta à visitação pública.

A obra, no geral, foi feita para causar no público imersão total no universo de Guimarães Rosa, já que o próprio autor declara: "O Sertão é o sozinho. É onde o criminoso vive seu cristo-jesus. O sertão tem medo de tudo. É onde o pensamento da gente se forma mais forte do que o poder do lugar. O sertão está em toda parte e é do tamanho do mundo"

"Grande Sertão: Veredas" em suma, conta, em retrospecto, a história de Riobaldo (Caio Blat), que, para vencer uma rixa de bandos no sertão, acaba vendendo sua alma ao diabo, além de ter que reprimir o amor que sente por seu colega Diadorim (Lemmertz), tudo isso, através do texto revolucionário de Guimarães Rosa, considerado um dos maiores escritores brasileiros de todos os tempos, aliado à interpretação visceral dos atores e ao cenário sensorial imaginado por Bia Lessa, transformam o espetáculo em um verdadeiro presente ao intelecto e à alma.

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