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Porteira aberta para os tratores
Programas de mecanização favorecem pequenos produtores e animam indústria
ALBERTO MAWAKDIYE
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País conhecido por protelar indefinidamente a resolução de seus problemas sociais mais agudos, o Brasil parece ter, pelo menos, encontrado uma maneira de lidar com a questão agrária sem apavorar os grandes fazendeiros com o fantasma da divisão de terras, e reduzir um pouco a fantástica concentração de riquezas no campo brasileiro.
A fórmula é tão simples que espanta não ter sido aplicada há mais tempo, e pode ser resumida numa única palavra: subsídio, em nível “nunca antes visto neste país” (parafraseando o bordão preferido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva), para os quase esquecidos pequenos agricultores familiares se capitalizarem e investirem em modernização, de modo a participar melhor da economia de mercado.
Essa modernização tem se dado principalmente pela compra de maquinário agrícola. Apenas o programa Mais Alimentos, lançado em julho de 2008 pelo governo federal, respondeu pela venda subsidiada de mais de 11 mil tratores de pequeno porte nos primeiros dez meses de implantação.
Programas similares também foram lançados pelos governos de São Paulo e do Paraná. O paulista Pró-Trator, em vigor desde dezembro de 2008, espera viabilizar a comercialização de 6 mil tratores populares até 2011. Já o Trator Solidário, do governo do Paraná – o mais antigo dos três – tem no portfólio a venda de mais de 4,2 mil tratores desde 2007.
Um único trator pode multiplicar até por cinco a área cultivada de uma fazenda, se houver espaço. De acordo com o Ministério do Desenvolvimento Agrário, nas pequenas propriedades que passaram a usá-lo, a produtividade da lavoura de mandioca se ampliou 13% e a de milho, 9%. Já no caso do leite (cujo rendimento aumenta exponencialmente com o uso de implementos mecânicos), o crescimento foi de 18%.
“O acesso à mecanização provoca sempre uma pequena revolução nesse tipo de propriedade”, afirma Guilherme Cassel, ministro da pasta. Segundo ele, o incremento na produtividade global da agricultura familiar, por conta do Mais Alimentos, correspondeu a 7,8 milhões de toneladas entre julho de 2008 e maio de 2009.
O impacto positivo alcançou a própria indústria de tratores, que sofreu um tombo de entrar para os almanaques com a crise financeira mundial (a produção nacional caiu 23,5% em 2009 na comparação com 2008 e as vendas, 13,8%). Apesar da queda nos números totais, a comercialização de tratores populares cresceu 48,3% no primeiro semestre de 2009, ante o mesmo período do ano anterior.
“O Mais Alimentos foi uma medida rápida e contundente para empurrar a cadeia produtiva. Beneficiou tanto o campo como as montadoras e as indústrias de autopeças”, ressalta Jackson Schneider, presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). “E é um mercado que só tende a crescer, haja vista a quantidade de agricultores familiares que existem no Brasil e o ainda bastante pequeno índice de mecanização das fazendas”, ele acrescenta.
De fato, trata-se de um mercado com enorme potencial. Apesar de tradicionalmente relegada a segundo plano pelo poder público – é um fato na história a preferência dos sucessivos governos por subsidiar as grandes propriedades rurais –, a agricultura familiar sempre compôs a massa mais numerosa do campo brasileiro, tendo sido ainda, mal ou bem, reforçada pelo assentamento de pouco mais de 950 mil famílias dentro dos algo erráticos programas de reforma agrária desenvolvidos pela social-democracia instalada no poder federal desde 1995, em proporção mais ou menos igual nos governos do tucano Fernando Henrique Cardoso e do petista Luiz Inácio Lula da Silva.
O último censo agropecuário, realizado em 2006 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e divulgado em setembro do ano passado, identificou a existência no país de nada menos do que 4,3 milhões de estabelecimentos de agricultura familiar, que representavam quase 85% dos 5,1 milhões de propriedades agropecuárias brasileiras. Os estabelecimentos com menos de 10 hectares – os chamados minifúndios – equivaleram a 47% do total de propriedades.
Perto de 12,3 milhões de trabalhadores rurais estavam fixados em unidades de agricultura familiar (74,4% do total). Ou seja, de cada dez ocupados no campo, sete trabalhavam em pequenas fazendas ou granjas, a grande maioria membros da própria família de proprietários. Essas terras, porém, correspondiam a apenas 24,3% da área agricultável (ou 80,25 milhões de hectares) e, de acordo com o censo de 2006, só 25,3% do financiamento rural total, público e privado, era voltado para elas. O nível de renda e tecnológico constatado, na média, foi só um pouco melhor que o da agricultura de subsistência.
Mesmo assim, a agricultura familiar respondeu em 2006 por 38% do valor total das colheitas (ou R$ 54,4 bilhões) e foi a principal responsável pela segurança alimentar dos brasileiros, produzindo 70% do feijão, 34% do arroz, 87% da mandioca, 58% do leite, 46% do milho, 38% do café, 59% dos suínos, 50% das aves, 30% dos bovinos, 21% do trigo e 16% da soja – esta última uma cultura comumente tida como apanágio do grande agronegócio. Apesar disso, a real situação do setor é de grande pulverização e baixa produtividade: a média de rendimento anual, entre as propriedades familiares, foi de somente R$ 13,99 mil em 2006.
Pobreza
É essa situação de pobreza endêmica e produtividade duvidosa que o governo está procurando reverter, não apenas por meio do Mais Alimentos, que visa principalmente à mecanização (além da melhoria da infraestrutura de cultivo das fazendas), mas também por uma série de outros programas e subprogramas de apoio, alguns deles já bastante antigos e que foram reformulados e reforçados.
O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) – dentro do qual nasceu, aliás, o Mais Alimentos – destinou, por exemplo, R$ 13 bilhões em créditos ao setor para a safra 2008/2009. Esse valor representa quase o triplo do que foi concedido no período 2002/2003 (R$ 4,5 bilhões). Para a safra 2009/2010, a agricultura familiar brasileira disporá de R$ 15 bilhões para custeio, investimento e comercialização. Os empréstimos podem ser pagos em até dez anos, com um ano de carência e juros de 2% ao ano.
O Pronaf também terá um limite maior para financiamentos, passando de R$ 30 mil para R$ 40 mil por agricultor. Para quem utiliza o microcrédito rural, o limite, que era de R$ 1,5 mil, será agora de R$ 2 mil. Já os serviços prestados em assistência técnica e extensão rural, que hoje beneficiam 1,2 milhão de agricultores familiares, serão expandidos e agilizados. Além disso, há vários programas de suporte para a pequena propriedade que estão sendo incrementados pelos governos estaduais.
De qualquer modo, a “joia da coroa” dos programas de subsídio é mesmo o Mais Alimentos, cujo empuxo se mostrou tão forte que, a partir da safra do biênio 2009/2010, o próprio Pronaf também entrará diretamente na seara da mecanização, financiando para a agricultura familiar veículos de carga automotores e elétricos, incluindo caminhões, caminhonetes, reboques e até motocicletas de uso agrícola, para complementar a linha de crédito para compra de tratores.
“Possuir um trator sempre foi o sonho de consumo da maioria dos agricultores familiares”, diz Silvio Rigoni, gerente de vendas de tratores da gaúcha Agrale. “Antes, porém, a compra era quase impossível, já que o prazo de financiamento era o mesmo para um pequeno trator de 15 cavalos e outro de 200 cavalos, de grande porte. As ótimas condições oferecidas pelo Mais Alimentos mudaram esse cenário.”
De fato, as regras de financiamento do Mais Alimentos são ainda mais generosas que as normalmente oferecidas pelo Pronaf. O limite de crédito por agricultor é de R$ 100 mil, que podem ser pagos em até dez anos, com até três anos de carência e juros de 2% ao ano. É dinheiro suficiente para comprar um trator de pequeno porte – um equipamento de 75 cavalos custa cerca de R$ 70 mil –, um ou outro implemento agrícola e ainda investir em ações como correção de solos, irrigação, armazenagem, melhoria genética ou formação de pomares e de sistemas agroflorestais.
Para facilitar ainda mais, a indústria está dando sua contribuição financeira, garantindo descontos de até 17,5% nos preços dos tratores das linhas voltadas para a agricultura familiar e de até 15% nos de máquinas, implementos e equipamentos agrícolas. Pelo menos uma administração estadual, a da Bahia, resolveu também entrar na parceria. De modo a estimular a adesão ao programa, o governo baiano está bancando com recursos próprios os juros de 2% que os agricultores do estado teriam de pagar na compra do trator. E, a exemplo de outras unidades da federação, a Bahia montou uma feira itinerante de divulgação do Mais Alimentos, responsável pelo fechamento de centenas de negócios em cidades do interior.
A receptividade ao programa, aliás, tem sido grande. Os agricultores com condições de se inscrever – para isso é preciso, obviamente, comprovar renda mínima para efeito de garantia, e a propriedade deve obrigatoriamente produzir algum dos alimentos listados pelo governo, que de qualquer forma são quase todos os presentes no dia a dia do brasileiro – estão agarrando a oportunidade, inédita para eles, com unhas e dentes.
Eles têm realmente aberto a carteira (em geral, pouco recheada) para investir. O produtor de uvas Jorge Carlos Menuncin, da gaúcha Farroupilha, comprou no final de 2008, por exemplo, um trator popular Agrale 4118.4, juntamente com uma plaina e um pulverizador. Até agora, não teve motivos para se arrepender, muito pelo contrário.
“O trator mudou a rotina da fazenda”, afirma Menuncin. “O trabalho de preparo, plantio e tratamento das parreiras, que antes envolvia quatro ou cinco pessoas, passou a ser feito por apenas uma e em muito menos tempo. A pulverização, uma tarefa que nos exigia de dois a três dias, é feita agora em apenas um.”
Menuncin sublinha, porém, que os ganhos com a mecanização foram muito além. Ele pôde ampliar a área plantada da pequena fazenda de 5 para 6 hectares e implantar novas culturas, como feijão, milho e cebola. “Em seis meses colhemos 700 quilos de feijão e plantamos 70 mil mudas de cebola”, festeja o agricultor.
Perenidade
O governo federal já anunciou que o Mais Alimentos não é um programa tópico, e que pretende perenizá-lo. A alegria não é apenas dos agricultores. Para a indústria de tratores e equipamentos agrícolas, não poderia haver notícia melhor. A iniciativa não somente permitirá às fábricas continuar a trilhar com mais segurança o difícil caminho da recuperação – atualmente, cerca de 2,3 mil empregos na indústria de tratores estão sendo mantidos graças ao programa, o que corresponde a 41% da mão de obra do setor – como possibilitará a elas trabalhar, pela primeira vez na história, com um mercado de massa.
De fato, poucos segmentos industriais brasileiros são historicamente tão voltados para a elite como o de tratores e equipamentos agrícolas. Embora o primeiro trator que se poderia chamar de efetivamente brasileiro tenha sido montado em 1961 (um Massey Ferguson de 36 cavalos), ou seja, nos albores da indústria automotiva nacional, a produção realmente nunca se massificou. A ênfase maior sempre foi dada aos equipamentos de grande porte, de 150 a 200 cavalos, cujo maior valor agregado compensava o pequeno número de unidades totais fabricadas – estratégia compreensível, já que basicamente apenas os grandes fazendeiros adquiriam tratores.
Essa talvez seja a principal explicação do baixíssimo índice de mecanização agrícola do Brasil – antes do Mais Alimentos, só 9% dos estabelecimentos agropecuários brasileiros possuíam trator, apesar da existência de cerca de uma dezena de grandes fabricantes no país. Na relação hectare/trator, a taxa foi estimada pela Anfavea como de vastos 160 hectares por trator em 2007.
Esse índice, que era de 410 hectares por trator em 1960, passou a 90 hectares em 1985 – a melhor taxa de todos os tempos –, mas acabou piorando novamente, com o aprimoramento tecnológico dos tratores de grande porte e a estagnação do volume de produção dos de menor potência e menos sofisticados, devido à concentração da demanda nas grandes propriedades rurais. Em 1985, a frota brasileira de tratores de rodas em uso era de 551 mil unidades. Em 2007, de 361,4 mil máquinas.
Como termo de comparação, o índice médio de mecanização agrícola mundial estimado em 2003 era de 50,8 hectares por trator. Naquele ano, a taxa na América do Sul era de 81,2 hectares por trator, na Ásia de 59, na América do Norte de 42,9 e na Europa de 26,2. O Brasil só está melhor, nesse quesito, do que a África, cujo índice de mecanização agrícola em 2003 era assustadoramente ruim, de 370,7 hectares por trator.
Nem mesmo um precursor programa de subsídios para a compra de tratores como o Moderfrota, lançado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso na virada do ano 2000, conseguiu reverter essa situação. Voltada principalmente para o grande agronegócio, essa iniciativa serviu mais para os fazendeiros modernizarem a frota do que para ampliá-la – como o nome, aliás, já dava a entender que aconteceria.
De qualquer modo, o Moderfrota permitiu a renovação de 30% a 40% da frota nacional de tratores agrícolas, estancando seu sucateamento e equiparando a idade média dos tratores do Brasil com os da França, por exemplo. E seria um dos impulsionadores da extraordinária performance do agronegócio nos anos seguintes, quando o setor passaria a responder por mais de 30% do Produto Interno Bruto (PIB) do país e por 40% das exportações, ajudando a criar os superávits que ancoraram a retomada do crescimento econômico observada nos anos Lula.
Para a indústria de tratores, porém, ele significou apenas mais um programa pontual para o aumento das vendas, e não a abertura de um novo mercado, como está fazendo o Mais Alimentos. Em 2002, os tratores de até 78 cavalos representavam 37% do total produzido. Hoje, chegam a 75% – uma porcentagem que pode se manter, se o programa efetivamente continuar, mesmo com o fim da crise econômica e com a retomada a plena carga da produção dos tratores maiores.
Reversão do êxodo
“Não resta dúvida de que o Mais Alimentos abriu horizontes para nossa indústria, inclusive em termos de desenvolvimento de produtos”, diz Marcos Arbex, gerente de vendas especiais da New Holland, que investiu em três novos modelos de tratores de 50 a 75 cavalos para atender exclusivamente o segmento da agricultura familiar. A John Deere também passou a oferecer uma gama maior de equipamentos de baixa potência, tendo conseguido, por conta disso, aumentar em 30% sua participação no mercado de tratores populares no ano passado.
A opção pelo popular, observe-se, de modo algum está implicando a produção de tratores rústicos ou defasados tecnologicamente. O ânimo é tão grande no setor que outra grande fabricante, a Agritech, está, por exemplo, multiplicando a fabricação de seus baratos, simples e ainda assim de alto desempenho minitratores de 15 a 30 cavalos, com tração nas quatro rodas, que foram desenhados para atender propriedades com terrenos muito íngremes ou difíceis, ou mesmo lavouras planas, mas demasiadamente densas.
“São máquinas ideais para áreas de pé de morro – comuns na agricultura familiar – e culturas como as de café ou de frutas”, explica Pedro Lima, gerente de marketing pós-venda da companhia. A Agritech está de olho principalmente no mercado do árido nordeste, que concentra um quarto das pequenas fazendas familiares brasileiras.
Diga-se que essa nova agricultura familiar que parece estar nascendo no país, na esteira do Mais Alimentos e de programas congêneres de subsídio, já vem dando sinais de que pode virar um mercado promissor também para outras áreas da economia, além da de fabricação de tratores e equipamentos agrícolas. Nas cidades que servem de sede a grandes aglomerados de pequenas fazendas, como várias localizadas no sul do país e no interior de Minas Gerais, o pequeno comércio começa a dar sinais de uma inédita pujança e os indefectíveis cursos de inglês e de informática estão se multiplicando.
Ou seja, mesmo constituindo, por enquanto, uma fração dos agricultores familiares brasileiros, os pequenos produtores que estão mecanizando suas lavouras podem vir a se tornar os primeiros representantes de uma nascente classe média rural brasileira, em muitos aspectos, como o cultural e o de renda, parecida com a europeia ou americana. As consequências econômicas e demográficas advindas da ampliação e consolidação dessa nova classe seriam enormes e para lá de benéficas para o país.
“Se o agricultor tem receita e se sua propriedade oferece perspectivas econômicas e de ascensão social para os filhos, é certo que essa família vai preferir continuar no campo”, diz o geógrafo Eduardo Girardi, autor do “Atlas da Questão Agrária Brasileira”, um magnífico conjunto de 300 mapas acompanhados de análises e que foi resultado de uma tese de doutorado desenvolvida por ele para a Universidade Estadual Paulista (Unesp) – a íntegra do trabalho está disponível no site www.fct.unesp.br/nera/atlas.
De acordo com Girardi, o êxodo rural já atingiu uma dimensão quase insana no país devido à modernização descontrolada do grande agronegócio – com sua fome aparentemente insaciável por novas áreas agrícolas, principalmente no centro-oeste e na Amazônia, mas também nas consolidadas regiões sudeste e sul – e à priorização da industrialização. Em 1970, a população rural brasileira era de 41 milhões. Hoje, é de 16,4 milhões – para um total de pouco mais de 180 milhões de habitantes. Não é à toa que quase toda cidade brasileira de porte grande e médio está inchada e com problemas sociais sangrando pelas costuras.
“A melhoria da qualidade técnica da agricultura familiar brasileira é essencial para reverter esse processo”, adverte o geógrafo. “Mas ela não pode ser seletiva, tem de ser abrangente e incluir o máximo possível de produtores, levando em conta as peculiaridades regionais e culturais e o respeito ao meio ambiente. É óbvio que para isso a estrutura fundiária brasileira também tem de ser modificada, e que, portanto, uma ampla reforma agrária continua na ordem do dia.”
Sem implementos, o trator é inútil
Uma espécie de coadjuvantes no Mais Alimentos, os fabricantes de implementos agrícolas querem aumentar a participação do setor no programa. Hoje, com a sobra do financiamento de R$ 100 mil – cuja parte do leão é usada para a compra do próprio trator e em eventuais projetos de melhoria dos cultivares –, o agricultor familiar consegue adquirir, no máximo, implementos básicos como plantadeiras, grades aradoras e distribuidores de calcário para acoplar ao trator.
“É o mínimo do mínimo. Existem muitos outros equipamentos no mercado que facilitariam ainda mais o trabalho e elevariam em grau mais alto a produtividade, como cultivadores e roçadeiras hidráulicas”, explica Celso Casale, presidente da Câmara Setorial de Máquinas e Equipamentos Agrícolas da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), que reúne 170 dos 360 fabricantes instalados no país. “Mas são equipamentos com mais tecnologia, e por causa do preço acabam não sendo adquiridos pelos beneficiários do programa.”
A proposta da câmara da Abimaq – cujo setor faturou em 2009 algo em torno de 30% menos que em 2008, mesmo com o governo federal tendo reduzido os juros do programa Finame (voltado ao mercado de máquinas e equipamentos) para 4,5% durante boa parte do ano passado – é que o limite de R$ 100 mil do Mais Alimentos seja expandido para R$ 150 mil, de modo que R$ 50 mil possam ser usados diretamente na compra de implementos agrícolas.
A entidade também já sugeriu ao governo de São Paulo a criação do programa Pró-Implementos, como uma espécie de complemento do programa Pró-Trator, que, a exemplo do paranaense Trator Solidário, subsidia exclusivamente a compra desse tipo de equipamento.
Casale reclama ainda do governo um pouco mais de orientação técnica para os pequenos agricultores sobre a utilidade e aplicação dos implementos. “Muitos agricultores estão comprando apenas o trator, deixando os implementos para depois”, afirma. “É um erro gravíssimo, porque o trator sozinho não serve para nada, a não ser para o agricultor passear na cidade. É inadimplência na certa.”
Setor é muito pouco informatizado
Se o processo de mecanização avança a passos largos na agricultura brasileira, o mesmo não se pode dizer da informatização. De acordo com o censo agropecuário do IBGE, apenas 3,55% das propriedades rurais têm acesso a computador e 1,45% à internet. Nos dois casos, a esmagadora maioria das fazendas que dispõem desses recursos pertence ao nicho do grande agronegócio.
“Os segmentos mais informatizados são aqueles voltados para a exportação, como os de grãos, cana-de-açúcar, pecuária bovina e citricultura”, informa a analista de negócios Cássia Isabel Costa Mendes, da divisão Informática Agropecuária da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). “Isso é perfeitamente explicável, já que o controle do manejo é condição obrigatória para a exportação, e a informática ajuda muito nesse trabalho.”
A Embrapa Informática Agropecuária acompanha com olhos atentos os avanços nessa área. Desde outubro de 2007, Cássia está coordenando o “Estudo do Mercado Brasileiro de Software para o Agronegócio”, que visa identificar a oferta e as características desse mercado, mapear as principais demandas dos produtores rurais e, a partir do cruzamento desses dois vetores, descobrir as lacunas do setor e traçar cenários de resolução.
A pesquisa deve estar concluída neste ano e, com base nela, a empresa tentará convencer o governo a criar linhas específicas de financiamento para o produtor rural que quiser se informatizar (a falta de capital para investir em estrutura física, além da carência de capacitação, é um empecilho principalmente para os pequenos agricultores familiares).
Já existem no Brasil várias empresas desenvolvedoras de programas para computador com foco no segmento agrícola. De acordo com Cássia, elas já somariam 128 em todo o país, das quais 64% estão concentradas na região sudeste. Praticamente todas as necessidades do produtor rural são atendidas por esses softwares, cujo número ultrapassa 400: da administração contábil da fazenda ao gerenciamento de insumos, do manejo animal e vegetal ao controle de processos e à topografia.