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Ilustração de Marcos Garuti
No meu quintal... um pedaço do mundo
por Denise Minichelli Marçon
Quando estou no trânsito, observando a cidade em seu incansável movimento pelas janelas do carro, e cruzo com alguém corajoso em cima de sua bicicleta enfrentando o desafio de chegar ao seu destino são e salvo, uma imagem recorrente vem em minha mente: a de uma época em que eu também me sentia um ser valente.
Meu desafio? Era o de manter o equilíbrio em cima de minha bicicleta, que também era de minha irmã mais velha, em um corredor estreito no quintal da casa de meus pais.
Foi lá que aprendi a dominar o medo de cair. Um segredo: o corredor era tão estreito que o máximo que podia acontecer era me ralar um pouco na parede áspera, coisa que por sinal sempre acontecia. Mas valeu a pena, dias depois (ou foram semanas?), o aprendizado aconteceu e lá estava eu pilotando minha bicicleta sozinha, sob o olhar atento de meus pais sempre cuidadosos e amorosos, prontos para uma palavra de estímulo e de reconhecimento.
Percebo que hoje talvez já não tenha a mesma coragem, pelo menos não para enfrentar com a minha bicicleta longos percursos em uma cidade tão intensa como São Paulo, que privilegia o transporte individual motorizado e que em alguns aspectos me parece assustadora e desumana, com gritantes diferenças sociais, crescimento acelerado e desordenado, poluição atmosférica, hídrica e sonora (entre outras que com certeza já inventamos), consumo exagerado e muitas vezes desnecessário, congestionamento no trânsito, no metrô, no trem, no ônibus, nas calçadas, falta de tempo para curtir a família, os amigos, para o lazer ou simplesmente para não fazer nada.
Nosso desafio? É pensar em como transformar esta cidade em uma cidade mais acolhedora, mais inclusiva, mais criativa, mais sustentável... Sustentável? Taí uma palavra que vamos ter que incluir em nossas reflexões e ações diárias, se ainda não o fizemos.
Acredito que a sustentabilidade seja o caminho mais inteligente a ser?seguido, pois ele na verdade irá sinalizar uma mudança de rumo para a humanidade. Mas como sair das reflexões para a prática? Como possibilitar ações que consigam efetivamente nos conduzir a um futuro mais feliz?
Perceber em nossas ações institucionais um movimento coletivo e propositivo nos fortalece. Os programas desde sempre valorizam as relações humanas, o tempo livre, a cultura, a troca, o brincar, o diverso, a promoção da saúde, a atividade física, a inclusão, os espaços acolhedores e hoje valorizam cada vez mais a preservação de áreas naturais, o consumo socialmente e ambientalmente responsável, a redução e o reaproveitamento de resíduos, além da coleta seletiva, os movimentos sociais, a corresponsabilidade, o estímulo ao uso de meios de transportes menos poluentes, as construções sustentáveis com estruturas e programas ecoeficientes, ventilação cruzada, energia solar, captação de água de chuva, telhados e paredes verdes, piso permeável, espaços educadores e as agendas 21 locais, que permitem o exercício pleno da cidadania, pois estimulam as discussões entre a comunidade, a iniciativa privada e o poder público, fomentando a criação de políticas públicas com enfoque no desenvolvimento sustentável.
Respostas? Acho que não temos todas, mas com certeza cada nova pergunta nos leva a mais um desafio. E não é o desafio o motor propulsor da descoberta? Talvez tenhamos todos que pensar em como transformar o mundo no quintal da nossa infância, num espaço inspirador e seguro onde criávamos um universo de possibilidades.
Caberá a nós essa construção, e deve ser agora. Digo isso não porque acredito que não haverá mais tempo, mas porque devemos ser felizes hoje e não apenas algum dia.