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O sucesso dos contatos imediatos

Redes sociais tomam conta da internet e agilizam troca de informações

NATÁLIA SUZUKI


Obama: uso pioneiro
Foto: Júlia Toro/Célia Thomé

Quinze anos após a chegada da internet ao Brasil, o país já ocupa a quinta colocação mundial em número de conexões à rede, segundo pesquisa do Ibope Nielsen Online, realizada em dezembro de 2009. Num breve período, nós nos habituamos às trocas de e-mails, às conversas virtuais, às coberturas jornalísticas em tempo real e à praticidade das compras online. Na época do estudo citado, já se computavam mais de 65 milhões de internautas entre os brasileiros.

Contudo, há sempre o que inovar num mundo em que as atualizações não cessam e a velocidade com que surgem é muito maior que nossa capacidade de assimilação. O boom do momento são recursos que permitem a interação entre os usuários e estimulam o intercâmbio de informações, como as redes sociais virtuais. Orkut, Facebook e Twitter são algumas dessas experiências. Além delas, blogs, comunicadores instantâneos, wikis e sistemas para compartilhamento de fotos e de arquivos de vídeo e áudio são outros exemplos dessas mídias disponíveis na internet.

A definição desses instrumentos é um ponto capcioso e fonte de divergências entre os estudiosos da área, mas alguns se arriscam a englobá-las no que se costuma chamar de novas mídias. Elas seriam um contraponto às tradicionais, como a televisão, o rádio, as revistas e os jornais impressos, já que os sistemas online permitem que qualquer pessoa seja produtora e receptora de conteúdos. A publicação e a divulgação acontecem de forma descentralizada, com baixos custos, ampliando o alcance público. 

As queridinhas da web

As redes sociais colocam pessoas em contato, estimulam a interação entre elas e identificam preferências, promovendo a criação de comunidades. Além disso, são espaços para compartilhar interesses, trocar experiências e criar oportunidades. Nos últimos dois anos, elas se popularizaram e as adesões cresceram em ritmo exponencial no Brasil. Segundo uma pesquisa encomendada pelo Google à Netpop Research, divulgada no final de julho do ano passado, 57% dos internautas brasileiros acessam diariamente alguma rede social, um número acima da média mundial, que é de 31%. 

De acordo com Eric Messa, professor da disciplina Novas Tecnologias da Comunicação da Faculdade de Comunicação e Marketing da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap), a sociedade passou por um período de adaptação ao meio digital e hoje ele reflete a necessidade de as pessoas interagirem e participarem da produção de conteúdos. “No início, ninguém sabia mexer na internet e, muito menos, interagir nesse espaço. Nesse contexto, as redes sociais representam um caminho evolutivo do meio digital. Elas evidenciam conceitos como a colaboração e a participação, que são desejos da própria sociedade.” 

A maior dessas redes é o Facebook, que conta com mais de 400 milhões de usuários em todo o mundo. Criada há seis anos nos Estados Unidos, tem atualmente 70% de seus participantes espalhados por outros países. No Brasil, essa mídia vem ganhando espaço. Em maio de 2009, registrava pouco mais de 1 milhão de cadastrados. No final do ano, eles já eram quase 6 milhões, segundo pesquisa do Ibope Nielsen Online. 

O campeão de acessos por aqui, no entanto, continua sendo o Orkut. Criado em 2004, tem como a maior fatia de seus usuários os brasileiros: são 23 milhões de perfis, que representam 51% do total mundial. Outra rede que se popularizou nos últimos meses e continua crescendo entre nossos internautas é o Twitter. Diferentemente das outras duas redes sociais, esta permite que o usuário escreva mensagens de até 140 caracteres que podem ser lidas em tempo real por aqueles que seguem seu perfil, o tweet. Essas pílulas de informação podem ser acompanhadas por amigos ou por estranhos, se o perfil for público, diversamente do que ocorre no Orkut e no Facebook, em que a conversa se limita a uma roda quase íntima de contatos.

O Twitter conta com 58 milhões de usuários no mundo todo. Um estudo realizado pela Sysomos, em janeiro deste ano, mostra que os brasileiros são o segundo público que mais frequenta a rede, com 8,79% dos usuários. Em primeiro lugar estão os americanos, com 50,88%, e uma das explicações para tal sucesso é a adesão de celebridades. Milhares de fãs podem seguir o que seus ídolos dizem que estão fazendo por meio de seus perfis.

Porém, como essas estatísticas se traduzem no cotidiano das pessoas? Problemas Brasileiros recolheu depoimentos sobre o modo como esses instrumentos são capazes de transformar antigas relações em diversos âmbitos, como a política, o trabalho, o exercício da cidadania e a educação. 

“Yes, we can”

O slogan acima ficou famoso na campanha de Barack Obama à presidência dos Estados Unidos no ano passado, na qual pela primeira vez o uso de redes sociais foi adotado oficialmente por um candidato como instrumento estratégico. Antenada à popularização desses recursos, principalmente entre os jovens, sua equipe de marketing utilizou o Facebook e o Myspace. “Experimentamos de tudo e, à medida que as redes surgiam, aprendíamos como funcionavam. Claro que seu uso também apresenta um risco, mas a tentativa vale a pena, devido ao benefício que podem trazer”, avalia Scott Goodstein, o marqueteiro da campanha de Obama.

No início da candidatura, o Twitter ainda era pouco usado pelo público e, por isso, não foi feito grande investimento em sua utilização. A equipe de Goodstein, porém, percebeu o poder da web quando as informações da campanha começaram a ser rapidamente disseminadas e o próprio eleitorado passou a produzir materiais pró-Obama, como arquivos de áudio e vídeo, que eram divulgados nas redes sociais. O marqueteiro explica que nessas mídias era fácil identificar com quem deveriam dialogar, porque era possível encontrar grupos organizados em torno de preferências e interesses políticos. Assim, as propagandas eram direcionadas mais certeiramente a um público específico. Segundo Goodstein isso foi fundamental para a vitória de Obama.

Além disso, o marqueteiro avalia que o perfil do próprio candidato colaborou para a adoção dessas mídias como estratégia de marketing. “Não tínhamos de explicar o que significava cada ferramenta da web para Obama, porque ele já sabia da importância delas na comunicação com o eleitorado.”

E, olhando para os trópicos, como o governo brasileiro tem lidado com a internet? A administração Lula parece ser adepta do uso político da rede. Além de vetar a decisão do Congresso que restringia seu uso nas eleições e apoiar a criação de um marco civil regulatório para a internet brasileira, desde o ano passado o governo atualiza suas notícias pelo Blog do Planalto (blog.planalto.gov.br).

Na época de seu lançamento, em setembro de 2009, o veículo foi criticado porque não permitia que os leitores deixassem comentários sobre os conteúdos postados. Foi a partir daí que dois jovens resolveram cloná-lo. Daniela Silva e Pedro Markun criaram um outro endereço semelhante ao do blog oficial (planalto.blog.br), para onde todo o conteúdo original era redirecionado. No clone, eles abriram espaço para os tão requisitados comentários. “A ação foi uma provocação à rede. Ela não tinha pretensão de obter uma resposta oficial, mas conseguimos criar mecanismos para interferir na política. Soubemos que o governo teve de sentar para discutir o que fizemos”, explica Markun. 

Intervenções como essa são um exemplo de civic hacking, movimento do qual Daniela e Pedro são ativistas e cujo objetivo é usar a internet em ações de engajamento político. A ideia é estimular a participação ativa dos cidadãos em prol de interesses públicos que, geralmente, são discutidos e debatidos apenas na esfera do poder. “É um modo de redescobrir a política”, define o jovem. 

“Anuncie aqui!” 

Há quase dois anos, o designer Tiago Yonamine criou o @trampos, um perfil no Twitter para anunciar empregos na área de comunicação digital e publicidade. No início, o objetivo de Yonamine era divulgar as dicas para pessoas próximas, mas a iniciativa acabou virando uma versão contemporânea dos classificados de domingo. “Não sabia a dimensão que isso ia tomar, mas o potencial viralizador do Twitter espalhou a ideia e agora são mais de 17 mil pessoas que o seguem”, diz. Atualmente, o tweet é procurado também pelos departamentos de recursos humanos de agências que têm interesse em divulgar oportunidades. Segundo uma pesquisa que Yonamine realizou entre seus seguidores, até o final do ano passado, 200 pessoas foram contratadas por meio da iniciativa.

O sucesso foi tão grande que ele teve de segmentar os nichos de trabalho, criando filiais. Hoje, mantém os perfis @estagios, @tramposTI e @tramposfreelas. Yonamine ressalta que as redes sociais e outros recursos da internet não modificam apenas a forma como se procura ou se oferece um trabalho. Cada vez mais os profissionais incorporam esses instrumentos a suas atividades diárias. “Novas profissões apareceram e aquelas que já existiam exigem que se conheçam as redes sociais para fazer planos de comunicação”, afirma ele.

A profissão de analista de redes sociais, por exemplo, surgiu dessa necessidade. Trata-se de alguém responsável por produzir conteúdo para essas mídias e monitorar o que se diz sobre a marca de uma empresa. “Há alguns anos, ninguém imaginaria que poderia existir uma pessoa que fosse paga para ficar o dia inteiro no Orkut”, comenta.

Mudar_o_mundo.com.br

No começo do ano, o Haiti foi assolado por um terremoto. Em meio à tragédia, pessoas do mundo inteiro foram informadas em tempo real sobre a situação da ilha e também puderam se mobilizar por meio das redes sociais em campanhas humanitárias. As instituições do terceiro setor começaram a buscar colaborações e a aconselhar o público a fazer sua parte por um mundo melhor a partir do uso da internet. Pedidos de doação e de participação de voluntários foram feitos virtualmente por meio do Facebook e do Twitter. 

No universo institucional não é diferente. Victor Graça, gerente executivo da Fundação Abrinq, explica que os objetivos do uso dessas mídias, no caso da instituição, são a criação de um capital social e a mobilização das pessoas pelo direito da criança. Para isso, a Abrinq mantém o perfil @fundacaoabrinq no Twitter, que reúne 3,5 mil seguidores desde junho de 2009. A ideia é que cada seguidor faça uma pequena doação, formando uma rede em prol das crianças e dos adolescentes. “É uma ação para que se pratique a filantropia engajada”, avalia. 

Há pouco tempo, o Greenpeace também entrou para o rol das instituições do terceiro setor que praticam o ciberativismo como estratégia. O diretor de comunicação do Greenpeace Brasil, Kiko Brito, afirma que a ONG ainda está experimentando o uso das redes. “Elas servem para mobilizar, engajar, informar sobre questões ambientais e fazer o público abrir a carteira, porque o Greenpeace não recebe dinheiro do poder público e de empresas. Toda a verba vem de doações”, explica. 

Brito afirma que o maior sucesso tem ocorrido no Twitter, que, em pouco tempo, conquistou mais de 51 mil seguidores. “Usamos esse instrumento para fazer coberturas ao vivo de eventos e para dar greendicas ao público. Porém, é preciso evitar muitos tweets seguidos sobre o mesmo assunto.” O diretor lembra que, certa vez, foram feitas muitas atualizações seguidas sobre a preservação do atum-azul. “Perdemos quase mil seguidores naquele dia”, lamenta.

Ensinar a pensar 

Na sala de aula, as redes sociais e outros instrumentos disponíveis na internet vêm transformando a dinâmica e o formato tradicional da aprendizagem. Fora dela, seus efeitos e usos suscitam o debate sobre o papel e a postura que as instituições de ensino devem ter como orientadoras desse processo. “Hoje lidamos com um jeito novo de trabalhar com o conhecimento. No ambiente de ensino, o professor precisa aceitar as interferências do aluno, o que faz com que a aula seja uma conversa. Esses instrumentos contribuem para essa relação, porque estimulam a participação e a interação”, explica Eric Messa, da Faap.

Segundo Jaciara Sá, pesquisadora e docente do curso de pós-graduação de tecnologias na aprendizagem do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), os recursos da web introduziram uma nova noção de tempo e espaço no ambiente de ensino. “A internet derruba as paredes da escola na medida em que o professor não precisa mais se ater ao período de 45 minutos de aula. Por outro lado, esse tipo de relação leva a um aumento de trabalho. Existe até uma discussão para que professores ganhem pelas horas extras em que desenvolvem atividades virtuais, como responder a e-mails de alunos e dialogar com eles por blogs, por exemplo”, diz. 

As instituições de ensino também têm dedicado espaço, nos currículos formais, ao estudo desse novo campo. A finalidade é preparar o aluno para trabalhar com as novidades do mundo digital. Paula Carolei, coordenadora do curso de pós-graduação de tecnologias aplicadas do Senac, explica que o importante não é apenas ensinar o aluno a fazer um produto com os recursos da web, mas a refletir e a analisar o processo por meio do qual ele é feito. Como as atualizações nessa área são constantes, não adianta o curso ser meramente instrumental. “Alunos mais velhos tendem a pedir que se ensine o passo a passo, mas tento fazer com que compreendam a lógica de funcionamento da mídia. É preciso deixar de ser espectador para aprender a ser usuário e encontrar a solução diante de um instrumento digital, porque ela sempre existe”, afirma. 

Além de capacitar o aluno para o uso dessas ferramentas, os educadores têm o papel de orientá-lo sobre seus efeitos. “Hoje em dia, não se transmitem mais regras, mas é preciso que o aluno crie uma consciência crítica em relação às redes sociais. Não digo o que ele deve ou não fazer na internet. Prefiro levá-lo a refletir sobre o uso desse instrumento, avaliar as consequências de sua exposição e, então, decidir o que fazer”, diz Messa. 

Outro desafio para o profissional de educação é a constante exigência de que ele se mantenha informado sobre as novidades do meio. “É interessante, para sua formação, que ele conheça as inovações, mas a incorporação desses instrumentos só deve ser feita se houver uma finalidade educacional”, diz Jaciara. De modo análogo, Messa afirma que as redes sociais trazem novas possibilidades à educação, mas não são necessariamente uma obrigação. “O uso delas é escolha individual de cada professor.”


Os pequenos internautas

Até há pouco tempo, o público infanto-juvenil assumia uma posição passiva diante dos recursos e dos conteúdos da internet. Na maioria das vezes, crianças e adolescentes se limitavam a consumir o que estava à disposição na rede. Hoje, esse grupo também é agente ativo no mundo virtual. Além de serem frequentadores assíduos das redes sociais, esses pequenos internautas utilizam outros instrumentos, como o blog, para expressar ideias e divulgar suas criações. 

João Montanaro, de 13 anos, é um desses casos. Sempre gostou de desenhar e, quando seu traçado ganhou mais firmeza e definição de estilo, começou a usar esse meio (http://porjoao.blogspot.com/) para divulgar seu trabalho. Até então, ele organizava os desenhos em uma pastinha. Depois que a internet chegou a sua casa, há quase dois anos, ele passou a enviar sua arte para quem pudesse se interessar por e-mail. Foi assim que o cartunista Ota, da revista “Mad”, conheceu seu trabalho. Há alguns meses, o jornal “Folha de S. Paulo” entrou em contato com João e o convidou a fazer ilustrações para a “Folhinha”. Hoje, o traço do desenhista mirim pode ser visto nas duas publicações.

João conta que o pai, Mario Barbosa, foi seu grande incentivador. “Ele sempre me dava dicas e sugestões do que fazer no blog. Às vezes, era o único que o acessava”, lembra. Com o blog, a exposição de João na rede aumentou e a interação do menino com pessoas desconhecidas também. Diante disso, o garoto propôs ao pai que compartilhassem também a senha de seu e-mail para que ele acompanhasse com quem estava se comunicando. 

Mario diz que não existem critérios específicos quanto ao que permitir ou vetar a seus três filhos, mas se preocupa em acompanhar os conteúdos acessados por eles e sempre alertá-los sobre os perigos que a rede pode oferecer. Uma das regras é que as crianças só usem o computador por até uma hora por dia. “A internet pode viciar. Há momentos em que digo a eles para desligar tudo e ir para a rua andar de bicicleta”, conta com bom humor. 

 

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