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Litígio sem fim no pontal da discórdia
No extremo oeste de São Paulo, movimentos sociais e fazendeiros disputam posse da terra
CARLOS JULIANO BARROS
Arte PB
Quando o assunto é questão fundiária, o Pontal do Paranapanema é sempre lembrado como um dos mais agitados palcos de conflitos no Brasil. A fama dessa região situada no extremo oeste de São Paulo tem sua razão de ser. De um lado, estão proprietários de imensas fazendas que não medem esforços para preservar seu patrimônio. De outro, quase 4 mil famílias sem-terra, organizadas em seis movimentos diferentes, que aguardam acampadas em barracos de lona um tão sonhado pedaço de chão. No fogo cruzado entre esses dois grupos, que definitivamente não falam a mesma língua, aparece o governo do estado, principal vetor da reforma agrária no Pontal.
O motivo de tanta discórdia está, obviamente, relacionado à posse das terras. Os fazendeiros ostentam escrituras registradas em cartórios que supostamente comprovariam o domínio legítimo sobre elas. Entretanto, o Poder Executivo estadual tenta há tempos provar na Justiça que ocorreu um processo de "grilagem" dessas áreas 150 anos atrás. Isso quer dizer que os primeiros títulos das glebas, que deram origem aos atuais, foram expedidos de forma irregular. Assim, elas constituiriam na verdade terras públicas – também chamadas de "devolutas". A partir da década de 1980, os movimentos sociais pegaram carona nessa confusão toda ao vislumbrar um caminho para cobrar do governo mais agilidade na criação de assentamentos. Tanto é que, dos 168 existentes atualmente em São Paulo, 103 estão localizados no Pontal.
Limitada pelo encontro dos rios Paraná e Paranapanema, a Região Administrativa de Presidente Prudente, como também se pode chamar aquela porção, é a segunda mais pobre do estado, à frente apenas do vale do Ribeira. O baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) dessas duas áreas inspira tanta preocupação que foram as únicas da mais rica unidade da federação incluídas no Territórios da Cidadania – programa social do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, lançado no final de fevereiro, que reúne diversas ações já existentes, como o Bolsa Família, para combater a miséria rural em todo o país.
"Essa já foi uma das regiões mais prósperas do estado, mas perdeu sua capacidade de produção em função do problema fundiário. Ninguém quer investir em áreas conflituosas", afirma Marco Antonio Rocha, prefeito de Regente Feijó e presidente da Unipontal, entidade que reúne os 30 municípios que compõem o Pontal do Paranapanema.
Resolver essa verdadeira batalha por terras é uma pedra que os governadores paulistas tentam tirar do sapato há décadas. A proposta mais recente para acalmar os ânimos é um projeto de lei (PL) concebido pelo gabinete de José Serra (ver texto abaixo). A idéia é realizar acordos entre Estado e fazendeiros para regularizar aproximadamente 200 propriedades que ocupam 300 mil hectares. O governo abriria mão de questionar a posse das áreas na Justiça desde que os atuais ocupantes cedessem parte da gleba ou pagassem o equivalente em dinheiro para a instalação de novos assentamentos.
No entanto, o novo plano para apaziguar as brigas no Pontal não satisfez por inteiro nenhuma das partes envolvidas. "O PL pode ajudar na regularização, mas desde que haja algumas mudanças", afirma Jacob Tosello Júnior, presidente do Sindicato Rural de Presidente Prudente. As principais queixas dos fazendeiros dizem respeito aos custos do processo de demarcação das áreas e ao tamanho da parcela de terra a ser entregue ao Estado como contrapartida, que eles julgam grande demais.
Já os movimentos sociais reagiram de forma mais enérgica. Só em fevereiro, por exemplo, foram realizadas quase duas dezenas de ocupações em fazendas do Pontal em protesto ao PL e à lentidão do ritmo da reforma agrária. "Esse projeto de lei é ilegal e imoral. O Estado já moveu várias ações, cujos resultados mostraram que as terras são públicas. O que o governador Serra tem de fazer é continuar na Justiça para provar que as áreas em disputa são devolutas e reivindicar o que é público de volta", afirma José Rainha, uma das principais lideranças dos sem-terra na região.
As críticas à nova proposta, porém, não param por aí. Segundo a Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra), o projeto está recheado de falhas técnicas. Em primeiro lugar, ao não impor um limite de extensão para as propriedades a regularizar, bate de frente com a própria Constituição Federal. Além disso, "antecipa o julgamento de processos que estão na Justiça, e dá ganho de causa aos grileiros. O Estado não pode abrir mão do patrimônio público em favor de particulares. E é isso o que está ocorrendo", contesta Sabrina Diniz, advogada da Abra.
Raízes do problema
Afinal de contas, por que o Pontal do Paranapanema se transformou em uma das principais vitrines dos conflitos fundiários no país? Para responder a essa delicada questão, é necessário viajar aos tempos do Império, mais precisamente a 18 de setembro de 1850. Foi nessa data que surgiu a chamada Lei de Terras.
Entre outras medidas, as regras assinadas por dom Pedro II estipulavam um prazo para que todas as glebas ocupadas até o surgimento dessa nova legislação tivessem suas escrituras devidamente registradas. As áreas não tituladas por particulares deveriam ser devolvidas ao patrimônio do governo. Vem daí o termo "devolutas" – que significa, portanto, terras públicas. Como naquele tempo o Império não tinha estrutura para atender aos fazendeiros, quem ficava com a responsabilidade de certificar as escrituras eram as paróquias da Igreja Católica espalhadas pelos mais recônditos rincões do território nacional. Já as áreas devolutas passaram, com a proclamação da República, para a responsabilidade dos Executivos estaduais.
Essa breve explanação histórica é fundamental para compreender o processo de grilagem no Pontal do Paranapanema, uma vez que grande parte das atuais propriedades localizadas no extremo oeste de São Paulo surgiu do desmembramento de duas fazendas gigantescas que, incrivelmente, abocanhavam boa parte dos 18 mil km2 da região: a Aguapehy e a Pirapó-Santo Anastácio. O problema é que os títulos de ambas, que remontam justamente à segunda metade do século 19, sempre levantaram fortes suspeitas de irregularidades.
A descrição da geografia e dos limites das glebas contidas em suas escrituras era bastante imprecisa, já que não havia mapas que retratassem de maneira confiável aquela área, desconhecida pelo próprio poder público. Além disso, no caso da Pirapó-Santo Anastácio, uma perícia realizada na década de 1930 comprovou que a assinatura do pároco que supostamente autenticara um título registrado em nome de Antônio José Gouveia, em 1856, havia sido falsificada. Ou seja: tratava-se de uma extensão equivalente a 600 mil campos de futebol apropriada por meio de fraude. Sem contar que é no mínimo improvável que Gouveia conseguisse cuidar sozinho de tanta terra.
O fato é que as fazendas Aguapehy e Pirapó-Santo Anastácio foram repartidas em lotes mais acanhados, vendidos e revendidos a uma enxurrada de aventureiros interessados em colonizar o chamado "sertão paulista". Com o passar do tempo, os governadores estaduais até tentaram colocar ordem na casa – seja por meio de ações na Justiça para recuperar as terras devolutas, seja através de acordos que regularizassem as posses. "Os fazendeiros, no entanto, achavam que as terras eram deles e que jamais seriam retomadas", conta Carlos Alberto Feliciano, pesquisador da Universidade de São Paulo (USP). "Isso foi criando um problema maior, porque as glebas foram repassadas para terceiros, quartos. A grande confusão da cadeia dominial é essa. Não se sabe quem comprou de boa ou má-fé", explica.
Todo esse imbróglio já foi objeto de inúmeros estudos acadêmicos. E, como é evidente, nem todos os personagens dessa novela no Pontal têm a mesma interpretação sobre os acontecimentos. Para Luiz Antonio Nabhan, presidente da União Democrática Ruralista (UDR), entidade que se dedica à "defesa do direito de propriedade" dos fazendeiros da região, a grilagem de terras não passa de "lenda" e "farsa". "Todos os proprietários aqui têm seus títulos registrados em cartório. O Estado recebeu inclusive o Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI)", afirma Nabhan. "É um despropósito reivindicar essas áreas na Justiça, já que ele próprio recebeu tributos e outorgou a escritura sobre elas", completa.
A ocupação do Pontal do Paranapanema, na virada do século 19 para o 20, pode ser comparada ao fenômeno que se observa hoje em dia na Amazônia. O extremo oeste de São Paulo era a última fronteira agrícola do estado, com uma riquíssima vegetação de mata atlântica praticamente intocada. Entretanto, com a chegada dos desbravadores, a floresta nativa foi cedendo espaço a plantações de café e algodão. A partir dos anos 1940, o crescimento desordenado da região passou a chamar a atenção da imprensa, que deu início a uma verdadeira cruzada em defesa da natureza do sertão paulista.
Para contornar o problema, o governo anunciou a criação, no início da década de 1940, de três reservas com o intuito de proteger aproximadamente 300 mil hectares da mata atlântica local. A falta de fiscalização, porém, serviu de verdadeiro convite à devastação e ao comércio de madeiras nobres. O saldo é desolador. Hoje, restam apenas 10% da área inicial das reservas, resguardados pelo Parque Estadual do Morro do Diabo, localizado no município de Teodoro Sampaio. Os descampados planos a perder de vista, onde atualmente predomina a pecuária extensiva, substituíram a paisagem da floresta nativa.
Movimentos sociais
Até meados da década de 1980, as brigas judiciais pelas terras do Pontal entre Estado e fazendeiros não despertavam muito interesse dos noticiários. O caldeirão de conflitos começou a ferver com a chegada dos movimentos de luta pela reforma agrária. Na verdade, eles serviram como válvula de escape para uma massa de trabalhadores que ficou sem ocupação com o término da construção da usina hidrelétrica de Porto Primavera – obra faraônica que represou as águas do rio Paraná ao custo de US$ 10 bilhões para a Companhia Energética de São Paulo (Cesp).
"O fim das obras coincidiu com a chegada do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) ao estado de São Paulo. Como a economia regional não conseguia absorver os desempregados, os movimentos perceberam o potencial de organizar esses grupos e começaram a fazer ocupações", explica Carlos Alberto Feliciano. "Por conta disso, caíram em cima da questão das terras devolutas e colocaram esse assunto na mídia", acrescenta.
A primeira resposta efetiva do poder público à demanda das famílias sem-terra foi dada em 1984. Naquele ano, o então governador Franco Montoro fez o assentamento XV de Novembro numa área de 13 mil hectares, entre os municípios de Rosana e Euclides da Cunha Paulista. A reforma agrária no Pontal viveu seu apogeu, no entanto, durante a gestão de Mário Covas. "Ele tinha uma sensibilidade maior, uma visão social da realidade. Entendia de movimento social e compreendeu o problema. Várias vezes agilizou o processo", comenta José Rainha.
Só no seu primeiro mandato, entre 1995 e 1998, Covas criou 83 assentamentos, onde foram instaladas 4.315 famílias em todo o estado – metade do total atual. "Uma de suas iniciativas foi o decreto que permitiu a realização de acordos mediante o mecanismo de transação. Assentamentos foram implantados dentro dessa lógica, em que o governo retoma uma parte e deixa de pleitear a outra, mediante um acordo. É inclusive um dos precedentes do PL que está colocado na Assembléia Legislativa", afirma Gustavo Ungaro, diretor executivo da Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Itesp), órgão responsável pela política fundiária estadual.
Quando Geraldo Alckmin assumiu o Palácio dos Bandeirantes, o ritmo da reforma agrária nitidamente desacelerou. Ele também tentou aliviar as tensões no Pontal ao enviar à assembléia um projeto de lei com o objetivo de regularizar a posse de áreas de até 500 hectares que seguia a mesma linha do atual acordo proposto por José Serra. A idéia, contudo, não vingou: até hoje ninguém aderiu ao plano idealizado por Alckmin. Confiantes na vitória, os fazendeiros preferiram deixar rolar as contendas judiciais, por conta dos custos previstos no acordo.
Questão de Justiça
Segundo dados do Itesp, as terras do Pontal em disputa na Justiça perfazem um total de 270 mil hectares. Atualmente, correm 46 ações discriminatórias movidas pela Procuradoria Geral do Estado (PGE). Ao final do processo é que se decide se as áreas são de fato devolutas ou particulares. Caso a decisão favoreça o governo, isso não significa que ele possa arrecadar imediatamente as glebas para a instalação de novos assentamentos. É necessário, então, entrar com uma ação reivindicatória para definir o valor da indenização a ser paga pelas benfeitorias construídas pelo ocupante. Nem é preciso dizer que esse trâmite pode se arrastar por décadas.
"Para tirar os fazendeiros do Pontal, só com acordo ou decisão judicial. Mas eles jogam com o tempo, orientados por seus advogados, porque acham que vão ganhar na Justiça", analisa o deputado estadual Mauro Bragato (PSDB), que defende o PL de José Serra como instrumento de negociação para resolver as contendas de forma rápida e prática. Apesar disso, o discurso das entidades ruralistas é de confiança no Poder Judiciário. Na verdade, a jurisprudência não está pacificada ainda. "Há decisões contraditórias. Parte considera que lá existem terras particulares, parte as vê como devolutas", explica Gustavo Ungaro.
Um capítulo importante aconteceu em dezembro do ano passado, quando o Superior Tribunal de Justiça (STJ) bateu o martelo a favor do governo, ao afirmar que 1.329 hectares localizados no município de Presidente Venceslau eram devolutos. Um dos ministros que participou da apreciação do caso concluiu que "uma certidão em que a letra e a assinatura não pertencem a quem se faz supor é, para todos os fins, documento inexistente", referindo-se à escritura fraudulenta da Pirapó-Santo Anastácio.
Os fazendeiros ainda podem recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF), a quem cabe o veredicto final. Contudo, o posicionamento do STJ evidentemente agradou à administração pública estadual. O diretor do Itesp acredita que os conflitos fundiários no Pontal só vão se resolver com a palavra final da Justiça. Já outras fontes do próprio governo que trabalham para recuperar as terras devolutas consideram problemático o posicionamento do Judiciário sobre o tema. O raciocínio é simples: se os títulos da maior parte das fazendas do Pontal têm o mesmo vício de origem, por que há sentenças diferentes que ora beneficiam os fazendeiros ora contemplam o poder público?
"Infelizmente, a Justiça tem sido um tremendo empecilho, não só em relação às áreas devolutas, mas à reforma agrária como um todo", alfineta Sabrina Diniz, da Abra. Em sua opinião, o desconhecimento das particularidades do Pontal é uma das razões para o prolongamento dos conflitos. "Um desembargador julga muitos processos por dia, de diversos assuntos. Não é alguém que só analisa matérias de reforma agrária, que conhece a história da região, que sabe o que é um grileiro", comenta.
Futuro
A ex-funcionária pública Cleide Costa abandonou o trabalho na cidade para realizar o sonho de tocar um pequeno lote de terra no município de Caiuá. A venda de leite de vaca a laticínios da região é a base de sua renda, assim como a da esmagadora maioria dos pequenos produtores do Pontal. Ela está bastante empolgada, no entanto, com uma parceria firmada entre o Itesp e a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que encaminha verduras e legumes produzidos no seu assentamento para escolas e hospitais da região. Aquilo que Cleide não consome, e que vai parar principalmente no prato das crianças de Caiuá, engorda seu orçamento em R$ 3,5 mil ao ano.
Pedro Alcântara é outro que não tem saudades do passado, quando labutava como empregado em grandes fazendas do Pontal. Hoje ele administra 20 hectares de terra em Mirante do Paranapanema. Além de produzir farinha de mandioca em uma engenhoca construída com as próprias mãos, Pedro vende o fruto avermelhado de uma árvore chamada urucum para a Chr. Hansen – multinacional que fabrica corantes naturais para roupas e alimentos. Na época da colheita dos cachos, um caminhão da empresa passa pelos assentamentos do Pontal recolhendo a matéria-prima. Esse negócio direto elimina os atravessadores e eleva substancialmente o ganho dos pequenos agricultores, que tiram alguns milhares de reais em uma só safra.
Os casos relatados acima são soluções interessantes para o problema que atormenta os beneficiários da reforma agrária em todo o Brasil: a comercialização da produção. Também provam que a chave do sucesso da agricultura familiar é apostar na diversificação das atividades. Existem no Pontal outros exemplos interessantes, como o da piscicultura, o da criação do bicho-da-seda e o do cultivo da mamona para a fabricação de biodiesel, que trazem retorno satisfatório aos que investem nessas idéias.
Infelizmente, experiências dignas de admiração ainda estão longe de virar regra. Um levantamento do próprio Itesp concluiu que a média do rendimento dos assentados fica na casa dos R$ 600 mensais. "Fazer um lote produzir não é fácil. As famílias chegam totalmente descapitalizadas e se deparam com uma terra fraca, devastada. Então, recebem 20 hectares sem água, luz, moradia. O que elas vão fazer?", indaga Nazaré da Silva, vereadora e assentada de Mirante do Paranapanema. "É daí que vêm as críticas das pessoas que não conhecem a realidade do assentado, e que dizem que ele não produz, que vende o lote e acaba indo embora", desabafa. Promover desenvolvimento e garantir qualidade de vida aos pequenos produtores já instalados no Pontal é definitivamente um dos principais desafios do poder público.
Outro fenômeno relevante para entender atualmente a região é a expansão das lavouras de cana-de-açúcar. Curiosamente, os conflitos fundiários parecem não espantar os investimentos do segmento sucroalcooleiro, uma das potências do agronegócio nacional. Em julho do ano passado, por exemplo, a ETH Bioenergia – do grupo da mega-empreiteira Odebrecht – gastou R$ 289 milhões na compra da Usina Alcídia, tradicional produtora de álcool e açúcar, em Teodoro Sampaio. E a empresa já tem o projeto de mais uma unidade em fase de licenciamento. Outras corporações de peso também manifestaram interesse em apostar suas fichas no Pontal.
A verdade é que a ETH nem precisa de áreas próprias para plantar cana. O grosso da matéria-prima vem de fornecedores terceirizados ou de fazendas arrendadas pela empresa. "O Pontal é a única região do estado que ainda tem disponibilidade de terras para a instalação de um projeto sucroalcooleiro capaz de gerar muitas divisas", afirma Rocha, prefeito de Regente Feijó. Por outro lado, os movimentos de luta pela reforma agrária não vêem com os mesmos bons olhos a expansão da cana no extremo oeste paulista. "Ela gera riqueza, sim, mas só para o usineiro. Não cria emprego para essa população dependente que vive no Pontal, porque hoje existe máquina que planta e colhe cana. Isso pode acirrar ainda mais as disputas por terra", alerta Laércio Barbosa, da direção do MST.
O Pontal do Paranapanema é daqueles lugares do Brasil onde o tema da reforma agrária desperta paixões ideológicas e reergue bandeiras que muita gente acredita estarem fora de moda. Como em outras áreas de conflito, no entanto, o saldo das disputas ainda está longe de garantir justiça social e promover desenvolvimento. Pôr fim a essa batalha que já dura décadas, e que pode se prolongar indefinidamente, depende apenas da vontade política das autoridades do Poder Executivo e, principalmente, do Judiciário. Resta saber de que lado eles vão ficar. A resposta só o tempo dirá.
O que diz o PL 578
Enviado pelo governador José Serra à Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo em junho do ano passado, o projeto de lei 578/2007 já está pronto para ser votado pelos deputados.
Segundo o texto, o Estado "renunciará ao direito de discutir, discriminar ou reivindicar" na Justiça as terras "presumivelmente devolutas" do Pontal do Paranapanema ocupadas por grandes fazendeiros, desde que eles entreguem parte delas para a instalação de novos assentamentos, na seguinte proporção:
• Áreas de 500 a 1.000 hectares: 15%
• Áreas de 1.000 a 2.000 hectares: 20%
• Áreas superiores a 2.000 hectares: 25%
Para quem não quiser abrir mão de parte da gleba, o PL também possibilita o pagamento ao Estado do preço da fatia de terra nua que seria destinada ao patrimônio público. Nesse caso, o fazendeiro pode parcelar em até 70 vezes o valor, que acabará revertido para um fundo de apoio a projetos de reforma agrária no Pontal.