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Não Temos Condições de Responder a Todos

O curador Alexandre Cruz
O curador Alexandre Cruz "Sesper" organizou pôsteres, fanzines, cartas e outros objetos

No dia 24 de janeiro, o Sesc Consolação inaugura a exposição Não Temos Condições de Responder a Todos. Com curadoria de Alexandre Cruz “Sesper”, artista plástico e vocalista da banda Garage Fuzz, a mostra reúne o valioso acervo, formado pela coleção do próprio Alexandre e as colaborações do fanzine "Crude Reality", Billy Argel (guitarrista da banda Lobotomia), Alexandre Bonfim (editor do fanzine "Verbal Threat”), Fabricio de Souza (Garage Fuzz), Giuliano Belloni, Antonio Almeida e Marcilio Lopes (ambos da banda Safari Hamburguers). Todo o material expositivo é original dos anos 80 e 90, período em que a comunicação entre bandas, gravadoras e fãs acontecia através de cartas e fanzines, o que era vital para a divulgação de muitos artistas.

Não temos condições de responder a todos é uma frase escrita por Marcilio Lopes, publicada no fanzine “Crude Reality”, que remete à realidade vivida no final dos anos 80 e início dos anos 90, quando o volume de cartas recebidas era absurdamente alto e impossível de ser respondido. Sem os canais e as tecnologias atuais, todo conteúdo produzido pelas bandas de quartos e garagens, como fitas, discos, adesivos, pôsteres, VHS, fotos, fanzines e camisetas, circulavam por meio de correspondência, o que oferecia um rico intercâmbio de conteúdo audiovisual.

“Na exposição, apresentamos todo o processo criativo que uma banda ou fanzine deveria passar para criar conteúdo audiovisual na época, como: desenhos para camisetas e cartazes de shows feitos manualmente com nanquim e papel vegetal, releases datilografados e ilustrados com colagens e letra set, diagramações executadas através de técnicas de ampliação ou redução em xerox, se tornando nosso primeiro curso de design e criação autodidata, aprendendo como fazer apenas pelo processo de observação do que um amigo estava produzindo. Afinal, repassar contatos ou ensinar como fazer as coisas não era uma prática comum na época, aliás, era uma moeda de troca” conta Alexandre, curador da exposição, que desde muito cedo acompanhou e fez parte do movimento punk no Brasil.

Neste contexto, durante as décadas de 80 e início de 90, as cartas (e todos os outros volumes enviados, que estarão expostos) desempenharam o papel do atual door to door (porta a porta): a transportadora retira o produto no fornecedor e entrega ao consumidor final. Dá até pra dizer que elas foram a versão física e original de plataformas como YouTube, Facebook e Spotify, responsáveis por reescreverem nossa história de como consumir música e informação.

Durante os anos 1980, grande parte do material divulgado chegava às mãos dos fãs em idiomas como o inglês, o espanhol, o alemão e até o finlandês, motivo pelo qual havia certa dificuldade em sua interpretação, gerando conflitos de ideias. Portanto, os fanzines e outras publicações, traziam longas entrevistas com músicos e compositores, que passaram a fazer essa ponte, fortalecendo o discurso das bandas, quase sempre com viés político.

Alexandre explica o papel do movimento frente às causas sociais: “As famosas listas com o endereço de organizações pelos direitos humanos e direitos dos animais também tiveram seu papel na divulgação massiva de conteúdos sobre a Anistia Internacional, o PETA e o Greenpeace, além da causa de presos políticos como Mumia Abu-Jamal, ex-membro do Partido dos Panteras Negras, jornalista e ativista estadunidense que foi condenado à pena de morte, sentença que mais tarde seria convertida em prisão perpétua”.

É nessa época também que surgem algumas mudanças ideológicas, que ecoaram nas décadas seguintes, como a prática do vegetarianismo e a luta pelos direitos dos animais; ao mesmo tempo em que os direitos das mulheres e da comunidade LGBT+ começam a ganhar espaço, motivados pelos movimentos Riot Grrrl em Olympia, Queer Punk em São Francisco e todo o movimento Vegan Straight Edge da costa leste dos Estados Unidos.


PROGRAMAÇÃO INTEGRADA

Além do conteúdo expositivo, Não Temos Condições de Responder a Todos conta ainda com uma programação integrada diversificada, com oficinas criativas – para a confecção de material que remete à época no estilo Faça Você Mesmo (do inglês Do It Yourself) - palestras e shows de bandas reconhecidas no cenário punk nacional e internacional.

O QUE VER?

Em entrevista para a Eonline, Alexandre Cruz Sesper conta sobre o acervo que guardou desde sua adolescência e que compõe a exposição. Nessa "visita guiada", o curador deixa um gostinho para conhecer o material pessoalmente no Sesc Consolação.


PAULERA!

E para embalar sua visita, que tal uma playlist montada pelo próprio Sésper? Paulera! reúne as principais referências que estão na exposição e no trabalho do artista. Na lista, Alexandre compilou o que basicamente era procurado por vinil e tape traders no final dos anos 1980. As bandas inglesas, como Ripcord, Heresy ou Stupids, assumiam a influência do Hardcore positivo americano em Boston, Washington e outras cidades. Bandas americanas, que ficavam realmente conhecidas devido a bandas de metal começarem a usar suas camisetas em shows, como Cryptic Slaughter, The Accused e Excel também estão na curadoria. No Brasil, as bandas representantes criaram os discos clássicos do punk hardcore nacional: Cólera, Lobotomia e Ratos de Porão. 
 

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