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Deixa o menino tocar
O prodígio musical sempre nos fascinou. Seja na figura do jovem Mozart, do violonista Yõnlu, que teve sua carreira abreviada de forma trágica, ou nas crianças que surgem em programas de auditório, depois somem e ressurgem em reality shows diversos.
Nos anos 80 tivemos no Brasil uma série de grupos compostos por jovens talentos apresentando programas infantis. Desses grupos podemos contar nos dedos aqueles que conseguiram construir uma carreira. Nos anos 90 chegaram até a recriar um clássico programa da jovem guarda, apresentado pelos ídolos teens do momento. Mas o programa durou pouco e alguns desses apresentadores também abandonaram a carreira musical.
Lembra desses dois?
Podemos constatar que ser simplesmente um prodígio pode não levar a nada. Temos uma infinidade de casos de artistas que tiveram um futuro promissor, mas pelos mais variados motivos não tiveram uma atuação significativa.
Um bom exemplo disso foi um obscuro compositor inglês, Willian Crotch (1775-1847), já dava recitais de piano com menos de três anos de idade e aos seis compôs uma ópera em três atos. Além disso, aos nove anos de idade foi publicado um concerto para piano e orquestra de sua autoria. Aos sete anos fazia apresentações que enriqueceram seus pais
Aos onze anos compôs um oratório, “The Captivity of Judah” que foi apresentado em Cambridge com grande sucesso em 1788, e que está, nos dias de hoje, completamente esquecido.
Mozart, que teve o talento musical reconhecido desde muito cedo por seu pai e não num programa de auditório, fez inúmeras turnês pela europa, a primeira delas aos 7 e por três longos anos - pouco se fala sobre, mas Nannerl, sua irmã mais velha, era tão boa musicista quanto e foi junto, neste texto uma boa ideia do seu talento e do apagamento histórico a que foi submetida. O contato com a música que se fazia na Itália, na França, na Inglaterra, agregaria conhecimentos que o jovem prodígio já não obtinha no ensino propiciado pelo pai - neste vídeo, uma explicação mais detalhada sobre esta viagem.
Beethoven também desenvolveu cedo a sua musicalidade, porém sofreu com as tentativas do pai em lhe apresentar como o novo Mozart, mentindo sua idade e lhe colocando como a salvação da lavoura enquanto consumia sua vida no álcool, ao que o jovem Ludwig superou e se afirmou como uma lenda da música - uma história recorrente noutra música se forçarmos uma conversa entre Beethoven e Michael Jackson.
Rota da família de Mozart durate o perido de 1763 a 1766
Ainda nessa toada, é comum vermos artistas que despontam muito cedo, perdem o rumo da carreira e acabam se tornando "garotos-problema". Como um certo cantor canadense que ao invés de aparecer nos noticiários pelo seu trabalho, aparece pelas confusões em que se envolve. Caso você não tenha associado o nome a pessoa, segue uma dica: seu nome remete ao do compositor e violinista Heinrich Ignaz Franz von Biber - qualquer semelhança é mera coincidência, compare:
Trazendo as coisas aqui para o Brasil: um dos maiores nomes da música brasileira, Heitor Villa-Lobos também despontou como um prodígio aos 12 anos de idade, tocando violoncelo profissionalmente. Mas neste caso, o músico precoce evoluiu seu talento através dos estudos, tornou-se maestro e compôs grandes clássicos da música brasileira, como as Bachianas Brasileiras.
É curioso pensar que, não importa a época, essa cultura do prodígio sempre nos fascinou, como se fossem pessoas dotadas de um dom inato, e acabamos ignorando o fato de a maioria desses exemplos ter a música na família, crescendo assistindo aos pais interpretando e compondo, ainda que amadoristicamente, mas constituindo um exemplo a ser seguido, um estímulo fundamental.
Portanto, se você acha música importante, crie hábitos com os pequenos que envolvam desfrutar e executar a música. Você pode até não gestar o próximo Mozart, a próxima Nannerl, mas que vai criar crianças mais felizes e espertas, não tenha dúvidas! Aproveitando o gancho já deu uma olhada na programação para as crianças no Festival Sesc de Música de Câmara? Já teve Pera Ensemble e ainda haverá Imani Winds e a sua viagem musical pelo mundo, 4/12 no Museu Afro Brasil. E se a inspiração é o jovem Mozart, o repertório do Quarteto Giocoso é uma aula sobre quartetos, começando com o próprio Wolfgang: é um bom lugar pra começar!
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A segunda edição do Festival Sesc de Música de Câmara acontece entre 22 de novembro e 4 de dezembro de 2016, em 11 Unidades do Sesc na capital, interior e litoral, além de espaços como a Igreja Nossa Senhora da Boa Morte, no centro de São Paulo e o Museu Afro Brasil, no Parque do Ibirapuera. São 12 conjuntos convidados, 47 concertos e uma intervenção, mais de 120 intérpretes, em repertórios que vão do antigo ao contemporâneo, em abordagens inovadoras. Para conferir a programação completa, clique aqui.