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As agruras de um pobre país rico

 

ABRAM SZAJMAN

Esta edição de Problemas Brasileiros traz para os leitores o relato de uma fantástica descoberta do Brasil, realizada 300 anos depois de Cabral, por um grupo de cientistas e artistas europeus. Com espírito aventureiro e objetivos científicos, embrenharam-se pela selva desconhecida, coletando preciosidades registradas em pinturas, desenhos e manuscritos ainda hoje inéditos.

As riquezas encontradas em nosso solo certamente impressionaram profundamente esses especialistas, financiados por potências políticas e econômicas da época. Como impressionam até hoje quaisquer pesquisadores que se ocupem em estudar nossas potencialidades. O que nos faz pensar como um país tão rico, com um clima favorável na maior parte do território, pode continuar subdesenvolvido e abrigando uma grande parcela da população em estado de pobreza. Como explicar que num país onde a água é abundante, não há terremotos, o clima é favorável e a terra fértil ainda haja pessoas passando fome?

Analisando friamente a questão, chegamos a várias hipóteses. Em primeiro lugar, é forçoso aceitar a premissa de que não são os recursos naturais que fazem a pujança de um país. Nem seu clima propício. Basta verificar o sucesso de nações como o Japão, que praticamente importa tudo o que consome, sem contar a matéria-prima que utiliza para produzir bens. Ou países situados em regiões geladas do planeta, que além de ficar impedidos de produzir alimentos no inverno, ainda são obrigados a consumir grande quantidade de energia em aquecimento.

O sistema político também não pode ser responsabilizado pela situação da população ou pelo crescimento econômico. Bem ou mal, estamos vivendo uma democracia, como outros países mais desenvolvidos. Será então que faltam leis que possam assegurar nosso sucesso? Ora, todos sabemos da prodigalidade de nossa legislação, tão rica que a Carta Magna inclui até dispositivos que não deveria conter, tal o nível de detalhe com que foi costurada.

Há leis para todos os gostos. Sem falar nas normas, decretos, portarias, regulamentos e uma infinidade de regras presentes em todas as áreas da vida nacional. Existe até uma estranha dicotomia, uma misteriosa divisão entre leis que "pegam" e leis que "não pegam", como se a legislação, entre nós, fosse simplesmente uma vacina. O organismo reage – ou deixa de reagir – de acordo com sua predisposição a aceitar ou não os efeitos do "medicamento" legal.

Onde estará o problema, então? Na verdade, temos uma nação emperrada. Parece brincadeira, mas jornais noticiam diariamente um estranho placar, que registra os altos e baixos do andamento das reformas. A previdenciária, a tributária, a do Judiciário, a administrativa, todas elas lá estão no Congresso, à espera não se sabe exatamente do quê. Um dia uma delas avança, mas logo reflui, enquanto as outras, quem é que sabe delas?

Na verdade, se nossos parlamentares não conseguem agir de acordo com as necessidades do país, o que precisamos, realmente, é de uma profunda reforma política, esta, sim, a mãe de todas as reformas. Um conjunto de alterações que permita ao cidadão exigir de seu representante que simplesmente cumpra seu dever. Que faça com que o deputado ou senador sinta a preocupação com o futuro do país e aja de acordo. Que desate o nó que amarra o Brasil a seu passado e o condena ao atraso, apesar das imensas riquezas naturais e de um território privilegiado sob todos os aspectos.

Somente a partir dessa reforma o caminho ficará livre para todas as outras mudanças e para que nossa sofrida população tenha um futuro mais digno. Com leis mais justas e coerentes, que sejam obedecidas, em vez de desrespeitadas porque simplesmente "não pegaram".

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