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As tensões do campo encenadas pelo(s) Invasor(es)

A partir de um cenário simples e tenso, Roberto Alvim dirige Paula Cohen e Joca Andreazza no espetáculo Invasor(es), com texto de Beatriz Carolina Gonçalves. A peça pode ser conferida até 7 de julho no Sesc Pompeia

Uma cidade alagada, a ameaça de um acampamento que cresce a cada dia e o embate iminente de nativos e capangas a mando de patrões. Nessa topografia, um homem e uma mulher vivem uma história de afeto dissimulado e de dependência mútua. A peça fica em cartaz no Sesc Pompeia até dia sete de julho.

Os diálogos são ágeis, permeados por vazios, que deixam ao espectador a tarefa de preencher as lacunas, ao mesmo tempo em que relaciona as informações e desvenda as relações subterrâneas ao discurso. A ação se passa no campo, onde vive o casal. Durante a época das chuvas, o volume das águas de uma represa local ameaça inundar as plantações. Um grupo de fazendeiros da região decide então abrir as comportas da represa, inundando a cidade, que fica rio abaixo. Além das consequências do ato irreversível, um acampamento amedronta os donos da terra. É nesse contexto violento e perigoso, acuados pela presença inesperada de um intruso, que os personagens revelam sua história.

A autora incorpora as rubricas ao texto dramático e estabelece uma base lógica entre um dilema moral, ou a ausência dele, diante da cumplicidade com a violência e o torpor que acomete os personagens. “Em 2010, devido às chuvas, as represas em várias partes do Estado estavam em seu nível máximo. Li num blog que, numa cidade do Interior, a população se organizou e abriu as comportas do reservatório local. O ato ficou na minha cabeça e deu origem ao argumento da peça”, explica a autora. Para o diretor Roberto Alvim, a trama flutua entre aspectos políticos e psicanalíticos. ”Um casal, proprietário de um latifúndio se defende da ameaça de invasão por locais, ao mesmo tempo em que, fechados em uma casa de fazenda claustrofóbica, vivem imersos em uma relação doentia, carregada de tensão sexual. A relação de posse termina mergulhando ambos em uma vertigem de memórias e emoções contraditórias”, conta ainda, Beatriz.

A peça está focada na relação que mantém unidos os personagens, mas a violência do entorno não deixa de dar cor à ação. “Acho extremamente oportuno discutir a violência no campo e a degradação do meio-ambiente, pois são questões urgentes e pouco discutidas em nossa literatura dramática. Mas que ninguém espere um texto político. A história gira em outra chave: a do afeto, rejeição e dependência entre os personagens”, afirma a autora.

Video: diretor fala sobre a temática da peça

A encenação de Alvim procura desvelar essas possibilidades e confrontar o espectador com o fato de que a esfera política e o campo do inconsciente se misturam de modo inseparável. “Trata-se de questões eminentemente atuais, ligadas à luta travada diariamente em nosso país, já há muito tempo. Embora trafegue por um caráter social urgente, também alcança temas ligados à posse e à proteção daquilo ou daqueles que supostamente nos pertencem. Aliás, quem é o invasor nesta obra?”, questiona o diretor.

A montagem segue a linha minimalista com a qual o diretor vem trabalhando. O cenário, assinado a quatro mãos por Simone Mina e Roberto Alvim, traz poucos elementos cênicos que remetem a uma casa de fazenda: uma cabeça de boi, troncos de madeira pelo chão, uma cadeira, um back light ao fundo. Alvim foca o trabalho dos atores na palavra e na força do texto, na imobilidade corporal e na penumbra que filtra o olhar da plateia, ora permitindo e ora impedindo o público de ver as expressões faciais dos atores. “Ali está projetada uma estrutura do inconsciente. Procuramos nos colocar no lugar existencial em que a autora estava no momento da escritura”, conclui.

o que: Invasor(es)
quando:

de 17/maio a 7/julho

onde:

Sesc Pompeia | Rua Clélia, 93 - 11 3871-7700

ingressos:

consulte a programação

Sobre o diretor Roberto Alvim
Diretor e professor de Artes Cênicas, Roberto é coordenador do Núcleo de Dramaturgia do SESI de Curitiba. Atualmente reside em São Paulo, onde dirige, desde 2006, a companhia Club Noir, dedicada a encenar obras de dramaturgos contemporâneos. Foi vencedor do Prêmio BRAVO! Prime de Melhor Espetáculo do ano, em 2009, com a peça O Quarto, de Harold Pinter e Prêmio Especial da APCA 2012 (Associação Paulista dos Críticos de Arte) pelo projeto Peep Classic Ésquilo. (voltar)

Sobre a autora Beatriz Carolina Gonçalves
É jornalista e dramaturga. Nos anos 90, fez parte do Núcleo dos 10, grupo de estudos em dramaturgia coordenado por Luis Alberto de Abreu. Em 2002 integrou o Programa de Residência Internacional do Royal Court Theatre, um dos mais importantes centros voltados à dramaturgia contemporânea, sediado em Londres. Entre os textos que escreveu para o teatro estão Esvaziamento (direção de Luiz Valcazaras, 2007), Umzé, escrita com subvenção do Royal Court Theatre e apresentada em Londres (2004) e A Fedra (direção de Suzana Aragão, 2006). (voltar)

Sobre Paula Cohen
Atriz formada pela Escola de Arte Dramática (EAD/USP). Entre os inúmeros espetáculos em que atuou, destacam-se Arena Conta Danton (direção Cibele Forjaz) e A Noite Mais Fria do Ano (Rubens Paiva). Na TV, participou dos humorísticos Sob Nova Direção (2004), Retrato Falado (2004) e Dias de Glória (2002), pela Rede Globo, e também da novela Canavial das Paixões, exibida pelo SBT, em 2002. No cinema, atuou nos curtas Parabéns (2005), Ímpares (2003) e Let's Try to Forget (2000), e nos longas Avassaladoras (2002) e Por Trás do Pano (1999). (voltar)

Sobre Joca Andreazza
Ator, pesquisador, educador, diretor e tradutor. Em sua carreira como ator destacam-se os espetáculos: Aqui Não, Pantaleão (1989), A Bilha Quebrada (1993), Os Lusíadas (2002), como narrador do espetáculo, e Agreste (2004) que recebeu os prêmios Shell e APCA de melhor texto, além de sua indicação de melhor ator para o Prêmio Shell e Prêmio Qualidade Brasil de 2004 (categoria drama). Participou de todos os festivais internacionais no Brasil com a peça Agreste e esteve representando o país como convidado do Festival de Teatro a Mil (no Chile, 2005) e em Berlim na Copa Cultural (2006). (voltar)