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Carta ao leitor
Este número de Problemas Brasileiros foi preparado para marcar, na revista, a passagem dos 500 anos de descobrimento do Brasil. Uma data propícia para comemorações e festejos. Para lembrá-la, optamos por escolher um tema que nos pareceu natural. E não poderia ter sido mais feliz. Afinal de contas, os índios já estavam aqui há cinco séculos e são os únicos habitantes deste país que podem se considerar genuinamente brasileiros. Ou pelo menos muito mais brasileiros que todos nós.
Enquanto a redação avançava nas pesquisas sobre o assunto, ficou cada vez mais claro que não há espaço para comemoração. Ao contrário, a reportagem chegou a uma constatação amarga: para nossos índios, o descobrimento foi um péssimo negócio. Em 500 anos foram literalmente perseguidos, dizimados, escravizados, convertidos à força. E resistiram. Sua população, antes de 4 milhões, não passa hoje de 350 mil, espalhados por áreas ameaçadas constantemente por invasores, sejam eles garimpeiros, madeireiros ou religiosos. "Não temos o que comemorar", diz um líder indígena, responsável por uma organização criada pelos próprios índios, que aos poucos estão encontrando formas "civilizadas" de reivindicar seus direitos. Direitos, aliás, instituídos na Constituição de 1988, que reconhece a existência de sociedades indígenas. Falta, entretanto, regulamentar essas conquistas, garantir o direito à própria identidade e sobretudo demarcar áreas para eles, protegendo as já demarcadas contra a ganância dos exploradores.
Esta edição traz também uma reportagem sobre um produto natural, abundante e barato, mas seriamente ameaçado pela poluição e pelo desperdício: a água nossa de cada dia. Uma nova legislação vai instituir a cobrança pelo líquido, até hoje gratuito, enquanto se decide se os serviços de distribuição e esgoto devem ou não passar à iniciativa privada.