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Encontros de Letras

 

A curiosidade move o diálogo entre autor e leitor desde o surgimento do livro, criando espaços de convivência hoje marcados pela interatividade de blogs e redes sociais virtuais





“A invenção da imprensa é o maior acontecimento da história. É a revolução-mãe... É o pensamento que larga uma forma e veste outra.” Atribuída ao escritor francês Victor Hugo (1802-1885), a frase revela o poder da invenção de Johann Gutenberg (1398-1468), o alemão que, em 1451, criou a prensa de tipos móveis. O primeiro livro a ser reproduzido na nova máquina foi a Bíblia – até então redigida apenas pelas mãos dos monges. Em poucos anos a “novidade” se alastrou, permitindo que os títulos fossem reproduzidos milhões de vezes. As ideias, as histórias, agora, se espalhavam. Chegavam a muitas pessoas numa velocidade jamais vista. E, assim, os escritores, foram conquistando um público cada vez mais fiel e consistente.

No início, porém – e durante um bom tempo –, a relação entre quem escrevia e quem lia era distante. O autor em seu “casulo”, e o leitor... Bem, só Deus sabe onde – em que país, imaginando que cenas para as palavras de seu escritor preferido. Mas, com o tempo, essa lacuna foi sendo preenchida até a chegada da vida moderna e das facilidades da tecnologia, que uniu de vez os dois pontos.

Se um dia o escritor foi apenas um nome gravado na capa do livro, hoje ele mostra cada vez mais a cara para seu público. Seja porque a internet, com as chamadas redes sociais – Twitter, Facebook, Orkut –, facilita muito esse contato, seja porque o interesse crescente do público em conhecer os bastidores do trabalho literário leva autores a eventos como o Trovas e Canções, realizado no Sesc Pompeia, e o Tertúlia, organizado em várias unidades do Sesc (veja boxe Endereço certo).

Hit da internet

Quase seis séculos depois da invenção de Gutenberg, publicar uma boa história ainda não saiu de moda. Não importa se num livro de capa dura com o título gravado em ouro (como se fazia na época do inventor alemão), se no Kindle, o aparelho eletrônico onde é possível ler livros em formato digital, os e-books, ou se num blog, onde os leitores deixam seus comentários e interagem a todo momento com o escritor. Na esfera digital, o gaúcho Fabrício Carpinejar, 38 anos, é, sem dúvida, um dos mais atuantes de sua geração.

Autor de 14 livros, entre eles o recém-lançado Mulher Perdigueiro (Bertrand Brasil, 2010), o vencedor do Prêmio Jabuti 2009 vem se firmando como um exímio cronista da vida amorosa. Para alimentar seus leitores, Carpinejar mantém site, blogs, twitter e um canal no YouTube. Com tantas vias de acesso, os textos do autor sobre o amor e seus desastres ultrapassaram, inclusive, a literatura e fizeram dele uma espécie de conselheiro. Em um de seus blogs, Consultório Poético, o assunto não é o seu trabalho, e sim as desventuras amorosas de quem lhe escreve. Com a internet, a relação entre autor e público tornou-se de fato uma via de mão dupla. “Enquanto continuar tentando responder a todos, estou feliz.

O problema é desistir e criar uma ouvidoria, e ouvidoria nunca tem ouvidos”, contou o escritor. “Gosto de exercer inteiramente minha vida digital – não repasso essa responsabilidade. É pela vírgula que demonstro minha respiração.” Para Carpinejar, a internet é “um livro em que o autor e o leitor se leem ao mesmo tempo.” “Hoje a pressão do público já existe antes mesmo de publicar em livro, pela interatividade na internet. O público é real, exigente, disposto a abrir suas memórias. Não há como enganá-lo.”

Romper o casulo

Veterano, o escritor Ignácio de Loyola Brandão ainda lembra a primeira vez que enfrentou o público cara a cara: “Foi em 1975, no Teatro Casa Grande, Rio de Janeiro, numa grande discussão sobre a censura. Eu, tímido, introvertido, fui muito questionado quanto ao meu livro Zero”.  Logo depois, com Antonio Torres e João Antonio, Loyola foi a uma faculdade da cidade de Campos.

E ali se iniciou um circuito que se prolonga até hoje. O trio inaugurou, de alguma maneira, o rompimento com o casulo. “Descobrimos que [assim] aumentamos nosso público leitor, a curiosidade em torno de nossa obra e a de nossos companheiros. Mas fomos muito criticados no começo. Muitos diziam que era vaidade, que éramos estrelas, que isso não era digno para a literatura, éramos palhaços de circo, devíamos pertencer ao show business. Hoje, quase todos os escritores estão na rua.”

Naquela época e nos anos de 1980, lembra Loyola, as perguntas eram, em sua maioria, sobre política. “Como jornalista eu costumava levar tudo o que havia sido censurado [pela ditadura militar] e lia para as plateias. Sempre havia policiais disfarçados no público.”

Hoje, a curiosidade dos leitores privilegia a literatura. “[Os leitores] Querem saber como se escreve um conto, um romance, como se publica, se fazemos oficinas, como se dá nome aos personagens, como se dá o título do livro, de onde vem uma ideia, como desenvolver uma história, se ganhamos muito”, diz. O escritor lembra de leitores que conheceu há muitos anos, desde seu primeiro romance, Bebel.

Dos amigos feitos, de muitas cartas trocadas, daqueles que se tornaram autores. E da surpresa que sempre se revela com seu público. “O leitor é um personagem oculto, desconhecido. Quando penso que sou lido apenas por jovens, encontro gente da terceira idade, da quarta. Impossível saber a cara desse personagem que nos lê. Também é perigoso achar que sabemos quem são os leitores e que devemos escrever para eles. Escrevemos para nós. José Mauro de Vasconcelos foi perdendo seu talento à medida que tentou prender e agradar aquele seu público que tinha sido cativado com Meu Pé de Laranja Lima”, declara.

Descobertas

Outro grande nome da literatura nacional, o poeta e cronista Ferreira Gullar, também costuma estar próximo de seu público. “Sempre me mantenho tranquilo nessas horas, disposto a dialogar. Às vezes me perguntam como faço os poemas e a resposta é que não há um método a ser seguido”, diz ele. “O poema é cheio de surpresas até para o próprio autor.” Assim como Loyola, Gullar ainda se surpreende com a identidade de quem o lê. “Percebo que é gente de todas as idades que se interessa por minha poesia e, com muita frequência, o pessoal jovem.” Essa relação já trouxe ao poeta uma boa-nova, que chegou por escrito.

Era uma mensagem de um jovem que dizia estar ficando paralítico e perdendo a fala. Comprou um livro de poemas de Gullar e encontrou nele ânimo para não desistir, continuar lutando contra a doença. Depois de uma longa batalha, escreveu para agradecer. “Disse que minha poesia tinha salvo a sua vida. Fiquei muito feliz ao saber disso.”



Endereço certo

Com projetos nas unidades e participação na Bienal do Livro, o Sesc São Paulo promove
encontros entre escritores e público e fomenta a discussão sobre literatura


Pela terceira vez consecutiva, o Sesc São Paulo participa da Bienal Internacional do Livro de São Paulo – que, de 12 a 22 de agosto, realiza sua 21ª edição, novamente no Pavilhão de Exposições do Anhembi –, como parceiro cultural e com uma vasta programação em seu estande. “A Bienal do Livro dialoga diretamente com os propósitos do Sesc em busca da formação de um público plural, possibilitando o acesso ao conhecimento”, pondera o gerente das Edições Sesc, Marcos Lepiscopo.

Com uma área de 300 metros quadrados, incluindo um espaço para eventos, o estande promoverá lançamentos e levará títulos do catálogo da editora da instituição, além de recriar “toda a atmosfera cultural das unidades do Sesc”, conforme adianta Lepiscopo. “Por meio de debates, shows, palestras, encontros com os autores e uma variada programação cultural.”

Entre os destaques para o evento, estão a leitura dramática Clarice Lispector por Beth Goulart e o bate-papo Primeiras Editoras Brasileiras, com participação da professora e pesquisadora Marisa Lajolo, ambas no dia 12. Já no dia 13, haverá a mesa de debates Tipografia: Ciência e Arte, seguida da edição especial do projeto Tertúlia – Tradutores, com Mamede Mustafá Jarouche, responsável pela tradução em português do clássico Livro das Mil e Uma Noites (em três volumes, de 2005 a 2007, pela Editora Globo), e a conversa entre a personagem Zé do Caixão e a escritora Heloísa Heloísa Prieto, autora de Cidade dos Deitados, parte da coleção infantojuvenil Ópera Urbana, das Edições Sesc.

No sábado, dia 14,  Fernando Bonassi fala de seu Montanha Russa, e o projeto Vocabulário, no qual os escritores Paulo Scott, Marcelino Freire, Chacal e Marcelo Montenegro selecionarão verbetes do Dicionário Sesc – A Linguagem da Cultura (Perspectiva, 2003) para “desafiarem” uns aos outros na criação de poemas a partir de temas escolhidos. Já no domingo, dia 15, a escritora Ana Maria Machado conversa com o diretor teatral Márcio Pontes na mesa De Quem é Essa História?. Enquanto a cantora Virginia Rosa apresenta músicas do seu CD Baita Negão, uma homenagem ao compositor carioca Monsueto (1924-1973).

Semana especial

A semana seguinte prossegue com outra edição de De Quem é Essa História?, no dia 16, quando também acontecem a palestra Livro Digital, e a vivência de poesia Literatura Plural: Poesia, com Antonio Cicero. No dia 18, uma oficina de impressão tipográfica coloca em prática a teoria da mesa Tipografia: Ciência e Arte, além do Encontro sobre Ilustração. No dia 19, há nova versão da coleção Ópera Urbana. E no último final de semana da Bienal, tem uma edição especial do projeto Cartografia Literária com a pesquisadora e especialista em literatura e internet Heloísa Buarque de Hollanda.

“O objetivo central da participação do Sesc [na Bienal] é possibilitar a geração e difusão do conhecimento”, ressalta Lepiscopo. “A expectativa é despertar o interesse do público e, ao mesmo tempo, apresentar o Sesc como editor de suas principais ações em uma iniciativa de educação permanente, gerando visibilidade e acessibilidade de sua produção cultural ao maior público possível”, conclui o gerente.

Cotidiano literário

Diversas atividades ligadas à literatura, destacam-se as já realizadas pelo Sesc como o projeto Tertúlia, e Trovas e Canções - ambos realizados em 2009. Durante o período em que participa da Bienal do Livro, a instituição mantém a série de atividades como ocorre no dia 21 com o projeto Admirável Parque Industrial, no Sesc Santos. O Sesc Consolação, por sua vez, com o Poeta Boa Prosa, promove no dia 23 um encontro com o poeta Sérgio Vaz. 

Já no dia 29, o autor do segmento infanto-juvenil Ricardo Azevedo fala ao publico sobre seu trabalho e paixão pela cultura popular brasileira. Mais de sete unidades do Sesc irão disponibilizar eventos entre público e escritores. ::