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Entrevista com Billy Saga

 

Billy Saga - Foto: Atila Rodrigues


O rapper e ativista Billy Saga, idealizador da ONG pelos direitos das pessoas com deficiência Movimento Superação, tem uma deficiência adquirida. Há 23 anos, de moto, a caminho de um curso de computação, Billy foi atropelado por uma viatura da Polícia Militar que havia ultrapassado o semáforo vermelho. Ele passou três meses no hospital e ficou paraplégico. Da cadeira de rodas, o músico persegue seu objetivo de tornar o mundo mais justo para as pessoas com deficiência, o que considera sua missão.

Desde o primeiro dia que voltou do hospital, Billy conta que nunca parou suas atividades.

Seguindo na nova condição de cadeirante, ele percebeu o quanto as pessoas com deficiência são negligenciadas e iniciou sua vida na militância.

“Eu saí do hospital numa quarta-feira e na sexta eu já estava na balada, na segunda eu já estava na facul e um mês depois eu estava trabalhando e dirigindo”.

Em 2003, com a ideia de chamar formadores de opinião, mídia e primeiro, segundo e terceiro setores para colocar em pauta a inclusão das pessoas com deficiência, Billy uniu jovens com e sem deficiência para a criação do Movimento Superação, que depois se tornou uma ONG. Todos os anos, próximo ao dia 3 de dezembro, que é o Dia Mundial da Luta da Pessoa com Deficiência, o movimento fazia passeatas na avenida Paulista com a participação de músicos de destaque, com o objetivo de conscientizar as pessoas. O Movimento Superação cresceu e realizou mais de 30 passeatas pela América Latina, impactando mais de 100 mil pessoas.

Na primeira passeata que o movimento realizou na Argentina, Saga conversou com o prefeito da cidade onde o movimento estava. O assunto era a possibilidade de implementar um novo projeto arquitetônico de acessibilidade no local.

“E aí na hora que eu virei as costas, quando eu acabei de falar com ele, não querendo reconhecer e imaginar que talvez ele não ia fazer nada do que ele tinha falado - e ele realmente não fez -, vieram duas senhoras conversar comigo, uma mais velha, sem deficiência, e uma um pouco mais nova, só que com [síndrome de] down, as duas de mãos dadas. A mais velha estava chorando e falou para mim, obrigada por trazer essa forma tão alegre de lutar pelos direitos das pessoas com deficiência”.

Foi aí que Billy percebeu o que era realmente importante.

“Naquela hora caiu uma ficha gigante: a missão não está no cara que você falou ali atrás, não é ele que importa para você. Para a sua missão, é essa mulher que importa, é para isso que você está aqui. Então eu acho que o grande legado do Superação foi realmente levar essa forma diferenciada de se olhar e fomentar o orgulho de ser quem é”.

Com isso em mente, Billy passou a focar em eventos menores e em sua música como meio de transformação.

“Eu comecei a entender que, tanto quanto um evento para 40 mil pessoas, um bate papo com 10, 20 pessoas vale a pena, porque se num bate papo desses você se sensibilizasse com o meu discurso e mudasse seu mindset, já teria valido a pena, talvez mais do que uma passeata com 40 mil pessoas que vão lá só pela atração, captam superficialmente a mensagem, mas no dia seguinte estão fazendo tudo errado da mesma forma: parando na vaga, desrespeitando o direito das pessoas com deficiência. Então eu comecei a entender que era melhor eu focar no micro e toda a oportunidade que eu tenho de falar eu aproveito para tentar sensibilizar a sociedade, aí com isso eu comecei a focar mais na minha arte para esse processo de inclusão”.

Recentemente, o artista lançou o clipe, Corpo Intruso, que trata dessa temática.

Billy também comentou sobre a mentalidade do, “apesar da deficiência”.

“O fardo é colocado na deficiência e a palavra, apesar, tem um peso muito grande: ‘apesar da deficiência eu sobrevivi’, ‘apesar da deficiência ele canta’, ‘apesar da deficiência ele é pai, ele é marido, ele é amigo’, então eu acho que esse ‘apesar’ tem um fardo muito grande, e a gente tem que desconstruir, porque ele é construído em cima de um viés cognitivo de que a deficiência é algo que torna inviável ter uma vida produtiva, uma vida feliz, uma vida comum, uma vida como todo mundo tem. E a própria pessoa com deficiência tem que desconstruir esse ‘apesar’.”