
Marco
da diversidade e palco de revelação de nomes inovadores
da cultura, o Sesc Pompéia chega aos 25 anos
Década de
80. O Brasil, e em especial São Paulo, vivia a agitação
do movimento Diretas-Já, que levou mais de 1 milhão de
pessoas ao Vale do Anhangabaú, em 16 de abril de 1984, para pedir
o fim da ditadura. No ano seguinte, a eleição de Tancredo
Neves marcava o fim do regime. Na cena musical, o rock e a noite celebravam
matrimônio, e a festa era em São Paulo. Seguindo os passos
de outras metrópoles, como Nova York e Londres, a cidade passou
a ver as pessoas se agruparem no que se convencionou chamar de tribos
urbanas. Góticos, punks, darks e afins saíam depois da
meia-noite e ocupavam casas como Madame Satã, Dama-Xoc, Aeroanta,
Radar Tantã e Rose Bom Bom. Embora chamada por muitos como "a
década perdida" no campo político-econômico,
foi, por exemplo, nesse período que nasceram várias bandas
hoje celebradas como parte da história da música brasileira,
como Joelho de Porco, Titãs, Capital Inicial, Barão Vermelho
e Paralamas do Sucesso.
Em meio a essas transformações, um novo endereço
voltado para a cultura e o lazer passava por suas primeiras experiências.
Em 1982, o Sesc São Paulo abria ao público sua unidade
no bairro da Pompéia, Zona Oeste de São Paulo. "A
inauguração do Sesc Pompéia teve, de fato, impacto
positivo", comenta o diretor regional do Sesc São Paulo,
Danilo Santos de Miranda. "Os desdobramentos disso podem ser verificados
desde a difusão de muitos outros centros culturais até
o desenvolvimento sociocultural de milhares de pessoas."
O diretor lembra que já naquela ocasião o Sesc contava
com outras unidades - entre elas, Consolação, Interlagos,
Bertioga e Ribeirão Preto - e que por conta dos bons resultados
alcançados foi possível a expansão. "Investindo
nos programas de ação sociocultural que têm marcado
a instituição no âmbito estadual e nacional",
informa.
A cidade dos
tijolos aparentes
A região que iria receber a nova unidade do Sesc se caracterizava
por uma tradição fortemente industrial até o final
dos anos 70, o que ajuda a explicar o fato de o local encontrado ser
uma fábrica - que produzia tambores e geladeiras nos anos 50
e 60. Entre outros projetos, após a aquisição do
prédio, em 1973, estava o da arquiteta Lina Bo Bardi, que previa
a incorporação do conceito de fábrica. Uma vez
batido o martelo, a estrutura da antiga construção foi
reaproveitada e buscou-se manter suas características - como
os tijolos aparentes e os galpões abertos. Em 20 de janeiro de
1982, era inaugurado o Sesc Pompéia - ou Sesc Fábrica
da Pompéia, como foi inicialmente chamado. O local passou, então,
a produzir lazer e cultura. "Dos galpões, aquele onde está
o teatro foi o que sofreu maior intervenção estrutural
e arquitetônica", relembra o arquiteto André Vainer,
um dos assistentes de Lina no projeto.
São muitas as "marcas registradas" do local. Além
dos inconfundíveis tijolinhos, o grande prédio que se
destaca na paisagem - também de Lina e inaugurado em 1986 para
abrigar a parte esportiva -, a choperia, que serve de palco para shows
de música, e o grande caminho de paralelepípedos que se
estende depois de um portão permanentemente aberto (claro, durante
o horário de funcionamento da unidade), transformando a entrada
do Sesc Pompéia em uma espécie de travessa da Rua Clélia.
"O fato de o cidadão adentrar [a unidade], na qual ele é
ampla e civilizadamente recebido, permite que haja o sentimento de querer
e gostar de aqui estar", avalia o técnico da unidade José
Henrique Coelho.
Todos os sons
E, por falar em marca registrada, aqui vai mais uma para a lista: a
música. Os shows, que acontecem tanto na choperia quanto no teatro
- que também se abre para uma intensa programação
das artes cênicas - fizeram da unidade uma opção
certeira para curtir sons da melhor qualidade nos últimos 25
anos. Um dos projetos musicais realizados na choperia é o Prata
da Casa, responsável por apresentar, semanalmente, novos talentos
da música brasileira. O evento, criado em 1999, revelou artistas
hoje conhecidos do grande público, entre eles as cantoras Céu
e Vanessa da Mata. "O Prata da Casa tem sido para mim uma grata
surpresa, pelo grau de liberdade e diversidade que o projeto permite
experimentar", diz o atual curador, o jornalista e crítico
de música Pedro Alexandre Sanches. "Isso me faz renovar
a convicção sobre a enorme riqueza musical que nunca abandona
o Brasil." Segundo o técnico José Henrique, o número
de shows passa dos 70 por mês, reunindo um público de cerca
de 25 mil pessoas.
Do
punk ao pop e à televisão
Desde a inauguração, o local mostrou-se um "radar"
para os movimentos da música brasileira - dos novos talentos
aos grandes nomes. Entre os marcos dessa trajetória incluem-se
o festival O Começo do Fim do Mundo, realizado em 1982. Considerado
o pontapé inicial do movimento punk, o projeto revelou bandas
importantes da cena, como os Ratos de Porão e Inocentes. "A
festa foi histórica", diz o organizador do evento, Antônio
Bivar, que lançou o livro O Que É Punk? (Brasiliense,
1982) durante o festival. "Tinha cerca de 4 mil punks, exposição
de fotos e a cobertura internacional do [jornal norte-americano] Washington
Post." O pop e o rock também ganharam atenção
especial na unidade, com o programa Fábrica do Som, apresentado
por Tadeu Jungle e exibido pela TV Cultura, nos anos de 1983 e 1984.
Por lá passaram os então iniciantes Titãs e Ultraje
a Rigor. "A primeira vez que os Titãs se apresentaram na
TV foi no Fábrica", afirma Jungle. A parceria entre o Pompéia
e a TV Cultura ainda rendeu os programas Musikaos - que foi ao ar em
2000 e 2001 -, e o Bem Brasil, que "se mudou" do Sesc Interlagos
para o Pompéia em 2005 e segue firme até hoje. Músicos
como Arrigo Barnabé e Itamar Assumpção, da Vanguarda
Paulistana, também começaram nos palcos da unidade da
Rua Clélia nos idos dos 80.
Criação
no ateliê
Iniciadas em 1982, e muitas vezes destaques da programação,
as oficinas de criatividade do Sesc Pompéia são um bom
exemplo do trabalho de educação informal a que o Sesc
Pompéia se propõe. Os cursos livres ministrados nos ateliês
abrem espaço para o fazer e a reflexão em diversas áreas
da expressão artística - como desenho, gravura, fotografia,
tecelagem, marcenaria e cerâmica. O artista plástico Evandro
Carlos Jardim conta que a idéia das oficinas partiu da própria
arquiteta responsável pelo projeto da unidade. "Eu participei
da idéia inicial, ainda no tempo de Lina Bo Bardi, quando ela
organizou todos os ateliês", afirma Jardim. Na época,
o artista montou uma oficina de gravura em metal, litografia, xilogravura
e serigrafia.
Outra testemunha do início dos cursos do Sesc Pompéia
é o fotógrafo Antonio Saggese, responsável pelas
primeiras versões das oficinas de fotografia. Para ele, atividades
que visam a "transmitir conhecimento em caráter informal"
podem vir a contribuir para o crescimento pessoal. "O que vai ser
feito com isso depois pode ser muita coisa", diz o fotógrafo.
"A pessoa pode até se dedicar integralmente a isso, mas
a questão é o despertar."
Cronologia
20/1/1982
- Inauguração da unidade, na época chamada
de Sesc Fábrica da Pompéia.
12/3/1982
- Entra no ar o programa musical Fábrica do Som - parceria
entre o Sesc São Paulo e a TV Cultura.
27/11/1982
- Primeiro dia do festival O Começo do Fim do Mundo,
considerado o início da cena punk no Brasil.
29/6/1984
- É inaugurada a primeira grande exposição
temática da unidade, o projeto Caipiras, Capiaus: Pau-a-Pique.
out/1986
- Inauguração do complexo esportivo da unidade.
21/9/1992
- O Sesc São Paulo inicia parceria com o Festival Internacional
de Arte Eletrônica Videobrasil - hoje Festival Internacional
Sesc Videobrasil.
27/5/1997
- Início da temporada do grupo performático catalão
La Fura Dels Baus, parte da Temporada Sesc Outono
.
15/9/1997
- É inaugurada a exposição Flávio
Império em Cena, uma retrospectiva dos trabalhos do arquiteto,
artista plástico, cenógrafo e figurinista paulistano.
13/4/1999
- A banda paulistana Ira! abre o projeto Prata da Casa, um dos
mais importantes espaços reservados às novas gerações
da música brasileira.
16/7/2002
- Em parceria com a ONG Saúde e Alegria, o Sesc São
Paulo realiza o evento Amazônia br, composto por exposição,
workshops e palestras.
14/12/2005
- O Sesc Pompéia realiza o 1º Encontro Internacional
de Antropofagia.
De
17 a 26 de agosto de 2007 - O Sesc Pompéia completa 25
anos com espetáculos que reuniram diversas linguagens
artísticas.
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Ver boxes:
Presente
para o público
A arte da apropriação
Presente
para o público
Aniversário
do Sesc Pompéia foi comemorado com programação
especial
Uma
programação para lá de especial agitou
a unidade na segunda quinzena de agosto. De 17 a 25, a Festa
da Fábrica reuniu músicos e DJs para shows que
homenagearam o "aniversariante" na choperia da unidade
- local, diga-se de passagem, perfeito para uma boa festa. Entre
os destaques, a banda Karnak, de André Abujamra, o cantor
Leo Maia - que herdou todo o suingue do pai, Tim Maia - e o
som "não dá para não dançar"
do Funk Como Le Gusta, velho conhecido da choperia. De 24 a
26, o Som da Fábrica reuniu músicos, artistas
plásticos, poetas, escritores e bailarinos em apresentações
que, pela diversidade de linguagens, refletiram o caráter
da unidade. Entre os exemplos mais "radicais", é
possível citar João Gordo dividindo a noite com
Wander Wildner; Dona Ivone Lara com Cordel do Fogo Encantado
(foto); e a cantora Paula Lima - ex-Funk Como Le Gusta - com
o grupo A Barca.
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A arte
da apropriação
Exposição
prolonga a festa de 25 anos do Sesc Pompéia
A
festa de aniversário do Sesc Pompéia vai esticar
até o final do ano. Faz parte das comemorações
a mostra Recortar e Colar, a ser realizada de outubro a dezembro
de 2007. A exposição, ainda, é chamada
de Ctrl_C + Ctrl_V, aquele recurso do computador por meio do
qual é possível, justamente, recortar e colar
textos e imagens. Organizado pela equipe técnica da unidade
com consultoria da jornalista e crítica de arte Juliana
Monachesi, o evento contempla a diversidade no que diz respeito
ao estilo dos artistas reunidos. São 70 nomes que trabalham
com diferentes suportes - do papel à tela, passando pelo
vídeo e pela escultura. Dois conceitos básicos
norteiam a concepção e organização
do evento: a colagem e a apropriação. Uma prática
que conta, no Brasil, com a contribuição de grandes
nomes das artes plásticas - alguns deles pré-computador
e internet -, como Nelson Leirner, no campo da apropriação,
e Camille Kachani e Daniel Senise na área da colagem.
A diferença é que agora a tecnologia entra em
cena para aumentar as possibilidades. O resultado poderá
ser conferido na mostra.
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