Sesc SP

Matérias da edição

Postado em

Artes Visuais

REVISTA E Novembro - 2006

 

 

 

 

A FORÇA DO TRAÇO

 


O pintor cearense Aldemir Martins encontrou nas formas e cores nacionais a fonte de inspiração para mostrar o Brasil ao mundo

 

 


"Aldemir Martins é um homem cultíssimo. Como dizem em certas regiões do interior do Brasil: é um poço de sabedoria." Essas são as primeiras palavras da obra Aldemir Martins - No Lápis da Vida Não Tem Borracha (Editora Callis), dos escritores Nilson Moulin e Rubens Matuck, publicada em 1999 - sete anos antes da morte do pintor, nascido no Ceará em 1922, e que morava em São Paulo desde 1946. Como resultado de mais de meio século de contribuição às artes plásticas, o pintor, conhecido pela constante experimentação - há trabalhos seus tanto em telas de linho quanto em papéis de carta, cartões e até fôrmas de pizza -, deixa para a posteridade uma obra bem acolhida pelo público e reconhecida pela crítica. Entre os prêmios que recebeu, destacam-se o de Melhor Desenhista, na Bienal de São Paulo de 1955, e o de Melhor Desenho, na Bienal de Veneza em 1956. "Aldemir Martins tinha uma visão única do país", afirma Jacob Klintowitz, curador da exposição O Viajante Amigo, que ocupa o térreo do Sesc Vila Mariana até 3 de dezembro (veja boxe As Viagens do Pintor). "Ele tinha sobre o Brasil um olhar amoroso, pois observava o território nacional e o que nele existe como uma fonte de vida, uma fonte de beleza em abundância. O artista criava a sua versão da identidade nacional." Klintowitz afirma ainda que o pintor, e também desenhista, gravurista, ilustrador, ceramista e escultor, garantiu seu lugar entre os grandes nomes das artes plásticas brasileiras por apresentar um universo original, tratado com "extrema sabedoria artística". Para ele, ao tomar contato com o trabalho do artista, o espectador é "agraciado com um mundo novo".

 

 



O cabo-pintor
A intimidade de Aldemir Martins com as artes manifestou-se cedo. Aos 8 anos já fazia seus desenhos com pedaços de tijolo e carvão. No Colégio Militar de Fortaleza, onde iniciou sua formação, é escolhido como orientador artístico de classe, devido à habilidade no desenho. No Exército, desenhou um mapa aerofotogramétrico de Fortaleza - grosso modo, um mapa da cidade vista de cima - e conquistou seu primeiro prêmio ao vencer o concurso promovido pela Oficina de Material Bélico da 10ª Região Militar pelas pinturas feitas nas viaturas do Exército. Desde então, passou a ser conhecido como o cabo-pintor. Entre 1942 e 1943, funda o Grupo Artys da Sociedade Cearense de Artistas Plásticos (Scap), com outros pintores, poetas e escritores, além de, paralelamente, desenvolver trabalhos como ilustrador para jornais, revistas e livros - incluindo uma das edições de Vidas Secas, de Graciliano Ramos, originalmente publicado em 1938.

 

 



Em 1946 transfere-se para São Paulo, onde retoma a atividade de ilustrador nas redações de jornais, na coluna Bairros na Berlinda, publicada no Correio Paulistano. Assina também, com o jornalista Daniel Linguanotto, a coluna Daniel Comenta e Aldemir Ilustra, parte integrante do jornal A Noite. Ainda nessa área, realiza trabalhos para o Jornal de São Paulo, para O Diário e para a revista Elite. O pintor chegou a desenhar algumas sessões da Assembléia Legislativa de São Paulo, época em que conheceu políticos que se tornariam expoentes do cenário nacional, como Ulisses Guimarães. Foi em São Paulo que Aldemir Martins fez sua primeira exposição individual, no Instituto de Arquitetos do Brasil, ocasião que marcou sua carreira e consolidou uma trajetória que ecoaria não somente no país, mas em diversos eventos de arte mundo afora.

 

 

 

 

 



Hoje é considerado um dos porta-vozes das cores e formas do Brasil. "O mestre Aldemir abriu caminhos", afirma o escritor Nilson Moulin. "Ampliou o diálogo de artistas brasileiros com o mundo, contribuiu para uma etapa importante de reposicionamento de artistas nacionais em relação aos de outros países." Para o autor, é a linguagem "forte", com "qualidade tanto local quanto internacional", o grande legado de Aldemir. Segundo Moulin, houve também a satisfação de conviver com o pintor. "Ele desenhava, pintava, contava caso, trabalhava e, desculpe-me o lugar-comum, esbanjava alegria de viver. Escrever um livro sobre ele foi uma delícia. Uma aprendizagem prazerosa..."

 

 


 

 

 

 

 

 


 

Universo de formas
Entre os temas recorrentes na obra de Aldemir Martins, o Nordeste brasileiro aparece como grande foco de interesse. As pessoas, as paisagens e os animais da região onde nasceu marcaram seu trabalho desde os primeiros esboços. No entanto, o futebol e, mais recentemente, uma infinidade de gatos - que ele dizia serem "superiormente senhoris, matreiros e, ao mesmo tempo, concretos e abstratos", segundo descrição do livro de Moulin e Matuck - também fizeram parte de seu amplo universo. O mundo apaixonado da bola aparece, entre outros momentos, nas ilustrações que fez para um texto do escritor baiano Jorge Amado (1912-2001), A Bola e o Goleiro. Já os felinos - que apareciam coloridos em telas de grandes formatos - permearam sua produção nos últimos anos e tiveram êxito comercial. Em artigo publicado no site do instituto Itaú Cultural, o jornalista Edwaldo Pacote, comenta a diversidade temática do artista: "Todos os temas de Aldemir só poderiam ser interpretados adequadamente por meio de traços severos, embora ágeis e livres, sem o sombreado bonito e maneiroso dos que aprenderam a desenhar na escola. E o seu desenho era duro, desmentindo a aparente fragilidade da linha". Em outro texto publicado no mesmo site, o escritor Jorge Amado define a obra do artista: "Lá [em suas obras] se viam os cangaceiros, as flores, os frutos e os gatos - e um gato azul de alucinação, tão belo não era possível, ah! aquele gato, como esquecê-lo?"

 

(veja boxe Os desenhos de Brasília)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Os desenhos de Brasília



Mostra apresenta trabalhos do artista Athos Bulcão


Estará em cartaz no Sesc São Caetano, de oito de novembro a 30 de dezembro, uma exposição com dez serigrafias (fotos) do artista carioca Athos Bulcão, reconhecido por suas obras instaladas em cerca de 100 monumentos públicos em Brasília. A técnica de serigrafia é um processo pelo qual um desenho é impresso quando a tinta é colocada sobre uma tela com regiões permeáveis e outras não, e as partes do desenho que passam através da tela formam o resultado final - sobre o papel, metal, tecido ou outra superfície. Os trabalhos apresentados no Sesc, originalmente criados para azulejaria em edifícios da capital federal, são as mais novas aquisições do Acervo Sesc de Arte Brasileira e representam um significativo período da história das artes plásticas do país. Athos Bulcão nasceu no Rio de Janeiro, em 1918, e decidiu se dedicar às artes plásticas em 1939, quando optou por abandonar a medicina.

 

 

 

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As viagens do pintor

 


Exposição no Sesc Vila Mariana traz 50 anos de produção de Aldemir Martins

 

 

Como parte da programação da Temporada Sesc de Artes, a unidade Vila Mariana apresenta, até 3 de dezembro, a exposição O Viajante Amigo, com 56 obras do pintor, desenhista, gravurista, ilustrador, ceramista e escultor Aldemir Martins, morto em fevereiro deste ano. Representada por obras de todas as áreas em que Aldemir atuava, a mostra tem curadoria do crítico de arte Jacob Klintowitz e apresenta um panorama do talento e da diversidade desse que é considerado um dos mais significativos artistas brasileiros do século 20. "Foi privilegiada a vida artística do Aldemir", explica Klintowitz. "Não escolhemos uma fase, algum momento em especial, pois consideramos que a sua produção tem uma grande continuidade, é feita de momentos excepcionais." Dessa forma, O Viajante Amigo traz 50 anos de produção do artista e, segundo afirma o curador, apresenta uma linguagem expositiva mais direta, adequada ao espaço que ocupa na unidade, o térreo do prédio, num ambiente que antecede a área de convivência da unidade. "A exposição é mais emocionante, devido à recente morte do artista", afirma Klintowitz. "O público tem à disposição cerâmicas, gravuras em várias técnicas, pinturas, desenhos, e criações ligadas ao comércio e à indústria, tais como rótulos, caixas, latas, embalagens, brinquedos, caixas de fósforos, copos, jogo de mesa, toalhas etc." Há ainda um núcleo biográfico com fotos do autor e dos parentes e amigos que conviveram com ele, retratos da mulher, dos filhos, do crítico Sérgio Milliet e do artista plástico Antônio Bandeira.




 


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