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NEGRURA: afirmação, autodefinição e identidade

Arte Colagem: Thaís da Silva Pereira
Arte Colagem: Thaís da Silva Pereira

Por Raquel Barreto*

Say it loud! I'm Black and I'm proud  (Diga em voz alta! Eu sou negro e tenho orgulho!). Os versos dessa canção, que foi gravada originalmente por James Brown em 1968, continuam bastante relevantes. Afinal, ainda é necessário que homens e mulheres negras enunciem em voz alta sua identidade e ancestralidade africana com orgulho.

A identidade é parte do que nos constituí como pessoas, ela é moldada tanto individualmente, em experiências e vivências próprias, como coletivamente, em contextos sociais, históricos, culturais, políticos e territoriais. Além disso, ela também é construída na diferenciação que fazemos entre eu/nós vs você/outros.

No Brasil, por causa da escravidão e do racismo, o “lugar natural do negro” - como afirmou a teórica Lélia A. Gonzalez - tem sido o da subordinação e da inferioridade, um lugar onde não queremos estar. Por conseguinte, observa-se que uma parte da população ainda rejeita sua negrura, a despeito de todos os avanços políticos e sociais ocorridos nos últimos anos.

Tendo em vista esse contexto, é imprescindível ressignificar a negritude, desenredando-a de valores e sentidos criados pelo outro - o opressor - em seus discursos de legitimação da ordem estrutural racista. Devemos nos desvencilhar de sua leitura de mundo na qual homens e mulheres negras tiveram um papel complementar e secundário, afinal de contas, temos um papel central na fundação deste país.

Pela mesma razão, é imprescindível elaborar e consolidar a autoria e as linguagens próprias de autonomeação, a representação, os lugares de pertencimento e a visibilidade. Não é por acaso que esses temas ocupam um lugar de destaque nas demandas contemporâneas expressas na esfera política negra.

Em vista disso, compreende-se a importância e o significado político de afirmar uma identidade. Conferindo outros sentidos a negrura, que transcendem a cor e a dor, baseando-se na ancestralidade africana,  disputando o lugar de sujeito e não mais o de objeto.

Dialogando com essas questões o projeto Negrura apresenta, em mais uma edição, um panorama diversificado a presença negra em diversas linguagens artísticas, contemplando debates, shows, vivências, oficinas e intervenções.

 

Raquel Barreto é historiadora, especialista nas autoras Angela Y. Davis e Lélia Gonzalez. Atualmente, cursa Doutorado em História Social pela Universidade Federal Fluminense, desenvolvendo uma pesquisa a respeito do Partido dos Panteras Negras e das relações entre visualidade, política e poder.