Sesc SP

Matérias da edição

Postado em

Pequenos poemas de Amor Efêmero (piegas e sem compromisso)

entre nós

tudo acabado entre nós
(não foi possível
provocar a tempestade
em copo d’água)

o q

o que será
de mim
o que será
de ti
depois
da chuva
de canivetes?


Madrid 01

esta muchacha portenha
rosada e gordinha
assada
deve ser uma delícia

 

Paris 03

aqui neste bistrô
você é, eu sou
você vem, eu vou
você tá, eu tô
já era

era tudo mentira
o que lhe disse
mas acreditei
para não jogar fora
aquela noite
descabelada

 

Assunción 04

hay entre nosotros
un rio
unas piedras
una estación de tren
un ombrero blanco
un beso rojo
ningún futuro

 

táxi

miriam doidivana
com asas de borboleta
flor de plástico
numa jaula de papel
livre como um táxi

 

arvorar

vou cantar umas canções banais
para você, para você e os animais
meu amor,
meu arvoredo cheio de pardais
inverso

enfia o bico do seu peito
no furo do meu umbigo


engano

quero
morrer
no corte
do
seu amor
mas
sem
dor

(do contrário
estou enganado)


dia

noite linda
noite
com a meia-lua nascendo
noite colorida
estou de partida
para nunca mais

dia
lindo dia
o mar
batendo no cais


arraial

sua sombra unia
areia branca e mar verde
só sua sombra existia
na areia branca e mar verde
e nem queria seu corpo
que o sol iluminava tanto
queria só ficar olhando
sua sombra que unia
areia branca e mar verde

 

hipnoses

notívagas gulosas aventuras
brilham nos talheres que tilintam
nos pratos brancos coloridos de verduras
moinhos de palavras que se cruzam
nos itálicos cenários do Bixiga
macarrões nos cabelos das medusas


madrid 05

viveré
unas mil noches
com a negra de São Lourenço
San Lorenzo de Madrid
já molhei todo meu lenço
de tanto llorar por ti


paulinha meu amor

butique exibe umas calcinhas
alfaces rendadas suaves bundinhas
róseos seios frementes roçam suéter
Marylin Monroe no pôster boca entreaberta
uma aura sensual beija estas vitrines
embaçadas no frio da garoa
e o sopro de corpo quente
por detrás dos vidros

iceberg de hélice

entrou com seus sapatos de gelo
     pelo aeroporto de Guarulhos
com um ventilador amarelo
                    num carrinho de bb
ia voltar para Paris


loba no cio

o telefone ocupado
a tarde caindo
copacabana babilônia

suas deliciosas pernas arrepiadas
sua língua de onça pintada
seu corpo avermelhado
azulado
avermelhado
azulado
avermelhado
azulado
sob o anúncio luminoso


hibernação da fera

Adna nua nas pedras
e a ciclope etíope distante
e
Diógenes falando com o mar:
amar só com quem te espera,
nunca uma fera confusa
(quase medusa),
amar só com quem dorme
sobre seu próprio pelo


embalagem

esses amores descartáveis
não deixam nem equívocos


Xico Chaves é poeta e artista plástico, participou da chamada Geração Mimeógrafo,
no Rio de Janeiro, escreveu os livros poETa clandestino (1986), Trincheira de Espelhos (1982), entre outros.

 

@revistae | @instagram