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Com o cinema, aprendi...

Muito além do lazer, a sétima arte auxilia espectadores a reconhecer temas universais e a pensar sobre as relações na sociedade


Desde que os irmãos Auguste e Louis Lumière realizaram a primeira exibição de um filme, em 1895 – La Sortie de L’Usine Lumière à Lyon (A saída da fábrica Lumière em Lyon, em tradução livre) –, em que registraram a saída de funcionários de uma fábrica, os espectadores passaram a refletir sobre questões sociais, políticas e culturais pelas lentes de uma câmera. Isso só foi possível porque o cinema também se propôs a projetar grandes temas do mundo na telona. Sentados e concentrados, assistimos a muitos filmes como se deles pudéssemos tirar uma lição, seja ela de história ou de vida.

Ao retratar a capital da Itália sendo ocupada pelos nazistas, bem como a resistência do povo em Roma, Cidade Aberta (1945), o diretor italiano Roberto Rossellini mostrou que o cinema, para além do entretenimento, falaria a respeito do momento presente e instigaria reflexões políticas. “De fato Rossellini almejou um didatismo cinematográfico absoluto ao longo de sua filmografia”, afirma o crítico de cinema Rafael Parrode, um dos curadores da Mostra Roberto Rossellini, realizada no Cinesesc, entre os meses de maio e junho. “Seu desejo era o de representar, com a máxima veracidade possível, momentos históricos decisivos para o desenvolvimento humano, e por isso essa ideia da ‘enciclopédia histórica’, de um material audiovisual que desse conta de questões históricas centrais para a compreensão do mundo ocidental contemporâneo.”

Seguida por Paisà (1946) e Alemanha, Ano Zero (1948), que se aprofundaram nas consequências da Segunda Guerra Mundial e se tornaram clássicos do movimento intitulado neorrealismo, a filmografia de Rossellini é um dos exemplos de que a sétima arte é uma plataforma para o entendimento da sociedade. “Rossellini
acreditava totalmente no poder da imagem. Não da imagem dissimulada, mas da imagem mais justa possível diante de um mundo em ruínas”, complementa Parrode.

 


Imagem: Divulgação.

O lugar do ser humano

Além de criar alegorias que representam episódios históricos, o cinema lança-se como uma bússola para a compreensão da atuação do homem no mundo. Nos filmes de Ingmar Bergman, diretor sueco que completaria 100 anos neste mês, temas como a desesperança, a incomunicabilidade e a iminência da morte “convidam” o espectador a uma busca interna ou a um reconhecimento de tais sentimentos, como em O Sétimo Selo (1957), em que um cavaleiro, ao retornar das Cruzadas, depara-se com a Morte e com ela tenta ganhar tempo de vida ao jogar uma partida de xadrez.

“Fica muito evidente nos filmes de Bergman certas reflexões para a vida. Ele não traz respostas, inclusive ele se aprofunda nas perguntas e deixa as questões ainda mais complexas”, destaca Giscard Luccas, o curador da mostra O Lobo à Espreita (veja boxe Sociedade na tela), que esteve em cartaz no Sesc Santana, em junho. “Mesmo nos filmes menos angustiantes dele, que trazem a felicidade e a alegria, há uma análise profunda.”

Professor na Academia Internacional de Cinema e autor do livro Cinema e Escola – 200 Filmes sobre Escola e Vida (Segmento), o jornalista e pesquisador Sérgio Rizzo acredita que o cinema também seja um tipo de “escola”. E que, por isso mesmo, poderia ser utilizado como ferramenta nas salas de aula.

“Para que o cinema possa exercer papel importante em uma escola, a cultura cinematográfica precisa se inserir em seu cotidiano, por meio da exibição regular de filmes para toda a comunidade (e, de preferência, com a realização de debates depois das sessões), por meio de estratégias bem planejadas por professores para uso do audiovisual em suas disciplinas, por meio de projetos que envolvam diversas disciplinas e por meio de oficinas de realização audiovisual, entre outras possibilidades”, explica Rizzo. “Só assim, presente na vida da escola como expressão cultural, o cinema poderá oferecer janelas para a compreensão da sociedade em que vivemos, das outras sociedades, de nós mesmos e dos outros.”

 


Imagem: Divulgação.

 

Cineastas para admirar


Confira algumas das películas de Ingmar Bergman e Roberto Rossellini que se tornaram clássicas na história do cinema


INGMAR BERGMAN

O Sétimo Selo (1957)
No século 14, após uma década de lutas nas Cruzadas, o cavaleiro sueco Antonius Block volta a seu lar, assolado pela peste negra. A Morte surge diante do cavaleiro para levá-lo consigo. Só que o combatente pede um adiamento da pena. Durante esse período, ele e a Morte jogarão uma partida de xadrez.

Morangos Silvestres (1957)
O experiente e sábio professor de medicina Isak Borg reavalia a vida enquanto viaja para a universidade em que se formou para receber um título de Doutor Honoris Causa. Borg viaja com sua estranha nora, Marianne, e revisita muitos marcos de seu passado, em especial as memórias de sua família e de Sara, uma paixão de juventude. 


Cena de Morangos Silvestres. Imagem: Divulgação.

 

ROBERTO ROSSELLINI

Roma, Cidade Aberta (1945)
O filme se passa na capital italiana ocupada por tropas da Alemanha nazista em 1944 e foca sua história em Giorgio Manfredi, líder da resistência antifascista na cidade, perseguido pela Gestapo (polícia secreta alemã). Seu amigo Francesco, que vai se casar com a viúva Pina, e o padre Don Pietro Pellegrini ajudam-no a deixar Roma.

Alemanha, Ano Zero (1948)
Em Berlim, após o final da Segunda Guerra Mundial, um garoto de uma família muito pobre trabalha para sustentar o pai doente, sua pequena irmã e o irmão. Um dia, ao conversar com um antigo mestre, o menino entende ter recebido um conselho para matar o próprio pai.

 

Sociedade na tela

Mostra festeja centenário de Ingmar Bergman e leva ao público principais temas abordados na obra do cineasta sueco

Celebrados em julho, os 100 anos de um dos mais importantes nomes da história do cinema ganham destaque no Sesc. Uma mostra no Cinesesc em parceria com a embaixada da Suécia, que começou em 28 de junho e segue até o dia 3 deste mês, revisita alguns de seus filmes, entre eles a Trilogia do Silêncio.

Além disso, o curso O Cinema de Ingmar Bergman integra a programação do Cinesesc, de 3 a 6 de julho.
O Sesc Santana também presta homenagem a Bergman com a mostra O Lobo à Espreita, que segue com programação até agosto, exibindo importantes obras do diretor, como O Sétimo Selo e Morangos Silvestres. Já no Sesc Belenzinho, até dia 11/07, o curso 100 Anos de Bergman propõe um debate acerca dos principais temas abordados nas películas do diretor. A atividade será ministrada pelo jornalista, pesquisador e professor Sérgio Rizzo.

 

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