Postado em 29/06/2018
tudo acabado entre nós
(não foi possível
provocar a tempestade
em copo d’água)
o que será
de mim
o que será
de ti
depois
da chuva
de canivetes?
esta muchacha portenha
rosada e gordinha
assada
deve ser uma delícia
aqui neste bistrô
você é, eu sou
você vem, eu vou
você tá, eu tô
já era
era tudo mentira
o que lhe disse
mas acreditei
para não jogar fora
aquela noite
descabelada
hay entre nosotros
un rio
unas piedras
una estación de tren
un ombrero blanco
un beso rojo
ningún futuro
miriam doidivana
com asas de borboleta
flor de plástico
numa jaula de papel
livre como um táxi
vou cantar umas canções banais
para você, para você e os animais
meu amor,
meu arvoredo cheio de pardais
inverso
enfia o bico do seu peito
no furo do meu umbigo
quero
morrer
no corte
do
seu amor
mas
sem
dor
(do contrário
estou enganado)
noite linda
noite
com a meia-lua nascendo
noite colorida
estou de partida
para nunca mais
dia
lindo dia
o mar
batendo no cais
sua sombra unia
areia branca e mar verde
só sua sombra existia
na areia branca e mar verde
e nem queria seu corpo
que o sol iluminava tanto
queria só ficar olhando
sua sombra que unia
areia branca e mar verde
notívagas gulosas aventuras
brilham nos talheres que tilintam
nos pratos brancos coloridos de verduras
moinhos de palavras que se cruzam
nos itálicos cenários do Bixiga
macarrões nos cabelos das medusas
viveré
unas mil noches
com a negra de São Lourenço
San Lorenzo de Madrid
já molhei todo meu lenço
de tanto llorar por ti
butique exibe umas calcinhas
alfaces rendadas suaves bundinhas
róseos seios frementes roçam suéter
Marylin Monroe no pôster boca entreaberta
uma aura sensual beija estas vitrines
embaçadas no frio da garoa
e o sopro de corpo quente
por detrás dos vidros
entrou com seus sapatos de gelo
pelo aeroporto de Guarulhos
com um ventilador amarelo
num carrinho de bb
ia voltar para Paris
o telefone ocupado
a tarde caindo
copacabana babilônia
suas deliciosas pernas arrepiadas
sua língua de onça pintada
seu corpo avermelhado
azulado
avermelhado
azulado
avermelhado
azulado
sob o anúncio luminoso
Adna nua nas pedras
e a ciclope etíope distante
e
Diógenes falando com o mar:
amar só com quem te espera,
nunca uma fera confusa
(quase medusa),
amar só com quem dorme
sobre seu próprio pelo
esses amores descartáveis
não deixam nem equívocos
Xico Chaves é poeta e artista plástico, participou da chamada Geração Mimeógrafo,
no Rio de Janeiro, escreveu os livros poETa clandestino (1986), Trincheira de Espelhos (1982), entre outros.