IDÉIAS
ILUMINADAS
Evento
no Sesc Pinheiros traz a luz e suas fontes geradoras como inspiração
e suporte para diversas manifestações artísticas
Ao
longo da história da arte, as relações possíveis
com a luz têm sido foco constante de estudo e pesquisa. Com o
advento da eletricidade e os avanços científicos na óptica
- parte da física que estuda as leis relativas às radiações
luminosas -, artistas como László Moholy-Nagy (1895-1946),
professor húngaro da Bauhaus, escola alemã de design,
artes plásticas e arquitetura, começaram a utilizar o
fenômeno como arte em si. O que apresentou uma forma diferenciada
de utilização da luz nos processos criativos, já
que até então a fotografia e a pintura, por exemplo, usavam-na,
respectivamente, apenas como registro ou objeto de representação.
Foi justamente com o intuito de trazer à tona novamente essa
íntima ligação entre luz e arte que o Sesc Pinheiros
apresenta, até 14 de janeiro, o evento Luz da Luz, composto por
seminários, oficinas, exposições e performances.
"A idéia era fazer algo que não fosse só uma
exposição, mas que tivesse seus tentáculos na ciência
também", explica a artista multimídia Anna Barros,
idealizadora e curadora do projeto iniciado em setembro. "Essa
interdisciplinaridade se dá porque hoje passamos por uma fase
em que enxergamos o mundo como um complexo, com tudo relacionado a tudo."
ESTÍMULOS
DIFERENCIADOS
A mostra conta com obras de 11 artistas, brasileiros e estrangeiros,
cujos trabalhos usam desde a luz solar até as novas tecnologias,
como a internet. Para a escolha dos artistas, o critério foi
ter a luz como "material" empregado em trabalhos anteriores.
É o caso de Lucas Bambozzi, realizador da videoinstalação
Multidão, localizada na área de convivência da unidade.
"O convite veio como uma possibilidade de dialogar com essas formas
indiretas de pensar a luz no campo da arte", conta Bambozzi. "O
vídeo, principal suporte de meus trabalhos, pode ser considerado
uma fonte de luz, artificial e codificada, mas ainda assim uma forma
de existência da luz e que tem poder de comunicação."
Os trabalhos, distribuídos pelo edifício, estão
divididos em módulos de acordo com os diferentes tipos de luz
utilizados e as reações que causam nos espectadores. No
grupo Luz Mista encontram-se trabalhos que têm como base a luz
solar e a artificial. As obras apresentadas no bloco Densidade Luminosa
instigam os sentidos, criando ambientes e fornecendo estímulos
diferenciados. Já em Projeções Luminosas estão
reunidas produções em que a emissão de luz é
feita por meio de equipamentos eletrônicos e digitais, como vídeos,
projetores e computadores. E os trabalhos pertencentes ao módulo
Luz Objeto estão relacionados à luminosidade na comunicação,
na internet e na arte digital.
"É uma exposição que tem de ser vista em dois
momentos: durante o dia e à noite", explica a curadora.
"Isso porque há trabalhos, como a projeção
de vídeo do Lucas Bambozzi, que só podem ser visualizados
à noite. Já outros, como o meu, só podem ser vistos
de dia", exemplifica Anna, referindo-se à obra OlhoEyeOjo,
projeção localizada na fachada da unidade.
DISCUSSÕES
AMPLAS
Para
o artista multimídia Alberto Blumenschein, integrante do grupo
SDVila e que também participa da mostra com a instalação
Viveiro Svetliná, o evento é um bom momento para pôr
em prática uso das novas tecnologias na arte - apesar das dificuldades
de acesso aos equipamentos por conta de seu alto custo. Com relação
a esse empecilho, argumenta que a melhor saída é a criatividade
dos artistas brasileiros. "Conseguimos ser criativos com poucos
recursos." Raquel Kogan, artista que expõe a instalação
Visão, concorda que o custo desse tipo de trabalho é alto,
mas é otimista com a mudança desse panorama. "Aos
poucos as coisas vão se modificando. Mas as obras, na grande
maioria, têm um custo de pesquisa, de execução e
de manutenção que dificulta o patrocínio ou a venda."
O evento Luz da Luz também transita por outros tipos de arte,
como o espetáculo de dança 2 em Super-8, apresentado em
dezembro pela Companhia Provisória. No trabalho, os dois bailarinos
da companhia dançam em um cenário branco e sobre seus
corpos são projetadas imagens de situações associadas
ao universo familiar, como festas de crianças e brincadeiras
no quintal. Marcelo Poletto, um dos diretores do trabalho, diz que a
projeção no formato super-8 tem como objetivo despertar
a memória do público. "A gente trabalha muito com
contrastes absolutos: a luz e a penumbra, o vazio e o cheio. Assim,
os espectadores podem imaginar mais e ver menos. O diálogo da
luz e da sombra mexe com a imaginação e com a memória
do público", explica.
Segundo a técnica do Sesc Pinheiros Nilva Luz, nesses três
meses em que o evento está em cartaz na unidade, cerca de 70
mil pessoas já conferiram a programação. "A
reação do público tem sido muito boa, o volume
de visitantes confirma o sucesso", afirma Nilva.
Ver boxe:
Inspirado
na solidão
Inspirado na solidão
Como parte da programação do Luz da Luz,
o espetáculo O Banho aborda a história de uma
mulher que passou mais de 40 anos isolada dentro da própria
casa
O fato é
digno de manchete. Sebastiana de Mello Freire, a Dona Yayá
- figura da elite paulistana -, ao ser diagnosticada como doente
mental em 1919, teve a sua casa no bairro da Bela Vista, região
central de São Paulo, parcialmente transformada em um
hospital psiquiátrico privado, onde permaneceu isolada
por ordens médicas até 1961. Além de ser
o típico "prato cheio" para a imprensa, a história
serviu de inspiração para a instalação
coreográfica - misto de dança, performance e vídeo
- O Banho (foto), dirigida e interpretada por Marta Soares e
que faz parte da programação do evento Luz da
Luz, realizado pelo Sesc Pinheiros.
O espetáculo, em cartaz nos dias 12 e 13 de janeiro,
mostra a performer com o corpo imerso em uma banheira enquanto
realiza uma seqüência de movimentos que se repetem
por uma hora. Imagens de vídeo são projetadas
em lugares distintos do espaço, e ao público é
permitido se aproximar da banheira e assistir à performance
de diversos ângulos. O Banho ganhou o prêmio da
Associação Paulista de Críticos de Arte
(APCA) em 2004.
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