Aventura
sem fim
Os jogos eletrônicos
são uma febre mundial, chegando a reunir milhares de competidores
on-line numa mesma partida
Hoje, Norson Schiniti
Saho é um homem de 27 anos patrocinado por uma grande empresa de
software. Sua rotina se divide em eventos promocionais, testes de produtos
e horas diárias à frente do computador, especializando-se
no assunto sobre o qual é pago para aprender: jogos eletrônicos,
mais precisamente o Age of Empires 3, um jogo de estratégia lançado
pela Microsoft, cuja história se passa em civilizações
antigas.
No Brasil, um jogador profissional como Saho pode ganhar de 10 mil a 20
mil dólares anuais, se realmente for bom no que faz. É pouco,
se comparado ao salário desse mesmo profissional em países
como Japão e Estados Unidos, o maior mercado de jogos eletrônicos
do planeta, onde o salário nessa área pode chegar a até
200 mil dólares por ano. E pensar que o que hoje é profissão
era anos atrás simples brincadeira de criança e adolescente,
muitas vezes refutada por pais e profissionais de educação.
À parte a discussão acerca de benefícios e malefícios
gerados pelos jogos eletrônicos, eles nunca mais saíram do
cotidiano de crianças, adolescentes e adultos desde o princípio
de sua popularização, na década de 80, e, no momento,
estão com força total.
Como todo garoto de sua geração, Saho começou jogando
videogame até chegar aos jogos de computador em rede. Antes da
popularização da internet, para conseguir jogar em rede,
ele montava uma verdadeira engenhoca, que começava dentro da casa
dele e terminava na do vizinho. O fio da rede passava pelos varais das
casas de ambos até ligar um computador ao outro. "Só
assim conseguíamos jogar um contra o outro e não somente
contra a máquina", lembra ele. Depois da internet, chegaram
os jogos em rede e, com eles, as tão disputadas, e polêmicas,
lan houses (local area network houses - algo como casas de rede local).
"O grande barato da lan é que ela pessoaliza o jogo",
diz Saho.
Foi quando passou a freqüentar as lan houses que Saho, sem saber,
deu início a sua carreira de jogador profissional. Com elas vieram
os campeonatos, a notoriedade e os convites de trabalho. Ele já
participou de campeonatos nos Estados Unidos e até no Cazaquistão,
e atualmente é também aluno do curso de design de games,
da Universidade Anhembi Morumbi, em São Paulo. A idéia é
tornar-se um produtor de jogos, mercado que, segundo Delmar Galisi, coordenador
do curso da Anhembi Morumbi, está em crescimento. "O mercado
mundial de games responde por um dos maiores faturamentos dentro da indústria
de entretenimento. No Brasil, a escala de produção está
aquém da americana ou japonesa, mas se trata de um mercado promissor",
afirma. Segundo ele, há boas alternativas de atuação
nas áreas de games para celular e internet, além de outras
opções como animação e multimídia.
Conselhos aos futuros produtores? "Em primeiro lugar, o futuro profissional
deve ter um bom repertório cultural: gostar de cinema, literatura,
quadrinhos, arte e jogos", ensina. Há, no entanto, um inegável
calcanhar-de-aquiles no mercado brasileiro de jogos. "A pirataria
é muito grande. Isso acontece em outros lugares também,
mas aqui é maior", afirma Alexandre Machado, dono da produtora
44 Bico Largo Multimídia, professor do curso da Anhembi Morumbi
e curador do Game Cultura, evento que acontece no Sesc Pompéia
de 29 de junho a 6 de agosto (veja boxe
Game é cultura).

Bem antes do mundo virtual
O primeiro jogo
de computador a utilizar a computação gráfica foi
o Spacewar. Criado no início da década de 60, no Massachusetts
Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos, ele simulava uma batalha
entre duas naves. Poucos anos mais tarde, veio o Odyssey, um dos primeiros
videogames para fins comerciais da história. Mas foi na década
de 80 que a invenção virou febre. Parte dos adultos que
têm entre 25 e 30 anos hoje passava algum tempo por dia durante
a infância dividindo-se entre brincadeiras de rua ou no playground
do prédio e certos jogos eletrônicos. Na frente de uma televisão,
no comando do videogame - os mais populares eram o Atari, Odyssey ou Nintendo
-, a diversão era garantida com títulos como Enduro, Pac
Man, ou Amazônia, produzido no Brasil e de grande destaque na época.
O que exatamente um jogo precisa ter para ser um sucesso? Segundo Odair
Braz Júnior, ex-editor do site Game World (www.gameworld.com.br),
atualmente editor do site Herói (www.heroi.com.br),
tal como em novelas, seriados e filmes, nada melhor do que um bom roteiro
para prender a atenção diante da tela. "A história
é responsável por envolver o jogador, é ela que faz
com que o jogo vá adiante e o fator de interação
é fundamental aqui. Reviravoltas no roteiro, novos fatos e surpresas
são elementos que sempre transformam o jogo numa grande diversão",
diz ele.
Febre
do momento
Segundo Lucia
Leão, artista multidisciplinar e pós-doutora em artes pela
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), ao flagrar a evolução
dos jogos eletrônicos, encontramos três fases. A primeira
tem início na década de 70 e corresponde aos jogos de computador
baseados em texto, tais como Adventure, Zork e Dungeons. "Os jogos
dessa época atraíam um público restrito, pois o acesso
a eles era bem caro", explica. A segunda fase tem início na
década de 90, quando os jogos se popularizam. Nessa época
a possibilidade de pagamento de taxas mensais fez cair o custo para os
jogos on-line. Os grandes representantes dessa época são
o Ultima Online (1997) e o Meridian 59 (1996). Na terceira fase, em que
desde 2003 a febre é o jogo on-line de múltiplos jogadores,
ou massive multiplayer on-line (mmo), o EverQuest é considerado
pioneiro, por ter sido inteiramente realizado em 3D. Os mmos são
jogos eletrônicos em rede, que podem reunir um número surpreendente
de jogadores on-line, chegando a 160 mil pessoas. Os desafios geralmente
se passam em ambientes fantásticos - ao estilo O Senhor dos Anéis
-, nos quais cada jogador cria e controla seu personagem, que vai evoluindo
à medida que o "dono" investe em suas habilidades (veja
boxe jogo a jogo). Esse personagem convive no
mesmo universo que o das outras pessoas que compartilham o servidor. Nesse
ambiente há diversos desafios que incentivam a formação
de times entre os participantes e a eleição de líderes.
Assim, por meio do mundo virtual vai se formando uma teia real que pode
gerar amizades. "Pelo jogo se percebe a personalidade de cada um",
afirma Rafael Padovani, 22 anos, exímio jogador de mmo, que começou
brincando com o Atari na infância e há um ano se dedica aos
desafios do World of Warcraft, um dos mmos mais jogados do mundo. Padovani
conta que passa cerca de quatro horas por dia jogando, mas gostaria é
de se dedicar mais. "É difícil ter tanto tempo. É
por isso que tem muito jogador desquitado", brinca ele. Para fazer
parte de um mmo, o jogador deve pagar uma taxa mensal ao servidor e adquirir
uma senha para entrar no jogo. São os primeiros passos de uma longa
jornada, já que a competição não tem fim,
pois, quando os jogadores parecem ter chegado à última etapa,
lá vem o produtor com uma fase a mais.
A realidade que cerca os mmos é composta de fatos pitorescos. Há
desde histórias de amizades que nascem a partir dessa brincadeira
até de ex-namorados que não se fizeram de rogados e, na
calada da noite, aproveitaram-se para entrar no jogo do ex e destruir
o personagem há tanto tempo cultivado pela pessoa. "Acontecem
muitos casos assim no mundo dos mmos", diz Padovani. Para Lucia Leão,
uma das chaves do sucesso dos mmos está em reunir características
de dois mundos. "De um lado, está o universo das fantasias
e das estratégias, típico dos games. Por outro, a possibilidade
de interagir com jogadores a distância, por meio da internet",
analisa a pesquisadora. "Os mmos fazem sucesso por vários
fatores, mas principalmente por mexer com conteúdos arquetípicos,
mitológicos. Pode-se dizer que esses jogos estimulam aspectos profundos
da consciência."
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veja
boxe Game é cultura
veja
boxe jogo a jogo
Game
é cultura
Evento no
Sesc Pompéia desvenda o mundo dos massive multiplayer on-line
(mmo), jogos que se passam em universos fantásticos e reúnem
milhares de jogadores
O Game Cultura,
um dos mais esperados eventos de games de São Paulo, terá
início dia 29 de junho, no Sesc Pompéia, onde segue
até 6 de agosto (veja Em Cartaz). Em sua segunda edição,
o Game Cultura terá exposição interativa e
temática de jogos massive multiplayer on-line (mmo), shows,
apresentações de VJs, oficinas, palestras e um festival
de jogos. Em 2005, o projeto tinha como proposta principal discutir
a produção brasileira de jogos eletrônicos.
Desta vez, o recorte tratará das relações pessoais
que surgem dos mmos. Está prevista até mesmo a construção
de um castelo inspirado nas paisagens geralmente encontradas nesses
jogos. Durante o evento, os participantes também poderão
sentir o gostinho de participar de um mmo. Haverá cinco jogos
disponíveis: Ragnarok, Taikodom, Regnun, Sphere e Erínia.
Para cada um dos jogos, serão cinco máquinas ligadas
diretamente a seus servidores. A programação traz
ainda a Mostra Brasil, um espaço para jogos independentes,
como forma de incentivo à produção para esse
mercado. As inscrições podem ser feitas pelo portal
do Sesc São Paulo (www.sescsp.org.br). Quem curte o universo
dos games não pode perder o começo disso tudo. Programada
para a noite de abertura, a Game Festa levará à unidade
músicos que utilizam os sons e efeitos dos game-boys (joguinhos
portáteis) para produzir música eletrônica,
bandas de rock que emprestam suas músicas para trilhas sonoras
dos jogos e artistas que recriam temas de games clássicos.
Festão na certa.
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Jogo a jogo
O
universo dos jogos eletrônicos é farto e diverso. Conheça
alguns tipos
Adventure
- Jogos desse gênero apresentam desafios que o jogador deve
solucionar, e a cada problema resolvido a história vai se
desenrolando.
Ação - Exige basicamente habilidade em manejar os
controles, já que a idéia é derrubar alvos,
matar inimigos, desviar de obstáculos, entre outras situações
que exigem agilidade.
Shooter - Jogo de ação que acabou se destacando
e deu origem a um gênero. Nesse caso, em vez de uma visão
externa ao personagem, o ponto de vista do jogo acontece pela perspectiva
do personagem principal.
Simulação
- Os temas variam de jogo para jogo e vão desde a construção
de modelos de crescimento de uma cidade até a de um relacionamento.
Quiz - Jogo que testa o conhecimento do usuário em
determinados assuntos.
RPG - Esse tipo nasceu fora do ambiente virtual, como jogo
de interpretação, uma espécie de faz-de-conta.
No computador, o jogador transita por um mundo fictício e
pode controlar um ou vários personagens. Os mmos estão
nessa categoria.
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