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Uma ilusão bem concreta

 

Roberto Cenni

 

Ilustração: Marcos Garuti

 

Há mais de 20 anos, o Sesc Pompéia vem desenvolvendo uma programação na qual as grandes exposições estiveram sempre presentes. Entre elas destacam-se as cenográficas infanto-juvenis, que trazem pequenos mundos a ser explorados, como Alice no Brasil das Maravilhas e Por Quê, Pra Quê?. A próxima destas será Ilusão de Verdade.

A convivência com a ilusão é imemorial e os avanços da tecnologia no século passado aliaram-se à busca por espaços ilusórios, provavelmente tentando expandir as possibilidades de experimentação humana.

Em dezembro retrasado, conversávamos sobre uma mostra das máquinas que fazem a ilusão, proposta por alguém ligado a um colecionador do Rio de Janeiro. Depois de visitarmos museus e conversarmos com filósofos, físicos e poetas, fomos desenvolvendo nosso projeto com a certeza de que seria melhor entrar na ilusão do que mostrá-la assepticamente nos instrumentos que a propagam.

Após várias reuniões entre os técnicos, chegamos a instalações que apresentariam o tema em uma estrutura semelhante a mapas conceituais de conhecimento, havendo associações nas fronteiras dos diversos núcleos por meio de afinidades temáticas e espaciais.

Convidamos três cenógrafos para interpretar o que pensáramos e, por unanimidade, escolhemos Osvaldo Gabrieli, com sua experiência de 20 anos à frente do grupo XPTO, que chega a emocionar com soluções simples e eficazes.

Em consenso com Gabrieli, chegou-se ao projeto que consiste em um campo de experimentos sensoriais: distorções e rebatimentos nos espelhos, texturas que causam estranhamento, orelhões falantes, um corredor incendiado, o mar inflável com monstros espreitando e o mundo do avesso.

A travessia tem início na Caverna de Platão, alegoria clássica que, a partir de homens acorrentados que só enxergam sombras, sintetiza vivências ancestrais da humanidade. Há também iglus infláveis que levam as pessoas a uma imersão em determinada cor e ao sair do iglu, os olhos do visitante irão projetar no branco espaço circundante a cor complementar àquela que impregnou a sua retina.

As plotagens, espalhadas pela exposição, trazem padrões óptico-geométricos que provocam instabilidade visual e por vezes voragem, como se os visitantes pudessem ser tragados por elas. As anamorfoses disfarçadamente revelam-se em formas para os que as sabem observar e a sala de Escher apresenta algumas de suas imagens de fluxos sem fim, que iludem a perspectiva.

Há dois espaços que trabalham com técnicas de estereoscopia plana e neles é necessário o uso de óculos que abrem a profundidade, acentuando a sensualidade da experiência visual. O Laboratório de Sistemas Integrados da USP realizará um pequeno filme que vai preparar os visitantes para as sensações que os esperam na exposição; com os projetores operando em estereoscopia e os óculos polarizados (cujas lentes remetem informações levemente diferentes para cada olho) consegue-se a imersão tridimensional.

As instalações estereoscópicas apresentam um jogo de vertigem da passagem do plano para o tridimensional e o uso de óculos anaglíficos (com lentes vermelha e azul, que fazem a filtragem da cor de forma que cada olho veja apenas a cor complementar àquela da sua lente) levanta as imagens e aguça o tato do visitante, que vive o contra-senso do relevo dos objetos que vê e a impossibilidade de tocá-los.

Do cinema, conhecida fábrica de ilusão, serão mostradas velhas imagens futuristas. As atividades paralelas prevêem performances – apresentando uma Monga raivosa como nunca –, debates que consideram a ilusão na contemporaneidade e oficinas para confeccionar objetos de ilusão de óptica ou de movimento – caleidoscópios e zootrópios. Os conceitos do projeto serão apresentados no material pedagógico.

Tomara que consigamos realizar mais uma exposição cenográfica infanto-juvenil pulsante e poética, que fique para sempre na lembrança dos que a visitarem.

 

Roberto Cenni, engenheiro metalúrgico e mestre em arte, é assistente técnico do Sesc Pompéia