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50 Graus Abaixo de Zero

O velejador Julio Fiadi, o primeiro brasileiro a alcançar os dois Pólos, esteve presente ao evento Escolhas, no Sesc Santo André, e contou um pouco sobre seu trabalho, os desafios superados e as diversas culturas que conheceu

Eu comecei a me apaixonar pelas regiões polares lendo livros escritos por antigos exploradores dessas regiões. Livros da época que a gente chama de heróica, final do século 19, começo do século 20. Eu fiquei muito curioso de querer chegar nos pólos da mesma maneira que eles chegaram: caminhando pela calota polar, arrastando tudo o que era necessário para a sobrevivência sob temperaturas de até 50 graus abaixo de zero. A preparação para isso tudo também me apaixonou muito. Preparar uma expedição, às vezes, é tão legal quanto participar de uma. É um trabalho de logística bastante interessante.
Quando eu estava me preparando para fazer a viagem para o Pólo Norte eu estava relativamente bem preparado fisicamente. Não 100%, mas estava bem. Estava treinado para o frio. Eu já tinha ido cinco vezes para a Antártida, já tinha treinado para sair do gelo se eu caísse em águas geladas, estava bem aclimatado em situações de frio, mas o que eu tinha muito medo, e não conhecia uma forma precisa de me proteger, era do urso polar. O urso polar é o maior carnívoro terrestre. Não há leão ou tigre que se aproxime de sua capacidade. Um urso adulto pesa normalmente 700 quilos, mas um macho grande pode chegar a uma tonelada. Quando ele fica em pé para enxergar mais longe, apoiado em suas patas traseiras, ele chegar a ficar com quatro metros de altura. Às vezes, a gente vê imagens de ursos polares andando bem devagar e imagina que se trata de um animal lento. E, por razões óbvias, nunca há um homem por perto para que possamos ter uma referência do tamanho do bicho. Ocorre que o urso polar anda lentamente quando se desloca por distâncias muito grandes. É andando assim devagar que ele poupa a energia necessária para essas jornadas. Mas, em ataque, ele chega a correr a 90 km por hora - o que o torna também um dos predadores mais rápidos da natureza. E a forma de você se defender de um urso polar, na calota polar, é ter um rifle de repetição, que normalmente é um calibre 12 com oito a doze tiros, sendo que o primeiro é uma bala que só faz barulho, aliás muito barulho. A intenção desse primeiro disparo é justamente assustar o urso. A bala seguinte é de chumbinhos bem pequenos que apenas machucam o urso, para ele fugir. Agora se nada disso adiantar, a partir do terceiro disparo, as próximas balas são calibre 12: uma bola de chumbo ou de aço cujo intuito é segurar mesmo o bicho.