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Previdência a caminho do colapso

Foto: Gabriel Cabral

ABRAM SZAJMAN

O país iniciou o ano com um novo governo e os velhos problemas de sempre. Tradicionalmente é o que ocorre a cada troca de dirigentes patrocinada pelo sistema eleitoral. Mudam os políticos, mas os desafios que encontram são os mesmos. Ou melhor, ampliam-se e se tornam mais fortes, quase insolúveis.

É o que acontece neste momento, quando novos governantes, fortalecidos por uma eleição plebiscitária, estão às voltas com dilemas de toda sorte. O primeiro deles, objeto de matéria nesta revista, é a reforma da Previdência, um assunto tão espinhoso e delicado quanto urgente.

No Brasil, o verbete previdência social está intimamente associado a uma série interminável de idéias negativas: privilégios, injustiça, corporativismo, desespero, miséria, caos, colapso. Com efeito, um exame objetivo da situação de nossa previdência oficial confirma esse sentimento. Basta verificar o saldo negativo previsto para este ano – R$ 85 bilhões, valor que o Tesouro Nacional deverá desembolsar para que o sistema possa se manter por mais algum tempo. Um prazo que não deverá ser longo, pois o déficit crescente nos leva a imaginar que, em breve, o país não disporá de recursos para arcar com tamanha dívida.

Esses fundos para a previdência são deslocados de outras áreas e afetam gravemente o desenvolvimento, com pesados efeitos sobre a taxa de juros e o déficit global.

Uma solução, portanto, deverá ser adotada, e rapidamente. Por essa razão o tema vem sendo debatido por toda a sociedade, em seus vários setores. Sabe-se que alguns deles, ligados à área pública, bem organizados e encastelados em seus lobbies, são há muitos anos beneficiados por uma série de privilégios, inconcebíveis à luz da justiça e da própria Constituição, que prega direitos iguais para todos os brasileiros. Tais setores, munidos de "argumentos" convincentes, ameaçam seriamente as tentativas de reforma, uma vez que consideram como um direito adquirido as decisões que os favoreceram.

Diversas propostas vêm sendo discutidas, e em todas elas merece destaque a previdência privada, na forma de um complemento ao sistema oficial. Há exemplos de outros países, com seus riquíssimos fundos de pensão, aliás já existentes entre nós, mas de forma incipiente. Com exceção dos fundos de estatais, os outros são de pequeno porte e em número reduzido.

Nas economias desenvolvidas, tais fundos têm peso significativo graças às reservas acumuladas ao longo dos anos. São valores tão expressivos que em alguns casos até superam os PIBs nacionais. É o caso da Suíça, por exemplo, cujos fundos chegam a 177% do PIB, ou da Holanda, em que alcançam 127%. Nos Estados Unidos a porcentagem é de 80% e no Canadá, de 99%.

Entre nós, os fundos existentes acumularam até hoje o equivalente a somente 13% de nosso produto, com a participação de apenas 2,3 milhões de trabalhadores.

Nossos fundos de pensão, entretanto, além de poucos e fracos em relação ao potencial da economia, sofrem de um mal intestino, responsável em parte por sua anemia. Para cobrir rombos do orçamento federal, os rendimentos resultantes de aplicações são impiedosamente taxados em 20%, o que evidentemente contém o crescimento do patrimônio e age como contra-incentivo aos investidores potenciais. Os fundos bilionários que existem pelo mundo afora certamente não seriam tão ricos e poderosos se tivessem de arcar com tributação semelhante. Lá os impostos incidem somente sobre o valor da aposentadoria que está sendo paga, nunca sobre poupança em formação.

Em qualquer economia, a capacidade de poupar da população é indispensável. Para que exista, porém, ela precisa de incentivos, algum tipo de atrativo que leve o cidadão a manter uma reserva, ampliando-a ao longo do tempo. Tais incentivos acontecem geralmente por via tributária, favorecendo quem não estiver disposto a gastar tudo o que ganha.

Entre nós, como se vê, além da falta de estímulo, a formação dos fundos de pensão sofre uma contra-indicação, pois o cotista, ao se aposentar, desembolsa novamente um imposto de renda que sua poupança já pagou ao longo dos anos.

A questão, como se vê, é complexa. Mas não há como escapar dessa dura lição de casa, que deverá ser feita a qualquer custo. O futuro de nossos filhos depende disso.

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