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Plano diretor
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JORGE WILHEIM São Paulo continua sendo uma cidade de grandes oportunidades e injustiças. Talvez nisso ela seja a mais brasileira de todas, porque apresenta essas duas características de um modo às vezes exacerbado, tanto nas possibilidades quanto nas coisas a serem corrigidas.
Em geral, é preciso dizer que planos diretores, regulamentos sobre o uso do solo nas cidades, não são acolhidos de uma forma muito popular ou privilegiada entre nós. Existe uma explicação. É que uma das características de nossa cultura, de país americano novo, é a mobilidade social. É parte dela o desejo de liberdade para fazer e refazer a vida, para mover-se no espaço nacional, crescer junto com as cidades e enriquecer com elas. Nesse tipo de cultura qualquer lei, imposição e governo são vistos, num primeiro momento, com desconfiança, por estarem impedindo aquilo que a vontade pessoal manda fazer. Assim, somos uma nação onde às vezes as leis não pegam, uma expressão incompreensível para qualquer cidadão inglês, por exemplo. Um lugar onde é difícil planejar porque parece que ninguém apóia a própria idéia do planejamento e onde o self-made man dominaria, se não fosse controlado por algumas normas que a sociedade acaba criando. Por essas razões todas e outras mais específicas de ordem política, não temos conseguido fazer planejamento em São Paulo, a não ser em raríssimas ocasiões.
Esta é a terceira vez que uma lei desse tipo é enviada para a Câmara Municipal, e espero seja discutida e votada, porque nas outras ocasiões isso não aconteceu. Temos poucos planos diretores em São Paulo, basicamente o de 1971, deixado pelo prefeito Faria Lima, e a lei de zoneamento que dele decorreu, aprovada no mandato de Figueiredo Ferraz, logo em seguida. A verdade é que essa espécie de proposta nunca foi acolhida com grandes aplausos, a não ser em setores muito especializados.
A dificuldade para fixar algumas regras para o desenvolvimento encontra obstáculos igualmente na área política. Faltou muita vontade no passado recente para levar a cidade a se desenvolver de forma mais humana e razoável. Foi essa ausência de vontade que provavelmente impediu os vereadores de discutirem os planos que recebiam, mas antes disso fez com que os executivos tardassem muito em enviar seus projetos para a Câmara. Nas ocasiões anteriores, uma das desculpas dos políticos era que estavam em fim de mandato.
Em função disso tudo, a prefeita Marta Suplicy fez questão absoluta de que o plano diretor fosse elaborado imediatamente e apresentado no primeiro ano de sua gestão, não só numa demonstração de que existe a vontade política, mas até por razões práticas, para que haja tempo para que o projeto possa alcançar seu objetivo, que é garantir previsibilidade aos negócios, orientar a administração pública e formar uma visão de futuro que balize os agentes econômicos e a sociedade em geral. Essa é a finalidade de qualquer plano, e certamente deste. Por isso foi feito um esforço para produzir o plano diretor no primeiro ano de gestão. Isso foi possível em grande parte pelo fato de que a Secretaria de Planejamento (Sempla), que é pequena, tem profissionais que nela trabalham há dez, 20 e até 30 anos. Há um núcleo técnico permanente que atravessou diversas gestões, inclusive os últimos oito anos, em que a Sempla foi dirigida por oito secretários, alguns dos quais permaneceram seis ou sete meses no cargo sem nunca terem comparecido à sede do órgão. Era, portanto, uma secretaria desprestigiada, sem função, que não recebia nenhuma encomenda dos governantes, mas o seu núcleo se manteve e até inventava suas próprias tarefas. Com isso avançou no conhecimento sobre São Paulo, pois houve atualizações dos dados, o que me permitiu conduzir a equipe para a elaboração de um plano. A base já existia. Gastamos mais tempo criando inovações necessárias do que fazendo diagnósticos e levantamentos que estavam prontos.
O plano diretor é uma lei. Ele se apresenta não sob a forma de livro, mas com artigos de lei. O livro será feito posteriormente, porque há muito conhecimento que deve ser divulgado gradualmente. Mas a primeira coisa era entregar à Câmara um projeto de lei para ser discutido e eventualmente aprovado. A estrutura dessa lei tem quatro grandes capítulos. Depois de uma exposição de motivos, o primeiro capítulo estabelece os princípios ou conceitos gerais e todas as definições necessárias ao entendimento de uma lei. O segundo trata de políticas e estratégias. Para efeito legal, as políticas têm como horizonte o ano de 2010, e dizem respeito a educação, saúde, transporte, todas as atividades e setores da administração com um prazo mais amplo, de dez anos. E cada setor desses é acompanhado de ações estratégicas com perspectiva mais curta, para o ano de 2004.
As ações são consistentes com políticas de longo prazo, mas são estratégias com as quais a presente prefeitura se compromete, e admite-se que depois de 2004 uma nova administração possa fazer uma listagem de ações estratégicas, submetidas, no entanto, às mesmas políticas setoriais de longo prazo. Acreditamos que daqui a quatro anos outra administração possa encontrar formas mais rápidas, mais eficientes ou mais eficazes de atingir aqueles objetivos de longo prazo e que submeta então à Câmara um novo elenco de ações. Pretende-se com isso promover certo dinamismo para a rigidez que normalmente as leis têm.
O terceiro capítulo trata do plano ambiental propriamente dito. Temos a descrição e as inovações tanto a respeito do uso do solo como sobre as políticas ambientais que exercem grande papel dentro desse plano diretor. É normalmente o título mais discutido.
O quarto capítulo aborda a gestão do planejamento, o que vem depois, como ele é acompanhado. Cria conselhos e conferências anuais de política urbana, engloba as subprefeituras e os respectivos conselhos de representantes, destinados a opinar sobre alterações e correções do plano diretor e assim por diante. Existe ainda um quinto título, sobre medidas provisórias e transitórias.
Vejamos agora, de forma rápida, uma descrição da proposta física do plano, o que ele propõe para a cidade no horizonte do ano 2010. Há algumas grandes preocupações a que o plano deve responder. Uma delas é o fato de que a ocupação territorial é extremamente desigual na cidade. Os bairros centrais perderam moradores, justamente onde existe toda a infra-estrutura. Por outro lado, a periferia se inflou com loteamentos ou ocupações irregulares. Ultimamente agravaram-se os problemas ambientais da cidade. Somos a maior superfície impermeabilizada do mundo, não só porque a maioria das vias está pavimentada, exceto na periferia, mas também porque a cidade se caracteriza por ser um enorme lençol formado por pequenos lotes que são totalmente cimentados, isto é, ocupados quase inteiramente para habitação. Mesmo quando há recuo, ele geralmente é pavimentado, uma vez que a terra é vista quase sempre como lama e poeira e não necessariamente como espaço para jardim ou para uma árvore. Quando sobrevoamos a cidade de helicóptero, percebemos claramente o oceano de pequenos lotes, com ocupação intensa, embora a densidade média ainda não seja tão grande.
Esse lençol impermeável está jogado sobre aquilo que os geólogos chamam de mar de morros. A topografia é toda acidentada, e essa é a causa primeira de termos tantos pontos de enchente. A água de chuva cai sobre essa laje impermeabilizada e corre imediatamente para os fundos de vale. Não há escoamento ou drenagem que possa suportar tal volume de água, e esse é um dos problemas graves que o plano diretor aborda.
Além disso, percebe-se no diagnóstico que nessa desigualdade de ocupação o crescimento e as demandas habitacionais e de comércio e serviços fazem com que em alguns lugares haja uma concentração muito grande de edifícios altos. Isso é normal em qualquer cidade. Elas se espalham sempre irregularmente, criam-se alguns pontos de adensamento. Esses pontos têm até aumentado, o que é bom no caso de São Paulo. Surgem de repente novas áreas com prédios de apartamentos e escritórios em lugares insuspeitados na véspera, como é o caso da Casa Verde, como foram Tatuapé e Moema. O mercado imobiliário descobre certos bairros, e essas concentrações acontecem sobre uma trama viária insuficiente. Se examinarmos a estrutura principal da cidade, perceberemos que no fundo nos afastamos muito pouco daquilo que existia no século 19, quando São Paulo era uma vila. Tínhamos uma ligação para o Rio de Janeiro, outra para Campinas, que era a região da produção agrícola, outra para Santos e uma para a área pecuária de Sorocaba. O que temos hoje? A mesma coisa, só que com vias triplicadas: três para o Rio de Janeiro, três para Campinas, três para Santos e duas para o sul. Dessa estrutura nascem outras vias que foram criadas depois, mas é preciso lembrar que São Paulo até 1890, até a alvorada do século 20, era uma vila que ocupava o triângulo central, a parte histórica de São Paulo. Todo o restante da região eram chácaras, e a cidade cresceu inicialmente pelo loteamento dessas propriedades.
Mapas de São Paulo de 1880 mostram uma zona urbana entre o Anhangabaú e o Tamanduateí. O resto eram chácaras. Com a migração, a grande explosão de demanda da última década do século 19 e durante todo o século 20, essas áreas foram sendo loteadas. Isso resultou numa trama viária bastante caótica e até hoje incompleta. Uma das coisas que caracterizam essa estrutura, além do que já falei, é que toda a zona leste é carente de ligações norte-sul e toda a zona norte, de ligações leste-oeste. Então quem está em Pirituba e quer ir para Santana só tem um caminho, a Marginal do Tietê. E quem quiser ir de Ermelino Matarazzo, ao norte da zona leste, para o Ipiranga ou Vila Prudente só encontrará uma opção, que é voltar para o centro e depois sair de novo. São graves carências na própria rede viária. Além disso, as ruas são relativamente estreitas, com exceção de algumas poucas avenidas. Aliás, quero lembrar que, do plano de vias expressas de Figueiredo Ferraz, somente uma foi construída, e pela metade, entre as 80 que foram previstas. É a Avenida Sumaré, que deveria chegar até a Marginal do Pinheiros.
Essas carências do sistema viário acarretam algumas situações preocupantes, como no caso da concentração de edifícios em algumas regiões. Um bom exemplo é a Vila Olímpia. Esse bairro, dentro da operação Faria Lima, recebeu benefícios, e permitiu-se a construção de inúmeros prédios. Ainda há muitos em projeto. É o que a legislação admite, e a rigor isso não está sendo alterado pelo plano diretor no caso das operações urbanas. O resultado é que temos densidade de ocupação muito grande num sistema viário muito escasso, e a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) não encontra meios de garantir a circulação de veículos por aquela região depois que todos os edifícios projetados estiverem construídos. Então estão surgindo diferenças de opinião entre quem lançou e construiu aqueles prédios e quem os ocupa. Evidentemente, são construções de qualidade, para moradia e trabalho. O problema é chegar lá e depois sair. E existem já ocupantes que criaram uma entidade não-governamental chamada Colméia, que está preocupada com a situação das áreas públicas, porque não houve suficiente planejamento para prever o espaço necessário para veículos e pedestres.
Experiências como essa tiveram muita influência no plano diretor, e estabelecemos algumas regras para permitir a recuperação da capacidade de planejamento de áreas públicas, em benefício inclusive do melhor desempenho dos espaços privados.
Essas situações que citei são aspectos do diagnóstico que nos impressionaram, que são relevantes e levaram a uma série de propostas cujo objetivo não é diminuir o dinamismo da construção civil, do mercado imobiliário. Para o desenvolvimento da cidade, esse é um setor importante, que garante um número muito grande de empregos. Mas gostaríamos que ele fosse mais distribuído pela cidade, que não houvesse certas concentrações. Alguns centros de bairro sempre têm de existir, mas não uma caricatura desse adensamento a ponto de não podermos garantir um sistema viário suficiente para o desempenho da cidade nesses locais. É por isso que, de forma geral, o plano diretor na parte física expande a região de oportunidades, cria operações urbanas, sobre as quais haverá um mínimo de planejamento possível, incentivando inclusive o mercado imobiliário a ocupar essas áreas, porque é lá que haverá coeficientes maiores de aproveitamento. Portanto, há o interesse dos investidores. É claro que nem todas as regiões terão seus projetos prontos ao mesmo tempo. Mas queremos que desde já se abra essa perspectiva, porque um plano diretor deve, entre outras coisas, servir à previsibilidade dos negócios. É importante saber onde, durante dez anos, a prefeitura pretende abrir oportunidades.
As operações urbanas terão a partir de agora uma definição única, que não tinham. Cada uma das três operações conhecidas como Faria Lima, Água Branca e Centro tem uma lei, e elas não são consistentes umas com as outras. Elas foram feitas um pouco sob medida. A partir de agora, as novas operações urbanas seguem um conceito. Todas elas devem criar espaços públicos, melhorar a infra-estrutura, na qual o sistema viário é muito importante, resolver os problemas da habitação de interesse social no perímetro da sua definição. E todas permitem, através de outorga onerosa, um coeficiente de aproveitamento mais alto. Então, seja Água Espraiada, Vila Leopoldina, Carandiru ou Vila Maria, todas deverão abordar esses quatro aspectos, embora eles se traduzam de maneira diferente, porque cada uma dessas áreas tem suas peculiaridades.
Vejamos quais são essas novas regiões de oportunidades. Mencionei a Água Espraiada, que já tem uma lei e que não só aborda a continuação da Avenida Luís Carlos Berrini até a ponte João Dias, portanto um prolongamento do sistema viário paralelo à Marginal do Pinheiros, mas segue ao longo da Avenida Água Espraiada até alcançar a Rodovia dos Imigrantes. Ao aprofundar-se além do Jabaquara, alcança Americanópolis e toda a sua região, que é de classe média e média baixa, onde há inclusive muita favela a ser remanejada, em situação de risco. Na outra ponta, temos a operação urbana da Vila Leopoldina, região da Ceagesp e toda aquela área em que o rio Pinheiros alcança o Tietê, em grande transformação hoje. A Ceagesp sairá de lá até o ano 2004, segundo informações do governo do estado. Dentro do plano estamos pleiteando que a linha de metrô da Paulista, que hoje vai até a Vila Madalena, continue até a Vila dos Remédios, atravessando essa região e ligando-se a um núcleo de linhas de ônibus da zona oeste e sudoeste.
Outra operação urbana é a do Carandiru, junto ao presídio, e toda a Vila Maria e Vila Guilherme, área de grande transformação. É uma região onde as ruas são ocupadas por caminhões de transportadoras, existem bairros residenciais de boa qualidade, centros de eventos e de conferências e diversos hotéis em construção. Ocorrem muitas mudanças na Vila Maria, alcançando até a Vila Guilherme e o sul de Santana. Já estudamos o local do ponto de vista econômico e queremos garantir que o Carandiru não abrigue mais detentos. Para isso, essa propriedade deve se transformar num parque com equipamentos sociais. Colocaremos na operação um sistema financeiro que permita ao proprietário dessa gleba, que é o estado, auferir receita suficiente para construir em outra região os presídios que faltam para desocupar totalmente o local.
O Campo de Marte está também incluído na área de estudo, mas não na operação. Temos um velho sonho em relação a ele. Seria bom ter um parque ali, em vez de pista, que ocupa muito espaço. As dependências da aeronáutica até poderiam ficar, mas a pista, além de grande, é de uma ociosidade gigantesca no coração da cidade.
Outra oportunidade está na zona leste, ao longo da Avenida Jacu Pêssego e no cruzamento desta com o Parque do Carmo, com a Área de Proteção Ambiental (Apa) do Carmo e terras da Companhia Metropolitana de Habitação (Cohab), e de uma via até Guaianases, ocupando o lugar dos trilhos de trem que foram retirados. Existirá então uma outra operação, a Pontal Leste, que está em fase de elaboração. Finalmente, há duas operações urbanas que estiveram o tempo todo na nossa frente e nem sempre foram enxergadas. Quem sobrevoa a capital de helicóptero percebe que a cidade de São Paulo é cortada em diagonal por um sistema antigo de estradas de ferro, hoje de grande ociosidade, e ao longo do qual se instalaram diversas indústrias. Estamos falando do vale do Tamanduateí, da estrada de ferro que vem de Santo André e São Caetano, passa pelo Ipiranga, Mooca e Cambuci, alcança o Brás, Pari e o centro, sai pela Barra Funda e Água Branca e chega a Pirituba e Perus. Hoje essa área é bastante ociosa porque muitas empresas se deslocaram, deixando pavilhões industriais vazios. A Rede Ferroviária Federal colocou aqueles terrenos todos em volta à venda, porque ela tem apenas um liquidante que a representa aqui. É uma região com infra-estrutura instalada, e o trilho da estrada de ferro pode ser utilizado para um trem de superfície semelhante ao metrô (isso está previsto pelo estado até o ano de 2020), com composições que trafeguem a cada cinco minutos. A região perdeu moradores, e acreditamos que essa proposta representa a grande oportunidade que São Paulo tem de fazê-los voltar.
A operação Diagonal Sul e a Diagonal Norte são importantes dentro do plano, e já estamos negociando com o estado, com a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), a Rede Ferroviária Federal e o Metrô para poder completar o transporte público ao longo desse eixo. Montar essa operação não é fácil, existem muitos interesses, mas, ao mesmo tempo, no momento em que apresentamos o assunto, imediatamente surge grande entusiasmo por essa realidade que estava na frente de todos nós há muito tempo.
Além dessas operações urbanas, temos também algumas ações e projetos estratégicos que vou descrever muito rapidamente porque ajudam a visualizar a proposta física do plano. Na Vila Sônia, onde começa a linha 4 do metrô, que vai até a Estação da Luz, teremos junto com o metrô a Estação Rodoviária Sul, para receber os ônibus intermunicipais que utilizam as rodovias Régis Bittencourt e Raposo Tavares. Eles deixarão de ir até a rodoviária da zona norte. Isso nos permitirá, provavelmente através do sistema de consórcio, uma atividade imobiliária interessante, que vai refazer o centro desse bairro que já é populoso.
Outros projetos pontuais importantes são os das avenidas Santo Amaro, Anhaia Melo, Celso Garcia e Francisco Morato. Trechos importantes delas estão em decadência, e pretendemos, em parceria público-privada, fazer um redesenho deles, a fim de recuperar essas áreas, que são muito valorizadas.
Destaco também um centro esportivo perto de Guarapiranga, no fim do canal do rio Pinheiros. Na realidade, são duas intervenções. Uma na região do autódromo de Interlagos, para ligar a represa de Guarapiranga à Billings. É um projeto mais paisagístico, para refazer inclusive o entorno do autódromo. A outra é o próprio centro esportivo, nas proximidades da Avenida Guido Caloi, junto ao Centro Empresarial. Há interesse em uma unidade de preparação de atletas que poderia servir a vasta área de Capão Redondo e toda a região sudoeste, muito carente de atendimento de qualidade.
Outra operação pontual é no Largo da Batata, já em andamento, que compreende toda a área de Pinheiros. Haverá uma estação de metrô, a Faria Lima, mas a região será melhorada, graças inclusive ao que foi auferido pela outorga onerosa. Temos os recursos em caixa para poder investir nessa e em outras obras do local.
Boa parte dos projetos estratégicos, no entanto, se concentram na revitalização e requalificação da zona central. Um exemplo é o Parque Dom Pedro, que será transformado finalmente num parque. Dentro dele está o Palácio das Indústrias, que terá função turística, como local de exposição, convenções, ou uma grande biblioteca especializada em assuntos de São Paulo, com audiovisuais, e um ou mais restaurantes no seu porão, como foi projetado, aliás, pela arquiteta Lina Bardi. Na face norte do parque, voltada para o Brás, todo o primeiro quarteirão ao longo da Rua da Figueira, de um e do outro lado da Casa das Retortas, será reformulado como um projeto habitacional, com comércio no térreo. Haverá galerias com lojas no meio das quadras. Será uma nova entrada para o Brás, e haverá provavelmente edificações residenciais de classe média, imagino, não muito altas, talvez de oito andares, mas com o mesmo gabarito, a fim de servir de moldura para o Parque Dom Pedro.
Ainda nessa região, temos a zona cerealista, que será um bairro. Os comerciantes mudarão, com a Ceagesp, para uma outra localização, com nova denominação: Ciasp (Central Integrada de Abastecimento de São Paulo). Eles ficarão perto da Rodovia Raposo Tavares, junto ao Rodoanel. Essa mudança acontecerá até o ano 2004, segundo os comerciantes afirmam e o estado confirma. No lugar dos armazéns, que são alugados aos empresários, pensamos em criar um pequeno bairro com espaços públicos, comércio, serviços, lojas e residências. Isso provavelmente será feito através de um consórcio imobiliário, do qual os proprietários das áreas participam.
Ainda no centro, teremos a curto prazo uma melhoria do Mercado Municipal, com a abertura de um restaurante ou uma praça de alimentação, removendo alguns atacadistas, mas mantendo o varejo.
Finalmente, há a operação 25 de Março, do outro lado do Parque Dom Pedro, uma requalificação de toda essa região, com o deslocamento dos ambulantes para uma alameda de comércio informal, não na 25 de Março mas dois quarteirões abaixo. E com um sistema de circulação que atrapalhe o mínimo possível os pedestres, que são muito numerosos, mas sem impedir que os veículos entrem, dada a função comercial dessa área.
Esses são alguns dos projetos que vão ajudar a desenhar uma nova São Paulo, com pólos de atração mais descentralizados, que permitirão que os moradores venham a ocupar a zona central. Sabemos que essa região é plenamente equipada, tem muita vitalidade, mas precisa ser requalificada. E para isso é necessário que tenha movimentação dia e noite. As atividades noturnas são a moradia, para todas as classes sociais. Há diversos edifícios ociosos, abandonados até, que já foram identificados, serão batizados como zona de interesse social e reabilitados para habitação, com financiamento da Caixa Econômica Federal. Haverá moradores de menor nível salarial, mas existe também previsão para pessoas de classe média e mesmo alta. Para isso vamos construir três estacionamentos subterrâneos, no Largo Paiçandu, na Rua Xavier de Toledo e na Praça da República, junto à Avenida Vieira de Carvalho, uma vez que os edifícios antigos não têm garagens suficientes e não há maneira de construí-las dentro deles.
É claro que o projeto destinado a reconstruir o centro tem outras características. Queremos, por exemplo, que a Cinelândia tenha melhor qualidade. Nas proximidades, na região da Santa Efigênia e Luz, será implantado o Projeto Monumental, com financiamento do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e do Ministério da Cultura, e parceria entre prefeitura e estado. Essa proposta alcança, pela Avenida Tiradentes, um bairro muito curioso, a Ponte Pequena, constituído por um conjunto de oito, dez quarteirões, entre as avenidas Tiradentes, Cruzeiro do Sul, a Marginal do Tietê e o rio Tamanduateí, no lugar onde está a estação Armênia do metrô. É um bairro curioso porque só tem um prédio, e o restante são casinhas baixas e dois clubes com áreas verdes, um deles o antigo da Companhia Municipal de Transportes Coletivos (CMTC). Toda vez que planejadores se debruçam sobre essa região, ficam encantados com suas possibilidades.
Estamos destacando esse bairro como um projeto estratégico, para o qual hoje ainda não temos programa. Nas vezes anteriores, quando fiz o plano para a Faria Lima e urbanização do Tietê, ou quando Oscar Niemeyer elaborou para Jânio Quadros um projeto também para a várzea do Tietê, havia a intenção de construir na Ponte Pequena, no caso de Niemeyer, um centro administrativo. Não é essa nossa visão, nem vemos isso como necessidade. A administração tem de ficar no centro em diversos prédios, não precisa ocupar um só. E havia a hipótese de manter o nível baixo de construção e dar uma qualificação, talvez até transformar os prédios em ateliês de artistas, criando um bairro boêmio. Alguma coisa será feita nessa área, porque sua localização é boa demais e não queremos perder essa oportunidade.
Finalmente, o plano diretor diz que planejar é prever e prover. Tudo o que falei até agora está no capítulo prever. Mas estamos convencidos de que a urbanística contemporânea, do século 21, tem de cuidar do prover. Se ficarmos no prever sem prover, estaremos fazendo desenho. Desenho, como todas as utopias do passado, tem sua função no desenvolvimento da cultura, mas, face às necessidades, à demanda e à dívida social que São Paulo tem com seus habitantes e usuários, é necessário que não permaneçamos no papel. Precisamos cuidar do prover, e isso significa conhecer os recursos, os meios, os mecanismos pelos quais essa visão de futuro possa realmente se transformar em realidade.
A cidade é uma obra coletiva. Devemos reconhecer que nessa parceria temos de tirar o melhor proveito possível. Senão, uma das partes vai sofrer, e quem perde sempre é a população.
O plano diretor se preocupa com esses problemas, e os planejadores vêem com satisfação uma lei federal nova, que é o Estatuto da Cidade. Esse documento foi gestado no Congresso Nacional durante 12 anos, mas me recordo que suas principais teses começaram a ser discutidas há pelo menos 25 anos. Uma longa luta para que as cidades brasileiras possam ter planejamento, e não fiquem apenas obrigadas a corrigir o que foi feito errado. Esse estatuto, que foi sancionado no ano passado e entrou em funcionamento em outubro, fornece alguns instrumentos de gestão que o plano diretor utiliza. Alguns deles, como as operações urbanas ou as transferências de potencial construtivo, nasceram em São Paulo. Elas são praticadas já há algum tempo como lei municipal e foram agora generalizadas. Outros, como a concessão geral de uso ou usucapião, permitem a regularização de favelas e de irregularidades que em certos municípios brasileiros abrangem dois terços das cidades, como é o caso de Recife, ou perto de um terço, como em São Paulo.
O plano diretor coloca nas suas plantas todas as zonas de interesse social que são importantes, com diversas categorias, como a regularização de favelas e a reocupação de edifícios no centro. Tanto nas áreas de preservação como nos edifícios que estão tombados, permite-se pelo plano que seja transferido um potencial construtivo virtual, que não se pode usar naquela área, para outro local a parte da cidade onde de fato é possível construir, onde existe estrutura urbana.
Esse é um primeiro exemplo de transferência de potencial construtivo, feita para garantir áreas de proteção, que implica uma vantagem financeira. No caso das áreas verdes, o funcionamento é diferente do que ocorre nos edifícios tombados. Nestes, a receita é recolhida de uma só vez. Há uma negociação entre dois particulares, e essa receita se destina a manter o próprio imóvel, a reformas, a fazer o necessário para preservar o bem tombado. No caso das áreas verdes, não se pode agir da mesma forma, porque corremos o risco de um proprietário qualquer, não tão bem-intencionado, faturar essa transferência de potencial construtivo e no ano seguinte entregar o espaço para um loteamento irregular, e então nada mais se preservar. Assim, a outorga da transferência de potencial construtivo será dada anualmente, portanto com valor menor, para permitir uma fiscalização sobre a preservação daquele espaço.
Quanto à regularização das favelas, há dois instrumentos: a concessão real de uso, quando houve ocupação de um terreno público, e o usucapião especial, quando a invasão ocorreu em áreas privadas. A lei federal diz que isso só vale para as ocupações com mais de cinco anos. São aquelas favelas que serão transformadas em bairros, e colocamos no plano diretor que a concessão e uso desse instrumento sempre serão seguidos pela urbanização da região, porque existe uma pequena falha no Estatuto da Cidade, que permite que haja uma solicitação de regularização da favela deixando-a como está. Só que nesse caso os moradores passam a deter a posse mas a favela continua sem acesso, sem ruas, sem espaços públicos, portanto com uma qualidade que não interessa aos próprios proprietários. Por isso estamos incluindo no plano diretor uma premissa, que é a urbanização, para que aquela favela se transforme realmente em bairro.
Outro instrumento que estamos utilizando é a outorga onerosa, que se vincula ao coeficiente de aproveitamento dos lotes, que é baseado numa lei, a qual teve de ser emendada inúmeras vezes nas últimas três décadas. Trata-se do plano diretor de 1971 e da lei de zoneamento do ano seguinte, que foi sendo emendada mas continua bastante rígida. Nela, o coeficiente de aproveitamento é tratado de maneiras sucessivas. A rigor, a grande parte da cidade que hoje é batizada de Z-2 permite a construção de uma vez a área do terreno. No entanto, tratando-se de uso residencial, esse coeficiente dobra para dois. Além disso, por uma lei conhecida no meio profissional como Lei de Adiron, do urbanista Benjamin Adiron Ribeiro, que trabalhou na Coordenadoria do Planejamento da prefeitura na década de 70, se você tiver um lote com mais de 25 metros e ocupar menos o espaço, verticalizando a edificação, poderá novamente dobrar o coeficiente. E aí não estão calculadas todas as áreas chamadas não-computáveis, que foram crescendo com o tempo as garagens, as áreas de circulação, uma série de espaços. Foi através dessas formas legais e sucessivas que às vezes se alcançaram aproveitamentos de quatro, cinco ou mais vezes a área de cada lote. Na origem era só uma vez. Não digo que sejam truques, porque são decisões legais, mas o resultado foi a verticalização, que em si não é má, desde que não ocorra de forma excessiva sobre um sistema viário insuficiente e diante de uma taxa de motorização crescente nas últimas duas décadas.
Essas mudanças, curiosamente, também acabaram tirando do mercado um tipo de construtor médio, que teria capital para fazer prédios de oito, dez andares, mas não tem capacidade de chegar aos 20 ou 25 andares. Para esse tipo de investidor, a rentabilidade resultava sempre inferior à de uma verticalização que aproveitasse a Lei de Adiron, que dobra o coeficiente de aproveitamento. E esses edifícios menores seriam boas soluções em muitos casos, para concentrar sem excesso locais de habitação ou trabalho nos diversos bairros da cidade.
O coeficiente que estamos propondo no plano diretor é de 2,5 e quatro vezes a área de cada lote. Quatro vezes nas 11 operações urbanas, que abrangem áreas consideráveis, também ao longo dos corredores de transporte rápido de massa, como metrô e trem, e ainda pontualmente em torno dos projetos especiais estratégicos, alguns já mencionados. Estamos prevendo, portanto, adensamentos, porque a cenourinha do coeficiente maior é atraente. Teremos então concentrações em diversos lugares, não tão poucos quanto hoje. Esse coeficiente de quatro ou 2,5 é um teto, um limite máximo. O de 2,5 poderá ser diminuído em alguns casos, de acordo com a situação, e isso a lei de zoneamento vai determinar.
Quando detalharmos essa diretriz na lei, cuja reanálise já foi iniciada, veremos que em alguns casos estaremos aumentando demais o coeficiente de aproveitamento. Existem áreas onde não se pode construir nem de longe 2,5 vezes. Não é permitido pela lei atual, por razões ambientais muito claras. Então haverá certa flutuação na revisão da lei de zoneamento, no que diz respeito às diretrizes e ao coeficiente. É até possível que em alguns pontos extremamente privilegiados o coeficiente máximo possa ir até cinco ou seis. Essa flexibilização poderá ocorrer, mas isso somente será feito no detalhamento dessa diretriz, através da revisão da lei.
Então o que fica no coeficiente um é a gratuidade do direito de construir. Pode-se edificar 2,5 ou quatro vezes, com exceção das zonas estritamente residenciais, em que só se pode construir uma vez a área do lote. Como se muda de um para 2,5? Estamos abrindo algumas hipóteses no plano diretor. Em primeiro lugar, nas atividades que interessam muito à cidade, como as educacionais, científicas, culturais e de habitação de interesse social, a outorga é gratuita. Essas edificações podem ser construídas aproveitando o máximo que a lei permite, sem ter de pagar por isso. No restante existem outros mecanismos. Pode-se, por exemplo, subir de um para 1,5, ganhando meio coeficiente a mais de gratuidade, pela transferência de potencial construtivo de outros terrenos.
Uma outra maneira poderá surgir localizadamente. Há certas situações em que é necessário alargar uma avenida ou fazer alguma obra pública, e os proprietários dos terrenos poderão realizar esse trabalho ou participar dele, e assim aumentar o coeficiente de mais um tanto, calculado pelo valor da obra em que estão investindo. E finalmente há a outorga onerosa, isto é, a compra do coeficiente que falta para chegar ao teto de 2,5 ou de quatro, conforme o caso. Nessa outorga São Paulo tem experiência, a operação Faria Lima, por exemplo, foi feita assim há mais de dez anos. A sistemática será simplificada, mas já é conhecida dos empreendedores.
Ainda dentro da linha de previsibilidade dos negócios, pretendemos que haja, por região, um valor do metro quadrado adicional fixado por um ano. Em cada mês, digamos, de dezembro se estabelece o valor para o ano seguinte nesta e naquela área. Na região da Faria Lima, por exemplo, o metro quadrado adicional está arbitrado e aprovado pelo Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano (CMDU) em torno de R$ 850. Ele corresponde, no entanto, a R$ 280 no cômputo total do terreno. Uma média de São Paulo corresponderia a por volta de R$ 180 por metro quadrado, resultante da adição do coeficiente 2,5 ou quatro.
Muito se têm comentado as conseqüências dessa nova sistemática. Vamos falar do efeito positivo, que se refere ao prover, diz respeito à cidade tendo de financiar suas obras públicas. Não adianta esconder o sol com a peneira: os grandes centros urbanos não conseguem mais financiar suas necessidades. No caso dos europeus, eles têm de enfrentar migrações maciças que modificam completamente a distribuição de seus orçamentos. Quanto aos brasileiros, temos uma dívida social e de infra-estrutura enorme. Em São Paulo, há um agravante: o pagamento dos débitos contraídos por administrações anteriores. Eles serão pagos em 30 anos, dos quais já se escoaram alguns. O contrato de pagamento dessa dívida não é uma coisa negativa em si, no sentido de que se tinha de arranjar uma solução. Mas ela apresenta em sua generalização alguns empecilhos muito graves. Da receita líquida captada mensalmente, 13% vão diretamente para o Banco do Brasil, o que significa uma diminuição automática da receita. E temos a proibição de contrair dívidas, portanto, de receber financiamentos. São Paulo teria garantias folgadas a dar ao Banco Mundial, a todos os bancos de financiamento e de desenvolvimento, e recebe inclusive ofertas, tanto do Japão como do BID e de outras instituições, de dinheiro para poder resolver topicamente o problema das enchentes, das favelas, do transporte. E não podemos aceitá-las, a não ser que o governo federal excepcionalmente autorize. Assim, a administração pública municipal está encerrada numa camisa-de-força.
Surge então realmente a necessidade de encontrar novas formas de financiamento. A outorga onerosa permitirá dobrar o número de obras no orçamento de 2002. O do ano passado, que vale para este, se concentra em programas sociais, mas tem diversas obras previstas, que estão já sendo licitadas e feitas. Provavelmente os orçamentos dos anos seguintes não serão muito diferentes deste, pois a margem é pequena. Por mais que se melhore a tributação Impostos Predial e Territorial Urbano (IPTU) e Imposto sobre Serviços (ISS) , existem tetos que são a própria capacidade de pagar dos cidadãos e das empresas. Através da outorga onerosa, que é uma parceria generalizada, podem-se captar mais recursos, que vão diretamente para um fundo de desenvolvimento urbano. Eles poderão ser gastos através de planos anuais somente com quatro itens: meio ambiente, infra-estrutura, transporte e habitação de interesse social. Portanto, é um dinheiro que não vai para o Tesouro, não vai para um fundo que dificilmente pode ser acompanhado pela cidadania. Vai para um fundo onde as formas de controle e de visualização de destino serão muito claras. Sem falar que, quando a outorga onerosa se dá em uma operação urbana, o recurso tem de ser gasto dentro do perímetro dela, razão pela qual, aliás, as operações urbanas têm um perímetro generoso, para poder permitir um pouco de política à Robin Hood, que é oferecer à população mais pobre obras e benfeitorias de que está carente, com recursos obtidos junto à classe e empresas mais privilegiadas.
Há muita especulação sobre o ônus representado pelo plano, e é difícil comprovar qual será o efeito dessa sistemática, primeiro na atividade da construção civil e, segundo, sobre os empreendimentos imobiliários, seus investimentos e rentabilidade. E, em terceiro lugar, quais serão suas conseqüências sobre o mercado fundiário, isto é, sobre os terrenos e o valor da terra.
Antes de mais nada, é importante distinguir estes dois mercados, que têm lógicas diferentes: o fundiário e o imobiliário. Nos jornais tenho notado, muito freqüentemente, que não se faz essa distinção. Na realidade, eles têm lógicas completamente diversas. Assim como queremos garantir vitalidade ao mercado imobiliário, por causa dos empregos que ele oferece e pelas riquezas que produz, por outro lado vemos como positivo o fato de o mercado fundiário ser pressionado para baixo. Se a valorização da terra não depende de investimento direto do proprietário, mas exclusivamente do que a cidade fez por aquele proprietário ou, às vezes, daquilo que um vizinho fez portanto, uma valorização parasitária , conter o valor da terra não é uma coisa má, especialmente para o mercado imobiliário. Entretanto, nada em matéria de alterações será nem traumático nem rápido. Essas coisas se modificam com o tempo e de forma muito diversa nas diferentes regiões.
Debate JOSUÉ MUSSALÉM Se compararmos as cidades brasileiras com as européias, veremos uma diferença brutal. O centro está desvalorizado, com inúmeros imóveis comerciais completamente abandonados. Em Paris, Roma ou Madri isso não acontece. Ao contrário, são áreas bastante valorizadas. Eu lhe pergunto: esse fenômeno seria causado por um modelo de urbanização europeu, de renda alta?
Quanto aos planos diretores, hoje praticamente toda cidade, por menor que seja, deverá ter o seu. Mas como fica a questão do financiamento desses planos naqueles municípios que não têm condição nem de pagar o salário mínimo aos seus servidores?
WILHEIM Em primeiro lugar, o ritmo de crescimento das cidades européias foi
mais lento: foram crescendo e estabelecendo a infra-estrutura, construíram palacetes
excelentes na área central, além de terem criado um sistema de transporte coletivo muito
eficiente. Em nosso caso, a mobilidade é muito grande, o centro se deslocou rapidamente e
entrou em decadência mais depressa. O problema realmente é qualificar. E temos um
agravamento: aderimos ao automóvel com uma paixão desmedida, em parte porque não
tínhamos alternativa, pois o transporte coletivo é ruim e as distâncias são muito
grandes São Paulo é muito maior do que Paris e, em segundo lugar, porque
carro é uma coisa boa, todo mundo quer. Mas onde o estaciono? E temos famílias com
quatro, cinco veículos, enquanto os edifícios do centro não têm garagem para um.
Então, se não houver uma maneira de estacionar por perto, dificilmente as pessoas vão
se mudar para lá.
Mas nem todos têm automóvel em São Paulo, e nem todos têm quatro ou cinco deles. Na
realidade existe a oportunidade de a classe média voltar para o centro, onde há
edifícios e a experiência mostra que os empregos estão mais concentrados. Assim, morar
no centro significa uma economia considerável de transporte e de tempo. Acreditamos,
portanto, em algum êxito nessa reconquista das áreas centrais.
Quanto ao financiamento de planos diretores, é verdade que na época dos militares o
planejamento tinha certo prestígio. Na época o dinheiro vinha, como sempre, do sistema
previdenciário. Isso pode voltar, hoje graças à Caixa Econômica Federal, que poderia
abrir uma linha de financiamento para planos diretores.
ALBERTO BOTTI O ponto polêmico da nova proposta está no coeficiente de
aproveitamento anárquico, que diminui para um para depois retornar a 2,5. O impacto que
essa proposta tem na cidade de São Paulo é totalmente diferente naquilo que chamamos de
Z-1 e Z-2, que não mudam, e nas restantes, Z-3, Z-4 e Z-5. Se analisarmos todas as Z-3,
Z-4 e Z-5 remanescentes e eliminarmos algumas delas com menor expressão, pois são Z-3
só no papel, verificaremos que o que existe de terrenos livres, áreas que permitem a
verticalização, deve representar cerca de 3% da superfície de São Paulo. É uma
quantidade mínima. Evidentemente, esses 3% vão ser afetados, porque terão seu uso
diminuído de quatro vezes para um.
Já na Z-2, que representa 70% da cidade e provavelmente a grande parte ainda passível de
verticalização, o efeito será contrário. Hoje em dia, o que se pode construir é no
máximo duas vezes o coeficiente. Na verdade é uma vez para comércio e duas vezes para
habitação. Numa aritmética barata, o índice é 1,5. Você está aumentando para 2,5,
então está verticalizando essa área. Considerando que o grande impacto político da
proposta está concentrado nos 3%, menos até, da superfície de São Paulo, será que
vale a pena assumir todos os problemas que ela vem provocando? Será que compensa, por
causa de meia dúzia de terrenos numa Z-3 ou numa Z-4, causar todo esse impacto? Tenho
minhas dúvidas. Penso que isso poderia ser reestudado, até porque, para reduzir, por
exemplo, a Z-2 para 1 é muito fácil, basta revogar a Lei de Adiron.
Para terminar, receio que o impacto, que em minha opinião é mais emocional do que real,
paralise por algum tempo o mercado imobiliário, como já aconteceu no passado, quando
Figueiredo Ferraz implantou o zoneamento. Evidentemente nunca vi um terreno baixar de
preço. Um exemplo típico são as operações urbanas, em que se cobra um custo bastante
elevado para modificar o índice e nem por isso os preços deixam de subir, e muito. Os
terrenos na Faria Lima, por exemplo, se elevaram de 300% a 400% nos últimos anos.
WILHEIM Não concordo inteiramente com essa visão. É claro que o impacto
emocional sempre existe, mas depende muito da transparência dos procedimentos e da
capacidade nossa de divulgar o que vai ou não acontecer. Na realidade, não limitamos o
plano à extinção da Lei de Adiron, que de fato traria o efeito mencionado, porque não
ficaria transparente nosso desejo de que a indústria da construção civil continue
dinâmica. Queremos estimulá-la, não diminuí-la. Só que de uma forma mais dispersa e
menos concentrada.
Quanto às Z-3 e Z-4, em que realmente existe uma diminuição do coeficiente, são
aquelas áreas em que de fato ocorre uma perda, por assim dizer, legal, feita através da
lei. Pensamos em atenuar o efeito restritivo concedendo a esses terrenos uma carência de
mais seis meses antes da entrada em vigor da lei, a fim de que seus proprietários possam
ajeitar melhor seus interesses nesse tempo.
REGINA MONTEIRO Dentre os grandes problemas citados, enchente e trânsito,
faltou a habitação. Temos cerca de 5,5 milhões de pessoas morando de forma inadequada,
entre cortiços, favelas e loteamentos clandestinos. Mas a questão dos instrumentos foi
bem colocada. Tenho a mesma preocupação de Botti em relação ao mercado imobiliário
mas penso que o solo criado, que defendemos há muito tempo, está bem colocado. Na
proposta posterior, que é a lei de zoneamento, acredito que essas questões poderão ser
corrigidas. Complementarmente, poderemos ver quais são esses 3% e fazer os acertos.
Quanto à gestão desse plano, sempre falei que o secretário de Planejamento deve ser um
supersecretário, talvez um gerente de cidades, porque hoje ele trabalha isoladamente, sem
ligação com as outras secretarias. Vejam, por exemplo, as anistias que são concedidas e
outras iniciativas que põem abaixo toda essa proposta, que é muito boa. De forma geral
temos de apoiar esse plano diretor.
ROBERTO PENTEADO Em relação aos espaços e terrenos impermeabilizados pelas construções, acrescento um detalhe: o lençol freático também foi esgotado em parte, principalmente na região da Paulista, devido à altitude mais elevada. Alguns prédios utilizam o subsolo em vários pisos para instalar garagens. Com isso, a água é sugada, os canais ficam secos e por vezes ocorrem fortes abalos dos edifícios devido ao assentamento de terra. Outro detalhe dessa região é a necessidade de avaliar e medir a energia das torres de transmissão. Existe um trabalho que comprova a existência nessa área de uma potência 15 a 20 vezes superior à média norte-americana, que é de 1µW/cm2.
WILHEIM Essa contribuição é interessante. De fato discute-se muito a
permissão para a construção de garagens, se pode ocupar o espaço até a divisa do
terreno. Muitos de nós mesmos, quando projetamos, detestamos deixar um recuo lateral, que
obriga a fazer mais andares. Mas a verdade é que acabamos influindo no lençol freático.
Mesmo na Avenida Paulista, que fica em um espigão, o lençol freático faz coisas do
arco-da-velha, e o solo é completamente desigual de um lote para outro.
Quanto às torres, recebemos laudos técnico-científicos de autoridades que não podemos
questionar, e que são opostos às suas conclusões. Quando iniciamos nossa atual gestão,
interrompemos o processo de aprovação das torres de telefonia celular porque havia 1,5
mil pedidos, ficaria um paliteiro. Exigimos da Agência Nacional de Telecomunicações
(Anatel) que nos informasse se as antenas não podiam ser compartilhadas, isto é, se não
seria possível colocar mais de uma numa única torre, e também para esclarecer a
suspeita de que a radiação era prejudicial à saúde humana. A Anatel levou muito tempo
para responder às duas questões. No aspecto sobre saúde, apresentou uma pesquisa
internacional, feita por cientistas da Suíça, e o relatório mostrava que não havia
dano nenhum, nem de longe. Por outro lado, recebemos um laudo de uma organização
não-governamental, que fornece dados contrários. Na Secretaria de Planejamento não
temos como dirimir essa dúvida científica. Mandamos para a da Saúde, que também não
tem recursos imediatos ou conhecimento para isso. A questão não está fechada, está
sendo analisada.
JOSEF BARAT Vejo em São Paulo dois processos simultâneos. Um é o de mudança de função da cidade, que já foi industrial e hoje é de serviços. O segundo é uma degradação muito grande que eu até associaria a certa decadência econômica, embora sem a intensidade que houve no Rio de Janeiro, por exemplo. Nesse processo de globalização, o que está em jogo é a competitividade das metrópoles mundiais. Observa-se, na Europa principalmente, uma profunda preocupação em equipar as cidades para absorver sedes de centros de decisão, numa grande competição. E aí se joga com qualidade de vida, melhoria de condições ambientais, instalação de centros culturais e de lazer, enfim, é a oferta de serviços e de bens públicos que torna as cidades mais competitivas. Pergunto: São Paulo tem condições de ser uma metrópole mundial ou, se prosseguir nesse processo de decadência e de deterioração, terá como acompanhar a concorrência em escala mundial?
WILHEIM A pergunta é muito pertinente. Claro que São Paulo é hoje uma das
grandes cidades globais, o que é comprovado pelo interesse de empresas, pelo turismo de
negócios, etc. Tudo se concentra em São Paulo. Portanto, já há uma escala e uma
qualidade suficientes em alguns aspectos para torná-la atraente sob o ponto de vista
global. Entre outras coisas, o padrão de atendimento médico, quando se pode pagar por
ele, é muito elevado, bem como o nível cultural. É uma cidade que tem seis orquestras
sinfônicas e uma mão-de-obra que se adapta com grande facilidade às alterações. Os
empresários industriais sabem disso. Acredito inclusive que São Paulo terá um
ressurgimento industrial, não com as características de antigamente, mas com as deste
século 21, com pequeno espaço e grande valor agregado.
A competitividade pode ser prejudicada, sim. Primeiro, se seguirmos sem nenhum tipo de
planejamento, se continuarmos a fazer investimentos excessivamente concentrados em locais
que depois entram em decadência. Também teremos problemas se o governo federal não
ajudar a melhorar a infra-estrutura, porque esta cidade é um dos grandes trunfos que o
país tem na escala mundial. É inaceitável, por exemplo, que a União não invista no
metrô de São Paulo. Nós começamos no mesmo ano que o México, com projetos parecidos,
de 140 quilômetros, porque o tamanho das cidades é semelhante. A cidade do México tem
100, São Paulo 47. Por quê? Porque mesmo com investimento do estado os recursos são
insuficientes para poder construir as linhas. De maneira que é urgente que o governo
federal assuma São Paulo. Se não melhorar a segurança, o transporte público e não
aliviar um pouco o pagamento da dívida, a fim de permitir a São Paulo receber
empréstimos que lhe são oferecidos, estará dando um tiro no pé.
BARAT Para complementar a pergunta, existe alguma estratégia, algum plano da prefeitura que vise buscar especializações, para tornar São Paulo competitiva? Por exemplo, alta tecnologia, pesquisa de ponta para indústria, porque há grande potencial para isso.
WILHEIM Sem dúvida, há. E isso poderia ocorrer até espontaneamente, razão pela qual as empresas estrangeiras buscam São Paulo em primeiro lugar. Do ponto de vista da prefeitura, o que existe é uma grande preocupação com o emprego, especialmente em certas localidades, a zona leste, por exemplo. Estamos pensando em levar para lá uma experiência que o professor Paul Singer está fazendo na Universidade de São Paulo (USP), a dos embriões industriais, e criar condições para uma expansão maior dessas atividades.
MÁRIO AMATO Parece-me importante ressaltar o lado humano. Fui presidente da
Cohab e nossa preocupação era reaproveitar bairros antigos para fazer habitações,
transformá-las num tipo de moradia mais coletiva, mas com dignidade, além de oferecer
também esporte, lazer e cultura.
Para finalizar, uma pergunta: os dirigentes da área de planejamento não deveriam exercer
um cargo efetivo e independente que lhes permitisse dar prosseguimento às obras? Aqui
quem começa nunca termina.
WILHEIM Desde 1975, o maior fator de crescimento da população de São Paulo
não é migratório e sim vegetativo. A migração ainda vem para a periferia, mas é
muito diminuta por diversas razões: primeiro porque é muito caro migrar, segundo porque
já existe um pouco mais de emprego no nordeste e em Minas Gerais, e em terceiro lugar
porque somos um país que tem ainda uma fronteira agrícola que está sendo aberta. A
previsão que temos no plano, feita pela Fundação Seade (Sistema Estadual de Análise de
Dados), é que dos 10,4 milhões de habitantes em 1990 a cidade venha a atingir, em 2010,
11,4 milhões. É um aumento de 1 milhão em dez anos, o que é relativamente aceitável,
e existe uma tendência de diminuição. Além disso, São Paulo é o centro de uma
macrometrópole que abrange a região metropolitana de Campinas, Sorocaba, Baixada
Santista e parte do vale do Paraíba. A quantidade de pessoas que usam a cidade de São
Paulo fisicamente, vindo de fora, é de mais de 1 milhão por dia.
Quanto à continuidade, tentamos criar uma lei que tenha objetivos de longo prazo. Longo
prazo são dez anos. Depois disso será preciso uma revisão. Daqui a três anos uma nova
administração poderá conferir, adotar as mesmas ações estratégicas atuais ou
modificar esta ou aquela. Quanto à parte cultural não a citei, mas nas ações
estratégicas e políticas setoriais do plano há um leque grande de iniciativas, muito
ligadas ao desenvolvimento. Não há crescimento sem ampliação da cultura e da ciência,
da tecnologia e da pesquisa. Então isso está muito enfatizado nas políticas setoriais.
JACQUES MARCOVITCH Minha pergunta se refere à questão demográfica. A cidade evolui em torno de algumas especializações. Penso que a área de ensino é uma vocação de São Paulo hoje. O pólo na região do Butantã, com o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), o próprio Instituto Butantã e a USP, constitui hoje uma das concentrações mais densas na América Latina de pesquisadores por metro quadrado. Quando se fala em crescimento explosivo da população num período de 20 anos, isso mostra que ao longo dos últimos cem anos a cada 25 anos tivemos de reconstruir a cidade. Começamos, no estado, com 2 milhões de habitantes, estamos hoje com 37 milhões e vamos para 45 milhões. No caso da cidade deve ter ocorrido uma evolução semelhante. A presença maior de população, seja pela via vegetativa ou pela migratória, foi fazendo com que estivéssemos sempre aquém das necessidades. Isso muda nos próximos 20 anos, na medida em que nesse período se estima que haverá um acréscimo de apenas mais 1 milhão de pessoas. Mas minha pergunta tem a ver com a mudança do perfil etário dessa população. As projeções da Fundação Seade mostram que no momento as pessoas acima de 60 anos correspondem a 5% da população, mas esse índice passa para 20% dentro de 20 anos. Como o plano leva em conta essa mudança do perfil tanto das faixas etárias como também da localização das pessoas na cidade?
WILHEIM A observação é pertinente. O plano diretor talvez não aborde isso suficientemente, embora mencione esses dados todos. Mas existem alguns aspectos que poderão auxiliar essa mudança de perfil. Ao defendermos maior mistura de atividades, a fim de que o domicílio fique perto não só do local de trabalho como do de abastecimento, cultura, lazer, tornamos as distâncias menores. Embora isso beneficie toda a população, é claro que os mais idosos são ainda mais favorecidos. O plano diretor dispõe também sobre a obrigação da acessibilidade universal, o que significa alteração dos meios de transporte, do desenho de calçadas, dos acessos a edifícios públicos e privados.
MALCOLM FOREST Estamos padecendo de um fenômeno chamado tempestades
magnéticas, que são as chuvas de granizo que vêm ocorrendo pontualmente na cidade por
causa, ao que tudo indica, das ilhas de calor, um fenômeno estudado pela professora Magda
Lombardo, da USP. Certas regiões de São Paulo se superaquecem, há formação de nuvens
sobre a serra da Cantareira e a do Mar, onde existe vegetação mais densa, as nuvens se
deslocam pela força de atração dos centros de calor e se precipitam de forma muito
forte, causando graves problemas para a população. Temos um dos piores índices de
áreas verdes por habitante. E o número de óbitos por problemas cardiovasculares e
respiratórios, principalmente no inverno, quando a inversão térmica é mais freqüente,
é muito alto.
O professor Aziz Nacib AbSáber fala sempre que São Paulo está sob três cúpulas
de poluição, que vão se deslocando para a região da Cantareira, segundo ele uma das
áreas que têm pior clima hoje. Esses domos vêm de Cubatão, na Baixada Santista, e a
poluição formada ali junta-se pela ação dos ventos que sopram do oceano para São
Paulo a uma outra da região do ABC, da zona sul e da industrial. No centro da capital
recebem outra carga de poluição, e esses três conjuntos vão para a serra da
Cantareira, que tem a função de fazer a despoluição.
Há um estudo de um médico cardiologista, também da USP, que prova que a expectativa de
vida do paulistano está reduzida em cinco anos por comprometimento do músculo cardíaco.
Isso sem falar em apagão e seca que vêm por aí. Parece um quadro muito pessimista, mas
são dados da realidade. Existem outros fatos positivos acontecendo, mas a perspectiva é
muito incerta neste momento.
Então gostaria de pedir ao senhor que no plano diretor se considerasse a requalificação
do paradigma do verde. Perdoem-me os arquitetos e engenheiros, mas temos de pensar na
qualidade de vida. São Paulo sofreu uma grande intervenção, em 1890, quando ainda era
uma localidade com 50 mil almas, que foi a desapropriação da Cantareira, cerca de 80
quilômetros quadrados de uma antiga propriedade jesuítica, a Fazenda Santana, para se
criar um reservatório de água para uma metrópole que ainda não existia. Desde então
não ocorreu nada semelhante, e temos hoje uma população de 11 milhões de pessoas.
WILHEIM Sobre o tema das áreas verdes, de fato, quando falei na questão
ambiental no plano diretor me detive muito na drenagem e não descrevi o que o projeto
prevê como salvação dos córregos que ainda não estão canalizados. Existe uma parte
que é chamada de caminhos verdes, uma seleção dos principais córregos, cerca de 50,
que provocam enchentes, estão cercados por moradias, favelas em grande parte, e para os
quais há uma programação. O projeto implica a conservação do córrego, em parques
lineares ao longo dele, e uma solução da parte habitacional, oferecendo inclusive
benefícios a quem construir e mantiver o parque linear, através de ligeiro aumento do
coeficiente de aproveitamento. Estamos novamente tentando fazer uma parceria, com o
objetivo em primeiro lugar de desocupar e depois de manter o verde e esses córregos a
céu aberto.
Além disso, a Secretaria Municipal do Meio Ambiente prevê cerca de 20 parques novos. Na
realidade, não temos muitas áreas para isso, porque foram todas ocupadas por favelas.
Precisamos ou recuperá-las ou desapropriar outras, e aí o custo é alto. A secretária
Estela Goldstein tem conseguido algum sucesso com parcerias generosas de empresas que
decidem manter ou financiar a implantação e manutenção deste ou daquele parque. Mas
uma das dificuldades que ela tem é que todo mundo só quer investir no Ibirapuera. Há
também outro problema relacionado ao plantio de árvores, a arborização em si, que tem
um gargalo importante. Não temos viveiros suficientes para plantar 1 milhão de árvores
ou mais. Trata-se de estabelecer e isso será feito uma política de
estímulo a viveiristas para produzir e vender mudas. E a prefeitura vai criar um mercado
comprador de mudas. Essa é a política que está prevista no plano.
ARY ALBANO Nessa questão de permeabilidade do solo pela primeira vez um plano
diretor contempla os anseios dos ambientalistas. Está muito bem feito. Já em relação
à zona norte, creio que houve um esquecimento, talvez dos técnicos que você encontrou
na secretaria. O primeiro zoneamento daquela região foi feito em 1971. Tivemos uma
correção em 1978. Toda a zona norte, junto à Cantareira, tinha sido classificada como
Z-2, um absurdo. Minha proposta, quanto às faixas de proteção que vocês prevêem, de
200 metros e depois área não-edificante de 300, é que se faça o mesmo com relação à
reserva estadual, porque há loteamentos sendo aprovados junto à reserva. É uma falha da
prefeitura, porque existe até uma legislação federal, o Código Florestal, que não
está sendo observada. Assim, ao lado da Cantareira estão surgindo assentamentos
populares, invasões como na Vila Albertina, o chamado Morro do Piolho, e numa fazenda
chamada Santa Maria. Esse local tem os vestígios do antigo sistema de abastecimento de
água, que ainda corre dentro dele.
Outra questão é estrutural, e diz respeito às vias de acesso do sistema viário da
Cantareira que não foram jamais concluídas, como as avenidas Luís Dumont Villares e
Caetano Álvares. Há um gargalo na região. O plano não contempla essas vias, que não
foram concluídas.
WILHEIM Concordo com o que foi dito. Existem previsões de ligações no sistema viário, tentando aproximar os bairros que só têm saídas para a Marginal. Quanto à proteção da reserva, vou verificar melhor o que está faltando no plano.