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Bem me quero

Imagem: Pixabay
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Cuidado é, sem dúvida, uma das palavras mais pronunciadas e escritas desde março de 2020. Mas o que ela realmente significa e como aplicá-la em nossa vida? Segundo a fábula-mito do cuidado essencial, também conhecida como fábula de Higino — referência ao nome do pensador Gaius Julius Hyginus, da Roma Antiga —, o ser humano foi moldado pelo cuidado. “Certo dia, ao atravessar um rio, Cuidado viu um pedaço de barro. Logo teve uma ideia inspirada. Tomou um pouco do barro e começou a dar-lhe forma”, descreveu o filósofo Leonardo Boff no livro Saber Cuidar (Vozes, 1999). Na fábula, Cuidado pede ajuda a Júpiter, que sopra espírito no barro e, por isso, quer dar nome à criação. Quem também reivindica a autoria da obra é a Terra, que deu a Cuidado a matéria-prima necessária. Até que Saturno, como árbitro, resolve encerrar a discussão batizando a “escultura” de Homem, nome derivado da palavra húmus, que significa terra fértil, incumbindo Cuidado de zelar pela vida da criatura. Ou seja, “a fábula termina enfatizando que cuidado acompanhará o ser humano ao largo de toda a sua vida”, analisou Boff.

Sob esse ponto de vista, o cuidado é considerado uma característica inerente ao ser humano. E, segundo o professor do Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo (USP) Franklin Leopoldo e Silva, ele precisa estar voltado ao que é realmente necessário à humanidade. “Há pessoas que ainda têm a ilusão de que cuidar da exterioridade, do trabalho, do celular, de coisas que são úteis à vida, mas não essenciais, significa cuidar de si mesmo. Quando elas perceberem que cuidaram demais dessas coisas e não de si pode ser tarde demais”, alerta.

Nossa sobrevivência e a preservação de todo tipo de vida ao nosso redor dependem do ato de cuidar, algo que se manifesta de diferentes maneiras. Uma delas é reforçada por especialistas da área da saúde principalmente neste período de restrição social: atividade física. Seja em casa ou em locais abertos (seguindo todas as recomendações dos órgãos de saúde), caminhar, dançar, fazer ginástica, yoga ou outras práticas geram benefícios ao corpo (por exemplo, a prevenção de doenças crônicas não transmissíveis como diabetes tipo 2 e doenças cardiovasculares) e à mente (por exemplo, a prevenção de quadros de ansiedade e depressão), promovendo ainda disposição, concentração e bem-estar.  

A busca pela manutenção de uma vida saudável inclui atitudes que afetam aspectos biológicos, psíquicos e sociais do ser humano. Por isso, os cuidados devem começar por esta “casa” onde habitamos. Para a professora e pesquisadora inglesa Margaret Whitehead, do Centro Colaborador da Organização Mundial de Saúde (OMS) para Pesquisa Política sobre os Determinantes Sociais da Saúde, “está claro que não existe nenhuma separação entre nossa natureza corporal e nossa natureza afetiva; somos todos uma coisa”, disse em entrevista à Revista E (leia aqui).

E se você pensou: “Isso não é para mim”, unindo-se a uma vasta camada da população brasileira que não acredita estar apta à prática de qualquer tipo de exercício físico, que tal reavaliar essa ideia? Afinal, “não existe comparação e você não irá fracassar porque ninguém é melhor ou pior que ninguém”, ressaltou Whitehead. “Você está no seu próprio percurso e pode obter progressos o tempo todo.”

 

Atividades físicas, alongamentos e outras práticas corporais preservam nossa saúde física e mental | Foto: Pixabay

 

 

Prática diária

A OMS apontou uma nova orientação quanto ao tempo dedicado à atividade física em novembro passado. Uma das principais razões para a mudança é o aumento do índice de sedentarismo na sociedade mesmo antes da necessidade de isolamento doméstico. No Brasil, de acordo com dados da Pesquisa Nacional de Saúde 2019, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no mesmo mês, 40,3% da população de 18 anos ou mais de idade não praticou atividade física ou praticou por menos tempo do que o indicado. Atualmente, a recomendação da OMS para a população de adultos é de 150 a 300 minutos por semana de atividade física moderada, ou de 75 a 150 minutos por semana de atividade física intensa.

“A atividade física deixou de ser conceituada ou definida como uma atividade que promove um gasto energético. Ela é muito mais. E nesse momento de pandemia é que a gente consegue visualizar isso”, disse o professor do Departamento de Medicina Preventiva da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp) Leandro Rezende. Não importa se você é do tipo que caminha ou corre, o especialista explica que ambas as atividades (moderada e vigorosa) estão associadas à menor mortalidade por doenças cardiovasculares e câncer, por exemplo.

A constatação é um dos resultados obtidos por um estudo coordenado pela EPM-Unifesp em parceria com a Universidade de Wuhan (China), a Universidade de Santiago do Chile (Chile) e a Universidade Europeia Miguel de Cervantes (Espanha), realizado com quase meio milhão de pessoas. “A pesquisa não reflete a atividade física no âmbito da pandemia, mas esses efeitos sobre a saúde são esperados em qualquer outro momento”, destaca o professor, que coordenou a pesquisa. Outro resultado obtido é de que adultos que realizaram de 50% a 75% do total de atividade física semanal em intensidade vigorosa tiveram uma redução de 17% na mortalidade por todas as causas, quando comparados aos adultos que realizaram apenas atividades físicas de intensidade moderada. 

“Tentando trazer os resultados para o dia de hoje, estamos num contexto em que, na verdade, a atividade física intensa não é muito acessível uma vez que a maior parte das atividades físicas vigorosas são relacionadas a, por exemplo, atividades fora de casa ou em equipe, como práticas esportivas, ou mesmo em academia, o que, teoricamente, aumenta o risco de infecção pela Covid-19”, pondera. Nesse contexto, o especialista aconselha seguir as recomendações da OMS para atividades moderadas.

 

De si para outros

Para além de cultivar corpo e mente sãos, há outras formas de regar esse bem-estar consigo e, consequentemente, com aqueles ao redor. Pode ser o preparo de uma refeição nutritiva e prazerosa para desfrutar sem pressa à mesa; a contemplação de um pôr do sol da janela; ler aquele livro há meses guardado; assistir a um filme que estava na sua lista; colocar sua música favorita para tocar (leia Pequenas ações, grandes mudanças); ou reservar alguns minutos do dia para meditar.

Este ano nos trouxe um exemplo muito importante sobre o diálogo entre o cuidar de si e do outro ao mesmo tempo. O uso da máscara se tornou um símbolo de proteção e de coletividade, classificada pelos órgãos de saúde como importante instrumento para diminuir as taxas de transmissão do novo coronavírus. “Há um lado egoísta que esse cuidado de si pode trazer, e para prevenir esse lado tradicional na nossa cultura é que se constituiu uma nova forma de pensar, contemporânea, que é: eu me constituo a partir do outro e portanto eu constituo o cuidado de mim mesmo a partir do cuidado que eu tenho com o outro”, conclui o professor Franklin Leopoldo e Silva.

 

Reservar uma hora do seu dia para ler um livro é um hábito enriquecedor e sem restrições | Foto: Pixabay

 

 

Pequenas ações, grandes mudanças

ESCOLHAS CONSCIENTES, EQUILIBRADAS E PRAZEROSAS PARA CULTIVAR

Algumas atitudes incorporadas ao dia a dia são responsáveis por mudanças positivas para toda a vida. Confira algumas sugestões:

Tá no prato

 

O que você escolhe ingerir tem impacto direto na sua saúde física e mental. Uma alimentação baseada em alimentos frescos, saudáveis, e no lema “descasque mais e desembale menos”, traz benefícios à memória, concentração, fortalecimento do sistema imunológico e prevenção de doenças. Que tal aproveitar esse momento de preparo da refeição com uma seleção musical ou podcast de que você gosta? Depois, basta sentar-se à mesa e desfrutar do café da manhã, almoço ou jantar.

 

Ajuste seu relógio

 

O trabalho remoto está sendo responsável por um desequilíbrio entre horas de produtividade e de descanso. Uma forma de cuidar do momento de repouso para repor energias e revigorar corpo e mente é desligar ou colocar o aparelho de telefone em modo avião antes de se deitar. Adote, também, uma rotina de horário para ligar e desligar o computador e outras telas. Tente encerrar o expediente, seja ele dentro ou fora de casa, no mesmo horário. E crie rituais de relaxamento como tomar um banho ou meditar antes de dormir.

 

Encontro marcado

 

Ainda que não seja possível se reunir com amigos e familiares da mesma maneira que antes da pandemia, a interação com outras pessoas é de extrema importância para a saúde mental. Cuide de suas relações. Programe um jantar ou conversa por aplicativos de videochamadas, converse pelo telefone, mande mensagens e compartilhe o que você está sentindo, lendo, pensando ou assistindo.

 

Fruição cultural

 

Um livro, uma música, um espetáculo. Diferentes expressões da arte podem nos transportar para novos cenários e perspectivas. E são muitas as opções de leitura, álbuns e apresentações disponíveis nas plataformas digitais. Crie um momento no seu dia para ler algumas páginas do livro que você deixou na gaveta; ouça um podcast ou músicas de que gosta, assista a um filme indicado por um amigo. 

 

Dentro e fora

ATIVIDADES, APRESENTAÇÕES, DEBATES E OUTRAS AÇÕES FOMENTAM O CUIDADO INDIVIDUAL E COLETIVO

A Sociedade teve que aprender outra forma de ser, agir e se relacionar desde março do ano passado. Com isso, emergiu a necessidade da prática de diferentes expressões do cuidado. Por isso, a 26ª edição do Sesc Verão pretende levar ao público a mensagem: Cuidar faz bem. Realizada desde 1995, essa campanha do Sesc São Paulo tem como pressupostos o incentivo à inserção da prática regular de atividades físicas e esportivas no dia a dia das pessoas e a difusão da cultura esportiva.

 

“Abre-se um grande leque de possibilidades de informação e sensibilização do público, colocando o Sesc como uma instituição que fornece ferramentas para lidar com os riscos que se evidenciaram”, explica Júlio César Pereira, assistente técnico da Gerência de Desenvolvimento Físico-Esportivo do Sesc. Dentre algumas, exemplifica, “cuidar de si a partir de um cotidiano de hábitos saudáveis, praticando o autocuidado, repensar hábitos de consumo, de alimentação, de deslocamento, interagindo com a tecnologia em limites adequados, investindo tempo em atividades culturais e que ajudam na preservação da saúde mental, em momentos de fruição e convívio – tudo isso se insere numa perspectiva de cuidado expandido para a coletividade.”

De 16 de janeiro a 14 de fevereiro, o público poderá acessar e participar da programação disponível no portal, redes sociais e plataformas digitais do Sesc São Paulo. Acompanhe pelo site: www.sescsp.org.br/sescverao.

Confira também treinos de atividades físicas, práticas esportivas e meditação, além de dicas de alimentação, apresentações musicais e teatrais, filmes e documentários nas redes sociais do Sesc São Paulo, na plataforma Sesc Digital, no canal do YouTube e no portal do Sesc São Paulo.

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