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Editoria de Arte / Imagens: Reprodução
Editoria de Arte / Imagens: Reprodução

INTERAÇÃO COM PESSOAS EM SITUAÇÃO DE REFÚGIO DERRUBA PRECONCEITOS E PROMOVE CONHECIMENTO

 

No mundo, 79,5 milhões de pessoas estão fora de seu país de origem devido a temores de perseguição relacionados a questões de raça, religião, nacionalidade, pertencimento a um determinado grupo social, opinião política ou à grave e generalizada violação de direitos humanos e conflitos armados, segundo dados da Agência da Organização das Nações Unidas (ONU) para os Refugiados (Acnur). No Brasil, esse total corresponde a 11.231 pessoas, segundo levantamento divulgado pelo Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) em 2018, mas a quantidade de solicitações de refúgio no país ultrapassa 80 mil.

No atual contexto de pandemia, em São Paulo, terceiro estado brasileiro que mais recebe solicitações, essa parcela da população se encontra ainda mais vulnerável, principalmente as crianças. Por isso, iniciativas que promovam adaptação e socialização são essenciais a fim de derrubar preconceitos e fomentar oportunidades. “A Covid-19 levou a um aumento da xenofobia, do racismo, da estigmatização e da discriminação. Por conta disso, é importante destacar os benefícios e a determinação que as pessoas refugiadas trazem ao país de acolhida: tornam a economia mais dinâmica, dedicam-se com mais afinco ao trabalho, trazem conhecimento e know how, bem como interesse e plena determinação em contribuir com o país”, contextualiza Miguel Pachioni, assessor de Comunicação da Acnur.

Outro ponto levantado por Pachioni é o ganho no ambiente educacional. Nas escolas, questões como idioma e costumes podem ser consideradas dentro e fora de sala de aula, e, com isso, aumentam as chances de interação, adaptação e perspectivas das crianças refugiadas e de suas famílias no novo país. “É preciso que a gente consiga entender, pela ótica de uma educação humanitarista e sensível, que essas pessoas vêm para agregar. De que a cultura e diferentes aprendizados vêm para somar e não subtrair numa sala de aula”, reforça. “E mesmo em um contexto de recreio, de lazer, que a gente consiga fortalecer a questão da sociabilidade entre as crianças, porque muito se ganha com as trocas na prática.”

Tendo em vista todo esse potencial de interação, o projeto Refúgios Humanos, realizado pelo Sesc São Paulo desde 2016, com apoio e participação da Acnur, promove o protagonismo das pessoas em situação de refúgio na capital paulista. Nesse projeto, são elas que compartilham suas vivências na formação de professores da rede pública do ensino fundamental de diferentes regiões de São Paulo para acolhimento de alunas e alunos refugiados matriculados.

A ação, que tem a parceria da Secretaria Municipal de Educação, sensibiliza e informa tanto os educadores quanto outros profissionais da escola para que possam considerar na acolhida as perspectivas das crianças de outras nacionalidades.

 

Lugar de fala

O professor congolês Patrick Kasonga, que mora no Brasil há 17 anos, viveu na capital paulista de 2003 a 2008, e em 2009 se mudou com a família para Juiz de Fora (MG), já participou do Refúgios Humanos, na formação de 250 professores das Diretorias Regionais de Educação (DREs) São Mateus, São Miguel, Guaianazes e Itaquera. “Meu objetivo foi sensibilizar e mostrar que não somos números nem categoria, mas várias identidades. Alguém que tem um nome e que deve ser chamado pelo seu nome”, conta. “Insisti também que os professores precisam saber que são pessoas que carregam mágoas, que praticamente nascem de novo num outro país, onde aprendem uma outra língua e outro modo de se expressar.”

Kasonga lembra o momento em que seu filho, aluno na faculdade de História da Universidade Federal de Juiz de Fora, tinha 5 anos. Naquela época, ao entrar na escola, o garoto logo assimilou o novo idioma. No entanto, os professores desconheciam sua cultura e faziam-lhe perguntas preconceituosas como: Você usava roupa no seu país? Você convivia com elefantes? “Uma vez fui convidado para um lugar e me pediram fotos. Levei algumas e me perguntaram por que eu não usava roupa africana. Como assim?”, recorda. “Ou seja, as pessoas precisam aprender como é o mundo e que ele está além do que se mostra na televisão. Fora da fantasia que se coloca.”

A vantagem de ouvir em primeira pessoa as vivências de alguém em situação de refúgio é, segundo observa Miguel Pachioni, da Acnur, “de extrema importância”. Isso faz com que os professores da rede municipal possam atentar a essa perspectiva, porque as crianças refugiadas estão chegando às escolas. “Se no início havia esse entrave da documentação para esse acesso das crianças ao ensino, nesse segundo momento, quando elas já ingressaram nas escolas, precisamos de mecanismos de sociabilidade para que elas estejam efetivamente integradas e que todo aquele elemento histórico de xenofobia, estigmatização e discriminação não seja perpetuado”, complementa.

 

Na sala de aula

Do ponto de vista dos professores que participam dessa formação, o projeto é uma ferramenta valiosa para compreender e acolher um grande número de estudantes em situação de refúgio. A historiadora e pedagoga Ana Regina Barbosa Spinardi, assistente técnico de Educação I na Diretoria Regional de Educação (DRE) Itaquera, que atua principalmente na Frente da Educação para relações Étnico-Raciais, já participou de duas edições do Refúgios Humanos. A primeira foi em 2019 e a segunda, neste ano, numa parceria entre DREs Itaquera, Guaianases, São Miguel, São Mateus, Ipiranga e Penha, teve um total de 300 professores cursistas. “Aprendi muito sobre o que é fugir de um território inóspito, deixar sua pátria mãe e chegar a um lugar como sujeito histórico, com outras barreiras. Então, primeiramente, devemos acolher a criança, a/o estudante, mostrar o ambiente da escola – a cozinha, a quadra de esporte, o pátio etc. – para depois dialogar sobre a barreira linguística. Entendo que não é só o desafio de aprender outro idioma, mas saber a história dessa criança, apresentar leituras a ela e deixar que ela me apresente novas leituras. Percebi que esse curso é obrigatório”, afirma.

Por isso, Spinardi observa e destaca o grande interesse e número de inscritos nessa formação. “Posso dizer sobre meu desejo: que esse curso proporcione outros diálogos, que se amplie e nos traga repertórios para termos grandes chances de aprender e de avançar desconstruindo diversos estereótipos dentro do ambiente escolar”, finaliza.

 

A Orquestra Mundana Refugi, composta por músicos vindos da Síria, Palestina, Congo, Guiné, Irã, França, China, Tunísia, Turquia, Cuba e Brasil, idealizada pelo Sesc São Paulo e pelo maestro Carlinhos Antunes, se concretizou a partir de oficinas musicais para imigrantes refugiados no Sesc Consolação em 2017, e segue expressando a possibilidade real de harmonia entre as diferenças. O Selo Sesc produziu o álbum de estreia do grupo, que está disponível nas plataformas digitais
 

 

Rede Municipal de Ensino

(São Paulo - 2020)

7.325 estudantes imigrantes

98 nacionalidades da África, Ásia, Europa, América, Oceania e Antártida

(Fonte: Secretaria Municipal de Educação da Prefeitura de São Paulo)

 

 

Lá e cá

CURSOS E ATIVIDADES ABORDAM A QUESTÃO DO REFÚGIO

Tendo em vista um expressivo aumento de solicitações de refúgio no Brasil – o número cresceu  2.868% entre 2010 e 2015, de acordo com o relatório do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) –, o Sesc São Paulo diversifica a presença desse público e do tema do refúgio em atividades culturais e socioeducativas em toda a rede, reforçando a ideia de que os equipamentos do Sesc são espaços de convivência nos quais as pessoas em situação de refúgio são bem-vindas.

Há 25 anos, o Sesc oferece o Curso de Português para Refugiados em parceria com o Senac (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial), a Acnur e a Cáritas Arquidiocesana de São Paulo. Além das noções básicas, o curso aborda hábitos e costumes da cultura brasileira para pessoas refugiadas e solicitantes de refúgio, e é oferecido, gratuitamente, ao longo do ano, em oito unidades: Vila Mariana, Consolação, Carmo, Bom Retiro, Pompeia, 24 de Maio, Osasco e Campinas. Somente nos últimos dois anos, já foram atendidas mais de 18 mil pessoas.

Além desse curso, desde 2016, o projeto Refúgios Humanos, em parceria com o Núcleo de Educação para as Relações Étnico-Raciais da Secretaria Municipal de Educação (SME), tira a pessoa em situação de refúgio da cadeira do aluno para o lugar de professor. São eles que ministram a formação de docentes das Diretorias Regionais de Educação (DREs), compartilhando experiências e perspectivas.

“Tendo a diversidade cultural como um valor, o Sesc São Paulo desenvolve atividades que promovem e reconhecem identidades culturais de diferentes origens. Trata-se de considerar a migração como um direito e, a partir desse entendimento, saber que a descoberta de um novo lugar, um outro idioma e de outras relações pode ser parte da história de qualquer pessoa. A ideia que permeia essas programações é ser um convite constante para superar preconceitos e ampliar perspectivas de viver”, explica Ioná Damiana de Souza, assistente da Gerência de Estudos e Programas Sociais do Sesc.

Conheça outras ações no site Culturas em Trânsito – Refúgio e Migração no portal do Sesc São Paulo:

 

PRIMEIRA PESSOA

Realizada durante a pandemia, a série de vídeos Histórias de Refúgio traz o relato de pessoas em situação de refúgio e imigrantes residentes no Brasil contando suas histórias de vida e as situações que os obrigaram a deixar o país de origem. São depoimentos sobre abandono, família, cultura e outros elementos que hoje residem em memórias afetivas. Assista: www.sescsp.org.br/online/artigo/14466_HISTORIAS+DE+REFUGIO

 

          “Sinto saudades da minha família e do cheiro da minha cidade” Sameh Brglah, refugiado da Síria – Histórias de Refúgio
 
 
     “Hoje eu tenho um quintal onde as crianças podem brincar” Sylvie Mutiene, refugiada da República Democrática  do Congo – Histórias de Refúgio

 

 

SESC IDEIAS

A Questão do Refúgio no Contexto da Pandemia foi tema do Sesc Ideias, com a participação de Carlos Daniel Escalona Barroso, jornalista pela Universidade Bicentenária de Aragua (UBA), de Caracas (Venezuela), que vive em situação de refúgio no Brasil; de Camila Sombra, associada de Soluções Duradouras do Escritório da Acnur em São Paulo e doutora em Direitos Humanos pela Universidade de São Paulo (USP); e Victor Del Vecchio, advogado e mestrando pela USP, que atuou como consultor jurídico da ONU Migração (OIM). No debate, questões centrais que dizem respeito aos refugiados no contexto da Covid-19 no Brasil, desafios e projeções. Assista no canal do YouTube do Sesc São Paulo.

 

 

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