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Mas o que fica?
Por André Luís*
Nestes dias de distanciamento social me permiti pensar. Não que eu me desautorizasse em outra época, mas neste momento, em que as ações do dia a dia são tão diferentes do que “era comum”, tive a possibilidade de dar liberdade ao pensamento. Alguns poderão dizer que o pensar é livre e, romanticamente, que ele não tem amarras. Durante este período, tive a percepção de que os meus pensamentos estão amarrados ao meu modelo de vida. Que são norteados a partir do que eu realmente vivo.
Confuso? Vou tentar esclarecer com um exemplo.
Digamos que eu consiga ter uma noite espetacular. Consiga sair para jantar em um restaurante bacana e que depois saia para dançar e ainda consiga esticar para um motelzinho “top”. Uma baita noitada para um pai de criança com 4 anos, não? Se realmente eu conseguir realizar essa façanha, irei reviver mentalmente os prazeres deste dia por muito tempo. É natural relembrar o que nos dá prazer - e é natural desejar sentir tudo isso outras vezes.
Mas, e se invertermos a lógica das coisas? Digamos que eu não consiga, pela mesma razão do exemplo anterior (pai de criança de 4 anos), dar vida ao meu desejo de ir a um restaurante bacana, sair dançar e esticar a noitada em um motel. Como ficam meus pensamentos? Quais sentimentos que surgem a partir deles? Como lido com tudo isso? Como lido com a paternidade que “inflige” limites aos meus desejos? Como estes sentimentos e emoções impactam no meu “estar”?
Esses questionamentos me levaram a concluir que meus pensamentos estão ancorados no que posso e no que eu não posso fazer. Onde posso e não posso estar. Com quem posso e com quem não posso estar. O que quero e o que não quero sentir. Ou seja, não são livres.
No momento que vivemos, o desafio é não nos tornarmos reféns de nossos pensamentos. Reféns de nossos desejos. Há aqui um questionamento claro, que se torna um fator complicador e estopim para a angústia: como não querer estar onde não estou?
Não tenho o poder de responder esta pergunta por todos. Mas posso tentar fazê-lo por mim mesmo e, ao contrário do que se espera, minha resposta a esta pergunta se dá com mais uma pergunta: onde estou?
Essa pergunta me leva a refletir sobre o espaço que habito, sobre quem habita este espaço comigo, sobre como lido com o espaço e com as pessoas que estão e, principalmente, sobre como lido comigo mesmo.
Essa pergunta me faz refletir sobre o hoje, o agora, sobre fatos. Dá pouca margem a suposições e me traz realidade, pois incentiva o diálogo. Com o diálogo, tenho equilíbrio e me permito conviver comigo mesmo, e com quem realmente está ao meu lado. Sem fugas.
* André Luis é supervisor de comunicação e atendimento do Sesc Sorocaba.