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Entrevista José Murilo Costa Carvalho Junior

CPF: Como o Ministério da Cultura (MinC) estava entendendo lendo as mudanças culturais na sociedade brasileira antes da criação da área de Cultura Digital no ministério?

José Murilo: A entrada de Gilberto Gil no MinC, em 2003, trouxe uma atenção especial ao que estava ocorrendo no mundo por causa da Internet, e não por acaso. A música “Pela Internet” (“Criar minha homepage, fazer meu website...”) foi lançada em 1998 e ilustra a sensibilidade do artista com o potencial da rede e sua percepção a respeito do impacto do digital no campo da cultura. A atuação inovadora de Gil no tema digital no MinC começou, da mesma forma, com a construção, em 2003, de uma homepage: um website institucional em formato de blog que incorporou de maneira radical a interatividade promovida pela nascente web 2.0. O foco desde o início da gestão nessas possibilidades de participação digital veio mais tarde a consolidar um impulso consistente às iniciativas de construção colaborativa de políticas públicas. Em outra dimensão, vale destacar desde já outro elemento marcante do início da gestão Gil: a incorporação das licenças Creative Commons (2004) como estratégia para lidar com a explosão de compartilhamento de conteúdos na Internet. Essa importante decisão de Gil posicionou o MinC em campo oposto à boa parte dos representantes da indústria cultural e editorial, nos temas relacionados à propriedade intelectual, e determinou o contexto de alguns dos embates
políticos mais significativos de sua gestão. Por sua vez, o desenvolvimento, em 2004, do projeto Pontos de Cultura logrou concatenar estes elementos – (1) abertura à participação via rede e (2) a visão alternativa ao direito autoral que determina “todos os direitos reservados” – à (3) aposta no software livre como estratégia tecnológica básica de implementação de políticas.
Buscava-se aproveitar o potencial do cenário de convergência digital e a produção colaborativa em rede com base em códigos abertos e, assim, promover o acesso ao uso da tecnologia, bem como a sua manutenção e compreensão, e à manipulação de sua linguagem de software e hardware.

Idealmente, buscava-se um modelo de capacitação não só para a produção cultural, mas também para a produção do software necessário para a instrumentalização dos “nativos da rede”. Esse desenho de implementação inovador atraiu a atenção de atores relevantes da nascente cultura digital no mundo, ativistas da “abertura” da rede (openness), alguns dos
quais passaram a integrar as equipes de implementação e de formação do Pontos de Cultura. Dessa forma, as ações digitais do MinC de Gil ganharam visibilidade internacional. Podemos dizer, portanto, que, entre 2003 e 2009 – ano de criação da Coordenação-Geral de Cultura Digital – o Ministério da Cultura já havia ativado algumas interfaces de atuação no campo da cultura digital fazendo uso de uma abordagem arrojada. As leituras de contexto davam-se não somente sobre a rápida movimentação do campo no Brasil e no mundo, mas também sobre os resultados que as inovações implementadas – entre elas o Creative Commons – já produziam no país. O surgimento efetivo da Coordenação coincide com a saída de Gil do ministério, o que pareceu indicar a necessidade de institucionalização das iniciativas que sua presença marcante no governo proporcionou ao campo
das políticas digitais dos governos Lula. (...)

 

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