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Quebra de rotina
PRODUÇÃO ARTÍSTICA EM GRANDE ESCALA TEM NOS ESPAÇOS PÚBLICOS A PLATAFORMA IDEAL DE EXPERIMENTAÇÃO E INTERVENÇÃO URBANA
Continuidade do prédio, parte daquele parque, componente visual que serve de companheiro para um diálogo, intervenção que protesta em voz alta para o pedestre ou aparece forte para ser contemplada. Essas são algumas formas de interpretar a apropriação do espaço urbano por obras em grande escala realizadas por artistas ávidos por experimentações. A cidade passa a ser a plataforma ou, como define Eduardo Srur, artista que começou a trabalhar com pintura e se destacou nas intervenções urbanas, a cidade é o seu laboratório de pesquisa para a prática de experiências artísticas. Nascido nos anos 1970, Srur não participou ativamente do período no qual as intervenções urbanas vinham tomando forma no Brasil. Naquela época, a ditadura impunha empecilhos legais, que dificultavam a apropriação e compartilhamento de espaços públicos – como o AI 5 (Ato Institucional nº 5), que vigorou até 1978 e foi o mais duro do regime, pelo qual os governantes adquiriram poder de exceção. “Mesmo nos anos 1980 ainda havia um clima de fechamento muito forte. Em termos gerais de produção cultural, as intervenções urbanas se intensificaram a partir dos anos 1990, com a abertura política efetiva”, comenta a professora livre-docente da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP) Vera Pallamin, especialista na relação entre arte e esfera pública.
Estratégias
O uso da escala é uma estratégia importante na obra, principalmente ao considerarmos o espaço público. “Ela é um dos elementos importantes e deve ser trabalhada de acordo com a natureza do projeto e o conceito no qual ele está inserido”, pontua Eduardo Srur, que em 2008 executou a intervenção Pets, nas margens do Rio Tietê, em São Paulo, onde ficou por dois meses.
Nela percebeu a necessidade de distorcer a escala dos objetos, por vezes ampliando ou multiplicando uma escultura: “A multiplicação é uma estratégia do meu processo, pensada para aproximar o público do trabalho e da mensagem”, diz o artista, que em janeiro de 2016 levará uma adaptação da intervenção Trampolim (2014) para o Sesc Santo Amaro. Originalmente exposta ao longo do Rio Pinheiros, Trampolim reuniu personagens realistas equilibrados em pranchas que remetiam à impossibilidade de nadar no poluído rio devido à poluição. “A resposta foi imediata: 300 ocorrências no Corpo de Bombeiros, selfies e grande número de posts nas redes sociais, mídia espontânea. Uma das esculturas levou um tiro de revólver e outra teve a cabeça decepada.
Todas essas transformações foram incorporadas ao trabalho”, relata.
A ocupação do espaço público permite relação sensorial diversa com os trabalhos nele expostos, sejam grafites, esculturas ou instalações. E não há fórmula ou método rígido a ser seguido nas obras, que podem aparecer individualmente ou inter-relacionadas. Segundo Vera, esse ambiente de experimentação é um dos grandes ganhos produzidos no campo das artes.
Em sua análise, a cidade pode ser vista como matéria-prima a ser trabalhada. “Isso é um ganho sem volta. Os artistas têm essa dimensão”, explica. “O que a arte exige não é pura espontaneidade diante do espaço, mas envolve saberes multidisciplinares que estão na ordem do dia para serem dominados.”
Somar, diminuir e potencializar
Livro aborda em texto e ilustração todo o potencial das escalas macro e micro na produção artística
Na introdução do livro Máxima Arte, Mínima Arte: As Escalas da Arte (Edições Sesc, 2015), o autor inglês Tristan Manco afirma seu entusiasmo em corroborar o poder da arte de estimular e apresentar novas formas de enxergar, tendo na escala um recurso fundamental, ressaltando que seu estudo tem como ponto de partida o uso criativo da escala nas produções artísticas.
O livro contempla o trabalho de mais de 40 artistas de vanguarda que revolucionam a abordagem da escala macro e micro na arte, valendo-se de objetos trabalhados ou encontrados, de materiais não usuais, de variadas texturas e cores para criar um sentimento no qual se pode ter uma nova visão sobre a função e a estética artística. “Só isso já justificaria sua publicação”, enfatiza a gerente adjunta das Edições Sesc SP, Isabel Alexandre.
Em sua opinião, o autor é um dos mais importantes críticos da arte de rua e ostenta a reputação de apoiar artistas menos conhecidos, ajudando-os em suas trajetórias. “Isso está em plena sintonia com as ações do Sesc São Paulo. Esse legítimo trabalho de curadoria da arte contemporânea – estabelecendo como critério os extremos da escala artística – torna o livro único, bem como um importante acréscimo ao nosso catálogo”, ressalta.