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Imagens com autonomia
Por um determinado período na história, os registros feitos pelos fotógrafos encontravam-se restritos aos espaços expositivos, semelhantes aos quadros e pinturas. Para vê-los era necessário ir até as imagens. A partir do século 20, a impressão de fotografias acompanhadas por textos – informativos ou descritivos –, serviu de transição e facilitou a interação com a linguagem fotográfica, percurso que resultou na criação de narrativas imagéticas. Esse é o ponto introdutório explicitado pelo crítico e professor espanhol de fotografia Horácio Fernández, autor do livro Fotolivros Latino-Americanos (Cosac Naify, 2011).
A pesquisa para a obra surgiu da percepção de que ainda eram poucos os títulos e pesquisadores debruçados sobre a produção latina. O cenário é bem diferente nos últimos anos. “Hoje temos uma maior maleabilidade em relação a gráficas menores, publicamos edições mais caseiras, mas com muita qualidade ou edições lançadas por grandes gráficas. O fotógrafo tem maior autonomia. Comparo isso às mudanças ocorridas no meio musical, fato que descomplicou o trabalho do fotógrafo e ofereceu novas perspectivas”, justifica o fotógrafo e curador independente Armando Prado.
O uso da denominação “fotolivro” é recente. Derivado da tradução de photobook, teve seu marco com The Photobook: A History, Vol. 1 (Phaidon Press; 3ª edição, 2004), publicação do fotógrafo inglês Martin Parr e do crítico Gerry Badger. “Passamos a usar o termo nos últimos sete ou oito anos. Essa compilação feita pelos ingleses popularizou o nome”, afirma Prado. “Depois desse lançamento, outro marco considerado – no caso da América Latina – é o livro de Horácio Fernández”, menciona, fazendo referência à publicação do crítico espanhol.
Na opinião do fotógrafo e coordenador de Pós-Graduação da Faculdade de Comunicação e Marketing e professor da Faculdade de Artes Plásticas da Fundação Armando Alvares Penteado (Faap-SP), Ronaldo Entler, o século 20 sedimentou uma grande história com os livros de fotografia, abarcando muita pesquisa e experimentação gráfica. No entanto, relativiza as necessidades que justificam a criação de uma nova denominação. “Aparentemente, o termo fotolivro não surge para questionar a tradição dos livros de fotografia; ao contrário, há um visível esforço para dar uma história retroativa a esse termo, isto é, para fazer com que ele abarque também essa tradição”, diz. Mas há um fato que, segundo Entler, não se pode negar: o debate sobre os fotolivros estimulou a produção e o consumo de muita coisa boa. Surgiram editoras, projetos, festivais, editais, prêmios. “Criou-se uma teia produtiva que conectou fotógrafos, editores, escritores, diretores de arte. E, no meio desse debate, tivemos a oportunidade de conhecer melhor a boa e velha história dos livros de fotografia, tanto os clássicos quanto aqueles mais experimentais que permaneceram esquecidos. Nesse sentido, a movimentação construída em torno da ideia de fotolivro foi muito saudável”, analisa o professor.
A pesquisa em fotografia também foi uma área sacudida por essas alterações. Pesquisadores e acadêmicos recorrem a fotografias em seus estudos, e os fotolivros caminham ao encontro desse fluxo. A autora do livro As Imagens da Imagem do Sesc (Edições Sesc, 2014), Solange Ferraz de Lima, é uma historiadora que trabalha com fontes fotográficas, e para ela é crescente o interesse pela fotografia como fonte de pesquisa. “Isso tem a ver com o crescente interesse pela preservação do patrimônio fotográfico no Brasil, que começou na década de 1980”, informa. “Certamente, isso deve contar para a valorização do fotolivro, com as fontes fotográficas sendo exploradas por historiadores, antropólogos e sociólogos.”
O contexto histórico e os avanços tecnológicos apoiam a diversidade e a autonomia dos fotógrafos tanto em produzir quanto em escolher temas. A busca pela qualidade é uma preocupação compartilhada e os profissionais se sentem livres para experimentar. “Não é preciso, necessariamente, estar ligado a grandes temas”, exemplifica Prado. “Nos anos 1970, a fotografia estava ligada a grandes assuntos, como a Floresta Amazônica ou cidades e regiões brasileiras. Não havia uma produção poética do autor falando sobre seu mundo, situação forte atualmente. A cena é muito mais rica e diversificada, a meu ver, mais autônoma. Ao mesmo tempo que é independente se torna mais rica”, conclui o fotógrafo.
Maldicidade, (Cosac Naiify, 2014). fotolivro de Miguel Rio Branco
Once a Year, do fotógrafo alemão Axel Hoedt
Centro, de Felipe Russo
Christian Cravo, (Cosac Naiify, 2014). Fotolivro de Christian Cravo
Da série Minutes to Midnight, do fotógrafo inglês Trent Parke
Imagem da série Men & Women, de Tom Wood
Street Photographer, de Vivian Maier
Hotel tropical, de João Castilho
Em foco
Aproxime-se dos fotolivros e conheça o diálogo entre as imagens e um dos seus suportes
Livros e fotografia, uma junção que ganha forma e conteúdo no Sesc Vila Mariana até o dia 14 de junho, por meio da exposição Fotolivros, Uma Seleção Atual. Os interessados no universo das Artes Visuais também puderam participar do Encontro de Fotolivros (8 e 10/4), que reuniu fotógrafos e profissionais do mercado editorial para dialogar e compartilhar experiências sobre o assunto. Houve cursos, leitura de projetos, mesas-redondas e conferências.
Segundo os técnicos do Núcleo da Imagem e da Palavra (NIP), Luciana Tavares e Danilo Praxedes Barboza, a exposição está em profundo diálogo com os objetivos do Programa de Artes Visuais da unidade por estimular o pensamento sobre a cultura e sobre a relação do ser humano com o mundo, assim como por expandir os horizontes do conhecimento. Luciana confirma que a intenção é oferecer aos frequentadores “um contato com a discussão contemporânea sobre a fotografia e a edição de livros, por meio de um amplo programa de cursos, conferências e bate-papos ministrados por renomados especialistas brasileiros e internacionais de fotografia e do mercado editorial”.
Gulu Real Art Studio, da italiana Martina Bacigalupo