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Teatro
Do livro ao palco

por Adriana Falcão

A escritora e roteirista conta o processo de adaptação de seu romance A Máquina na divertida peça homônima dirigida por seu marido, João Falcão

Tudo começou com um convite para escrever uma peça de teatro. Argumentei que nunca tinha escrito para teatro antes, que essa não era a minha praia, que me sentiria insegura, coisa e tal, mas foi inútil. Seduzida pela idéia, comecei a escrever A Máquina, a peça, em janeiro de 1999.
Logo nas primeiras páginas, concluí que não era uma peça que eu queria escrever. Mas estava gostando da história. Fiquei indecisa. Foi quando João Falcão leu os primeiros rascunhos, se empolgou com o que leu e sugeriu "por que você não escreve em forma de literatura e eu adapto para o teatro?". Aceitei a sugestão e me senti muito mais à vontade quando me libertei do compromisso com a forma teatral. Comecei a escrever um texto sem saber direito o que seria. Seria um conto? Um romance? Uma novela? O rascunho de uma peça? Uma espécie de libreto? Eu não sabia bem. Mas fui me apaixonando pela palavra, pela frase, pelo ritmo, pela sonoridade, até o ponto de esquecer completamente o objetivo inicial. O meu envolvimento com a forma literária era tamanho que muitas vezes eu achei que estava me distanciando demais da forma teatral, o que seria um grande problema na hora da adaptação.
O texto ficou pronto em setembro de 1999 e a editora Objetiva se interessou em publicá-lo. Quando percebi, A Máquina tinha virado um livro de verdade e eu, por conseqüência, tinha virado uma escritora. Maravilha. Mas aí vinha a segunda parte.
Quando João começou a trabalhar na adaptação propriamente dita, em dezembro, a concepção da encenação já estava pronta na cabeça dele: o palco giratório, um mesmo personagem interpretado por quatro atores, o jogo com quatro platéias distintas, a roda, o relógio, o mundo, o tempo. Durante o processo, ele escreveu alguns diálogos, me encomendou outros, e eu sempre tinha a impressão de que seria impossível fazer funcionar no teatro um texto tão literário, tão essencialmente verbal, sem diálogos e sem indicações de cena.
Talvez seja por isso que o resultado de A Máquina, a peça, me agrade tão especialmente. No dia da estréia, em janeiro de 2000, no Recife, eu estava tão surpresa quanto o resto da platéia com a força da montagem, com a luz, com a delicadeza e o vigor da marcação, com a interpretação superprecisa do elenco. Dizem que eu chorei o espetáculo inteiro. Dizem. E eu acho que devo ter chorado mesmo.