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Diversidade à Francesa


A atriz Isabelle Huppert fala sobre o panorama cinematográfico atual em seu país e adianta um pouco de seu novo trabalho nas telas
 

Isabelle Huppert, nascida em Paris, em 1953, é considerada a maior atriz do cinema francês de sua geração. Sua extensa filmografia, que contabiliza mais de 90 filmes, é marcada por interpretações marcantes e colaborações com grandes diretores, como Jean-Luc Godard, Michael Haneke, Andrzej Wajda, François Ozon, Patrice Chéreau, Claude Chabrol e André Techiné. Como reconhecimento por suas elogiadas atuações, foi premiada pelos maiores festivais de cinema do mundo, conseguindo o feito de já ter levado para casa três dos mais importantes: duas vezes prêmio de melhor atriz no Festival de Cannes, em 1978 e 2001 –  por seu papel em A Professora de Piano –, no Festival de Veneza, em 1988 e 1995, e no Festival de Berlim, em 2005. Sua carreira no teatro, talvez menos conhecida dos brasileiros, também não é menos famosa lá fora. Isabelle já encarnou papéis como a Medeia, de Eurípedes, e Orlando, de Virginia Woolf – em ambas as vezes sob a batuta do norte-americano Robert Wilson, que também a dirigiu em Quartett, espetáculo apresentado no Sesc Pinheiros, em setembro, como parte da programação do Ano da França no Brasil. Não é a primeira vez que a atriz vem ao país para subir aos palcos. Em 2003, Isabelle trouxe seu 4.48 Psychose, de Sarah Kane, ao Sesc Consolação, com enorme sucesso e ingressos esgotados. A seguir, trechos da conversa exclusiva concedida à Revista E na qual a atriz – que apresentou o espetáculo Quartett, nos 12, 13, 15 e 16 de setembro, no Sesc Pinheiros e é tema da exposição "Retratos e Fotogramas: Isabelle Huppert", no CineSesc até 12/10 – falou sobre a influência da Nouvelle Vague no seu trabalho e no de seus contemporâneos, sobre a presença na produção atual de seu país dos chamados “advindos da diversidade” – segundo ela, expressão usada pelos franceses para se referir aos cineastas de origem estrangeira – e sobre a política pública para cinema na França.

Público exigente

É a segunda vez que eu me apresento em São Paulo, e isso não é um acaso evidentemente. Quando vim apresentar o espetáculo 4.48 Psychose, de Sarah Kane, com direção de Claude Régy [em 2003, no Sesc Consolação], eu e Claude ficamos absolutamente encantados com a acolhida espetacular e extraordinária que o espetáculo teve aqui. Agora, nesta segunda vez, eu pude verificar o quanto o público paulistano aprecia a alta qualidade. É muito fácil gostar de um espetáculo frívolo, de um teatro superficial. E agora eu pude verificar o grau de exigência que o público daqui tem.

Política para o cinema francês

Na França, temos uma política que favorece bastante o cinema de autor, pois temos um sistema chamado L’avance sur Recette [adiantamento sobre receita], um órgão do Estado que existe desde André Malraux [ministro da cultura francês entre 1959 e 1969] e que financia, e ajuda a financiar, os filmes. O órgão é direcionado mais às produções que realmente precisam, ou seja, mais ao cinema de autor do que ao cinema mais comercial. Portanto, há uma política pública de ajuda à criação na França.

Diversidade

Há, de fato, hoje, cineastas de origem magrebina, como o cineasta Rachid Bouchareb. Há cada vez mais diretores, como dizemos na França, “advindos da diversidade” – é a expressão que empregamos. Mas, de fato, isso é encontrado também nos temas. Por exemplo, penso em filmes como Um Profeta (Un Prophète, 2009), dirigido por Jacques Audiard – que é um diretor francês –, que fala da integração de um jovem árabe nas cadeias. Portanto, isso influi [a diversidade étnica] também nos temas dos quais tratam os diretores franceses.

Nouvelle Vague

Estamos todos ao mesmo tempo próximos e longe agora [da Nouvelle Vague, movimento do cinema francês no início dos anos de 1960]. Somos todos um pouco herdeiros desse período que revelou que podíamos gravar filmes na rua, de forma muito leve, de forma muito livre. É isso que a Nouvelle Vague trouxe. Evidentemente, ?quando começamos a fazer cinema, quando eu comecei a fazer cinema, os diretores já se aproveitavam desta abertura. Mas eu não vivi essa mudança.

“O espetáculo do espetáculo é muito importante em Cannes. Mas a cinefilia também está lá: há a competição oficial, mas há também todas as sessões paralelas”

Cannes

Cannes é um festival muito grande, todo mundo sabe, é o maior festival de cinema do mundo, é um festival ao mesmo tempo muito, como dizer..., baseado na representação. O espetáculo do espetáculo é muito importante em Cannes. Mas a cinefilia também está lá: há a competição oficial, mas há também todas as sessões paralelas. É realmente um festival em que podemos ver todas as formas de cinema possíveis, do mundo inteiro, é um mercado muito importante, é um festival essencial para o cinema mundial. Eu fui presidente do júri [na última edição do Festival de Cannes] e foi uma experiência muito boa – eu já tinha sido jurada em 1984. É, de fato, muito bom, ainda mais quando os prêmios saem de acordo com o que a gente deseja, com os nossos gostos. É ainda mais agradável, e este foi o caso.

Cinema de autor

Villa Amália, que foi exibido agora no CinSesc [no dia 14 de setembro, como parte do evento Retratos e Fotogramas: Isabelle Huppert] é o meu quinto filme com o diretor francês Benoît Jacquot. É um cineasta muito importante na França. No início [de sua carreira] Jacquot era, podemos dizer, radical. E, agora, não que ele tenha perdido essa marca, mas, de alguma maneira, ele construiu uma trajetória que acabou atingindo um público mais abrangente. Benoît Jacquot é o exemplo mais bem acabado de um cinema de autor hoje na França. Essa noção de cinema autoral é algo a que damos muita importância em meu país. É uma noção que pode, talvez, assustar um pouco, mas é o que busco no cinema, por isso dou tanta importância a esse tipo de produção, que é a afirmação de uma individualidade, de um cinema mais radical e mais desconcertante.

Novo filme

Meu novo filme [chamado Copacabana] é uma comédia de um jovem cineasta francês chamado Marc Fitoussi e que se passa na Bélgica. É sobre uma jovem desempregada e que sonha apenas com uma coisa: partir para o sol de Copacabana. E é um filme que gravei com a minha filha, que também é atriz, se chama Lolita Chammah, e ela interpreta minha filha também no filme. Mas não posso dizer mais do que isso, pois o filme ainda não saiu, ele vai estrear na França em alguns meses.