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Complementar aos processos regulares de ensino, a educação não formal mostra-se essencial para a formação do indivíduo em qualquer faixa etária
 

Estudiosos da área da educação e intelectuais ligados a diferentes especialidades do vasto universo do conhecimento têm se debruçado sobre o estudo do que hoje se conhece como educação não formal para tentar entender a gama de possibilidades que levam a uma formação integral do ser humano. Mais do que aprender a ler e a escrever ou se preparar para uma profissão, existe um aspecto do processo educativo que vem sendo especialmente trabalhado nos últimos 15 anos. “Da década de 1990 para cá temos a implementação de projetos educacionais por parte de organismos do chamado terceiro setor”, explica a doutora em educação Margareth Brandini Park, professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). “Tentando superar a nomenclatura que se dá por oposição – o ‘não formal’ tomado em contraposição ao sistema formal de ensino – é que alguns pesquisadores têm investido em pesquisas e reflexões.” A professora explica que diversos autores têm fornecido definições para esse tipo de educação. “Almerindo Janela Afonso [autor português, doutor em sociologia da educação] assume que ‘a educação não formal (...) diverge ainda da educação formal no que respeita à (...) flexibilidade na adaptação dos conteúdos de aprendizagem a cada grupo concreto’”, cita a professora. “Segundo esse autor, tal modalidade promove a socialização, a solidariedade, visa o desenvolvimento e preocupa-se com mudanças sociais.”

O País que queremos

É nesse ponto que cabe falar do trabalho desenvolvido pelo Sesc São Paulo, que justamente “promove a educação permanente por meio de suas ações culturais, socioambientais, esportivas, de promoção da saúde e da cidadania, das atividades de lazer e de sociabilização, voltadas prioritariamente às pessoas de menor renda”, como explica Danilo Santos de Miranda, diretor regional da instituição. “A melhor maneira de conferir o significado dessa ação é vivenciar o dia-a-dia nos centros culturais e desportivos. Ouvir o relato dos freqüentadores sobre a importância do Sesc em suas vidas e para suas famílias.”

Para o doutor em economia Márcio Pochmann, pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), vale mencionar ainda a atuação na área de educação de todo o Sistema S – formado, além do Sesc, pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), Serviço Social da Indústria (Sesi), Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar), Serviço Nacional de Aprendizagem em Transportes (Senat), Serviço Social de Transportes (Sest), Serviço Brasileiro de Apoio às Pequenas e Médias Empresas (Sebrae) e Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo (Sescoop).

“Concordo que é preciso pensar como formar A ou B de acordo com o curso traçado para o país”, escreve no livro Inserindo o Brasil no Mundo (Editora Senac, 2007), referindo-se ao papel das instituições formais de ensino. “O Sistema S formou-se no bojo da perspectiva nacional de industrialização, do projeto nacional urbano. É mais fácil montar instituições voltadas para a formação profissional quando se conhece o rumo do país. As questões de regulamentação e reformas trabalhistas e sindicais também dependem de respostas claras. Que tipo de país queremos e que país teremos daqui a duas ou três décadas?”

 

CEM - Centro de Experimental de Música

Lazer e cultura

As formas como a educação não formal pode ser difundida são diversas. Segundo Teixeira Coelho, professor titular da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP) e curador do Museu de Arte de São Paulo (Masp), o lazer e a cultura são duas delas. “A moderna pedagogia diz, exatamente, que o formato do lazer é o mais adequado para a transmissão do conhecimento”, informa o professor. “É ele que cria ou que oferece condições para que apareça a pergunta, a vontade de saber.” Sobre o potencial educativo da cultura, o especialista afirma que o que é interiorizado por meio dela “cria raízes e não desaparece, enquanto o conhecimento formalista utilitário tende a desaparecer quando não é mais necessário (uma vez feita a prova escolar, por exemplo, ou superado o obstáculo do vestibular)”. Nesse âmbito, shows musicais, espetáculos de teatro e dança, exposições temáticas, oficinas e workshops são algumas das atividades por meio das quais as unidades do Sesc fazem a cultura chegar a um enorme número de pessoas (veja o quadro Os números do Sesc).

Mais do que momentos de descontração, o que é levado à audiência é conhecimento. “O que o Sesc faz é o mais adequado meio para que a educação frutifique”, retoma o professor da ECA. “A sedimentação do processo cultural é lenta, mas não há dúvida que a penetração desse conteúdo ocorre e é fundamental.” Ainda segundo Teixeira Coelho, em cultura é “a oferta que cria a demanda”. Ou seja, oferecer uma programação cultural de qualidade é passo decisivo para a formação da platéia. “E em larguíssima medida o aumento dessa demanda se deve à ação pioneira e perene do Sesc, que faz em relação à arte e à cultura aquilo que tem de ser feito: amparar o evento cultural ou artístico em si (a projeção de um filme, a montagem de um espetáculo) em ações complementares que são o programa bem elaborado, a discussão do que foi visto ou ouvido por meio de uma abordagem crítica, a conversa com os realizadores.”

 

Educação ambiental

Sesc Curumim e educação ambiental

Os princípios da educação não formal também podem ser vistos no trabalho do Programa Integrado de Desenvolvimento Infantil (Pidi), mais conhecido como Curumim. Criada em 1987, a iniciativa oferece atividades nas mais variadas áreas a crianças de 7 a 12 anos matriculadas no ensino fundamental. Isso mostra uma das características mais marcantes do trabalho: transmitir um conhecimento complementar ao adquirido na sala de aula. Segundo a doutora em educação Margareth Brandini Park, embora seja difícil estabelecer um diálogo com as instituições formais de ensino, é essencial a tentativa. “A escola se ressente dos ambientes mais livres, da disciplina mais solta, do prazer envolvido em tais atividades [refere-se às desenvolvidas na educação não formal], o que é uma pena. Pois temos visto em estudos que ambos os espaços ganham em qualidade e pertinência quando há diálogo entre as propostas educativas. Não devemos estimular a competição entre ambos os espaços, cada qual deve ter sua função e realizá-la com qualidade.”

Também importante para as crianças, mas fundamental para os adultos, a educação ambiental é outra preocupação do Sesc São Paulo. “As práticas de educação ambiental, tanto na educação não formal quanto na formal, vêm atendendo a uma importante demanda social”, analisa o pedagogo Fabio Alberti Cascino, doutor em educação e pesquisador na área de ecopedagogia. “De posse de algum esclarecimento sobre as origens dos problemas ambientais e de suas dimensões sociais, políticas e econômicas é muito importante que as propostas acolham novos olhares para que seu raio de alcance se efetive. Assim proposta, a educação ambiental se revelará como uma poderosa ferramenta para alunos de qualquer idade para a releitura do mundo, sua interpretação e transformação.”

Entre as unidades do Sesc que atuam nessa área, em Interlagos e em Itaquera as iniciativas se destacam por envolver toda a comunidade. O Sesc Interlagos, na Zona Sul de São Paulo, possui ações externas de intervenção socioambiental coordenadas pela equipe de gestão ambiental. Já no extremo oposto da capital, no bairro de Itaquera, Zona Leste, a unidade sedia, desde 2005, as reuniões do projeto Rede 21, iniciativa do Grupo de Trabalho de Meio Ambiente, um dos braços de atuação do Fórum de Desenvolvimento da Zona Leste. “O universo de aprendizagem do adulto é menor, porém a sua experiência de vida é necessariamente maior do que aquela que encontramos em crianças e jovens em idade escolar regular. Por isso, dialogar com esse adulto, conhecer, reconhecer, respeitar e interpretar seu universo de relações é essencial”, retoma Cascino. “É vital que o Sesc possa se dedicar a receber essas pessoas e estabelecer vínculos. A sensibilização, no caso dos adultos, resulta da interlocução possível e não de algo que se impõe. A sedução para o projeto é a condição da efetividade da participação”.

 

Uma das 23 clínicas odontológicas do Sesc

Saúde

Bem-estar e qualidade de vida dependem, antes de tudo, de um corpo saudável. Por meio de atividades como a Semana da Saúde – durante a qual os centros preparam uma programação especial – ou pelo próprio serviço prestado pelo programa OdontoSesc, a instituição garante um trabalho de atendimento integral ao seu público. “A educação [em saúde] é responsabilidade de todos os seres humanos e toda a sociedade tem de se mobilizar nesse sentido”, explica a professora doutora em saúde pública pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), Maria Cecília Focesi Pelicioni. “É aí que vejo o papel do Sesc e do Sesi, que contribuem, sim, com o poder público.” Para a professora todos os espaços de convívio urbano – “parques, escolas fora dos seus horários de funcionamento formal, os espaços de lazer, as praças, todas as instituições”, cita – podem servir como “salas de aula” para promover a saúde. “É aí que eu volto ao trabalho desenvolvido no Sesc. Qualquer espaço disponível, além de cumprir o papel para o qual foi criado, tem que estar à disposição da população para cumprir o seu papel complementar à educação. Acho que o Sesc e o Senac têm feito esse papel muito bem, e é fundamental que eles continuem a fazer.”

Mais especificamente na área da saúde bucal, o Sesc São Paulo também vem contribuindo, por meio de suas unidades, para a difusão da importância da promoção da saúde e da prevenção de doenças. O Sesc Interlagos, por exemplo, realizou, de 13 de março a 1º de junho, o evento Sorriso É Coisa Séria, uma grande instalação formada por quatro espaços, dispostos em circuito, nos quais o participante interagiu com peças de caráter pedagógico. Outra iniciativa da instituição é um programa permanente mantido pela unidade Ipiranga desde outubro de 2001. Voltado para o atendimento de crianças de 0 a 12 anos dependentes de comerciários matriculados, o Clube do Dentinho – que promove, a cada três meses, um dia inteiro de atividades – atua não somente na prevenção, mas também realiza diagnósticos precoces de doenças bucais, proporcionando atendimento rápido e eficaz. Todo o trabalho dos profissionais é feito por meio de ações motivadoras que se traduzem em brincadeiras, esquetes teatrais e distribuição de brindes, como escovas de dentes, creme dental e fio dental.

 

Inclusão digital

As experiências nas salas de Internet Livre das unidades do Sesc têm apontado para uma metodologia de trabalho que se apóia em três pilares básicos na educação não formal por meio da internet: a orientação oferecida pelos instrutores; a realização sistemática de oficinas, workshops e cursos; e a intervenção aberta. A primeira corresponde ao uso propriamente dito dos computadores; a segunda reflete um modelo de sucesso no campo da educação não formal, enquanto a terceira corresponde a uma maneira especial de trabalhar com os internautas: deixá-los navegar pelo infinito universo da rede. Esta última reflete a preocupação do Sesc São Paulo em reafirmar o trabalho de socialização da comunidade, unindo gerações e interesses diferentes em torno do mesmo intuito: a consolidação da cidadania, com seus direitos e deveres, por meio da inclusão digital. Um dos grandes diferenciais do trabalho é a opção pelos softwares livres, que além de gratuitos – o que contribui para a democratização do meio – também se mostram uma alternativa à pirataria. “A orientação que nós temos é que quanto mais usarmos o software livre, melhor”, garante Marcelo Bressanin, assistente técnico da Gerência de Ação Cultural (GEAC) do Sesc. “Ao realizar uma oficina de criação musical, por exemplo, se apenas usarmos o software proprietário [pago e com os recursos “fechados” à manipulação pelo usuário], o aluno aprenderá, mas não poderá usar esse conhecimento em casa, por causa do custo do programa.” O técnico conta ainda que para cada oficina é exigido do professor que busque na rede uma lista de softwares livres específicos para o trabalho a ser realizado. “A idéia é estimular a criação artística por meio da tecnologia independente do software proprietário, criando usuários autônomos.”

 

Educação alimentar

Nas áreas da segurança alimentar e nutricional e de combate ao desperdício de alimentos, a educação também desempenha papel fundamental. Ciente disso, o Sesc criou, em 1994, o programa Mesa São Paulo – hoje intitulado Mesa Brasil Sesc São Paulo, por estar ligado a outras iniciativas de mesma natureza realizadas por departamentos regionais da instituição em outros estados do país. O programa faz uma ponte entre empresas e supermercados que têm alimentos que perderam seu valor comercial, mas não o nutricional, e que por isso, em vez de serem destinados ao lixo, vão para instituições que precisam desse excedente. “Em primeiro lugar, vejo que o Mesa Brasil Sesc São Paulo deu visibilidade à questão do desperdício – porque é um absurdo o que se joga de comida fora”, sentencia Christiane Costa, coordenadora da área de segurança alimentar e nutricional do Instituto Polis. “Mas, além disso, com essa abordagem educativa das entidades [receptoras] o Sesc conseguiu melhorar muito o processo de trabalho. Acho que o caráter educativo – os cursos que o Sesc oferece, toda a capacitação etc. – faz com que as instituições também sejam promotoras de saúde no que diz respeito à alimentação, o que é bastante importante.”



“Considero extremamente importantes as chamadas instituições paralelas no que diz respeito ao processo educacional familiar e formal. É aí que entram os museus de ciências e os museus mais diferentes possíveis – desde que tenham guias para explicar os fatos e os componentes principais daquele acervo em particular – e as atividades extremamente úteis e convincentes em relação à educação que são os trabalhos de algumas instituições. Entre elas eu coloco num lugar muito particular o Sesc e o Sesi. O Sesc pelas atividades que desenvolve culturalmente nas grandes, médias e pequenas cidades, e o Sesi pelo uso duplo da educação cultural e técnica. Isso me agrada profundamente, razão pela qual eu sempre estimulo os meus amigos que são da direção dessas instituições a dar continuidade ao processo e a fazer uma modificação fundamental na questão da educação não formal. Acredito que esse interesse de certas instituições pela educação – à custa não só de um ensino entre quatro paredes, mas também de atividades não formais, interessantes, bem aproveitando momentos especiais para explicar mais coisas sobre o mundo, transmitir mais conhecimentos, cruzar conhecimentos diferentes – venha a ter grande sucesso em nosso país. De forma que o Sesc e o Sesi constituem um tipo de instituição que tem um grande interesse paralelo para o processo educacional. Aí nós temos um tríptico: família, escola e as atividades que independentemente das paredes da escola ou da casa – casinhola, mansão, moradia etc. – ensinam mais coisas sobre o mundo.”
Aziz Ab’Sáber, geógrafo




“O Sesc é paladino da educação. Primeiro, cuida do bem-estar e da saúde física ou mental desde a infância até a terceira idade, oferecendo esportes e inclusão digital. Segundo, privilegia tanto a alta cultura (de fora e de dentro do país) quanto as manifestações populares: nenhuma produção artística lhe escapa, do bumba-meu-boi à ikebana e ao teatro de Antunes Filho. Terceiro, descentraliza a oferta, não a dirigindo apenas aos distritos abonados, mas levando-a sistematicamente aos rincões menos assistidos da malha urbana. Bom exemplo é a unidade do Belenzinho, que já fez tanta gente ir pela primeira vez ao bairro: quem não se dispôs a ir até lá não viu o Théâtre du Soleil de Ariane Mnouchkine. No Belenzinho será sua futura sede, já em construção numa área enorme, concentrando diferentes serviços, equipamentos e auditórios, tendo na mira a revitalização do bairro. Quarto, englobando todos os outros: tem consistente política de manter baixo o preço das entradas, assim tornando-as acessíveis ao maior número possível de usuários. O Sesc não tem paralelo, benemérito que é do Brasil, na democratização da cultura e na educação para a cidadania.”

 

Walnice Nogueira Galvão, escritora, ensaísta e professora titular de teoria literária e literatura comparada da Universidade de São Paulo (USP)




“Foi com estupefação que acabei de saber que o Sesc corre o risco de ser privado de 33% de seus fundos em benefício de uma educação estritamente técnica e profissional.
Ora, nós sabemos que uma competência geral do espírito, formada por uma cultura humanista, permite um melhor desenvolvimento das competências especializadas, profissionais ou técnicas, e que o Sesc tem um papel cultural insubstituível, que suscita a admiração entre nós europeus que conhecemos sua ação. Ele contribui ao desenvolvimento das sensibilidades artísticas, ao desenvolvimento das faculdades do espírito, ao desenvolvimento da capacidade de responder aos desafios contemporâneos da complexidade, ao desenvolvimento de uma consciência cidadã brasileira e ao mesmo tempo segura de si mesma, e aberta ao mundo. O Brasil pode orgulhar-se, graças ao Sesc, de estar na vanguarda da cultura de nossa época. O Sesc deveria ser não limitado, mas por todos imitado.”
 
Edgar Morin, filósofo e escritor




Os números do Sesc
Conheça alguns dados que demonstram o sucesso das atividades empreendidas pela instituição


• 31 unidades em todo o estado

• 1.300.000 matriculados

• 15 milhões de pessoas – entre crianças, jovens, adultos e idosos – usufruíram as atividades oferecidas pelas unidades

• 14 mil espetáculos – incluindo música, dança, teatro, exposições e exibições de cinema – foram assistidos por 5.170.000 pessoas

• 90 mil de inscritos nos cursos oferecidos pelos programas

• 100 consultórios odontológicos, reunidos em 23 clínicas, realizaram 450.500 consultas

• 46.200.000 refeições foram possíveis graças ao Programa Mesa Brasil Sesc São Paulo

• 30 mil idosos inscritos somaram 1.500.000 atendimentos nos programas voltados à terceira idade

• 22 parques aquáticos abertos a aulas de iniciação à natação, cursos de hidroginástica e recreação, por onde passaram 4 milhões de usuários

Obs.: Dados do ano de 2007