Lançado o Dicionário Sesc - A Linguagem da Cultura, realização do Sesc São Paulo, com mais de dois mil verbetes cobrindo as diversas áreas da manifestação artística e do pensamento
Dia 2 de dezembro de 2003, Sesc Vila Mariana. A data marca o lançamento de uma das maiores iniciativas do Sesc São Paulo. Desta vez não se trata de uma exposição, tampouco de um seminário ou de uma jornada de cinema, teatro ou dança. Na verdade, pode-se dizer, trata-se de tudo isso junto. Com a presença do diretor regional da instituição, Danilo Santos de Miranda, e de demais agentes culturais da cidade e do País, o encontro informal celebrou o lançamento do Dicionário Sesc - A Linguagem da Cultura, um lançamento do Sesc São Paulo, de autoria do técnico da Gerência de Estudos e Desenvolvimento Social (GEDES), Newton Cunha, e publicado pela Editora Perspectiva. "A idéia do dicionário surgiu pela própria forma como o Sesc atua", resume Newton. "A instituição trabalha com todas as manifestações artísticas - teatro, dança, música, literatura etc. -, assim sendo, num determinado momento, trabalhando apenas na prática, pareceu que seria interessante que o Sesc oferecesse um conjunto de informações e de conhecimentos cujo acesso fosse rápido e que desse conta dessa diversidade." O diretor regional Danilo Santos de Miranda, na ocasião do lançamento da obra, esclareceu a intenção do Sesc com mais essa iniciativa: "Nós estamos tentando oferecer uma quantidade de informações efetivas, objetivas e diretas, que dizem respeito ao dia-a-dia da ação cultural, cada vez mais necessária e importante. Trata-se de uma tentativa de oferecer uma série de informações para a população, para os interessados, para a mídia, para as autoridades e para aqueles que lidam com a questão cultural. E o termo 'linguagem da cultura' que aparece no título da publicação refere-se justamente ao jeito como nós atuamos, de maneira escancarada, transparente e aberta".
Um pouco de tudo
Entre os diferenciais dessa obra, em relação aos demais dicionários que se dedicam a esclarecer termos e conceitos relacionados à cultura, está o caráter rede de informações, recheado de links, que a obra oferece ao optar pela abrangência de temas em detrimento da especificação. "Evidentemente, existem dicionários que fornecem conceitos em relação a idéias, movimentos, estilos e mesmo a termos técnicos em diversas áreas", explica Newton. "Mas eles estão, normalmente, separados. Ou seja, o que se encontra são dicionários de teatro, de música, de literatura e assim por diante. Por outro lado, é relativamente difícil - não impossível - achar, nessas obras mais específicas, termos que, na verdade, façam a junção de uma arte com outra." Para citar um exemplo: o interessado achará na obra a explicação do termo "poética" e poderá descobrir também que sua origem se deu primeiramente na área da filosofia. "As primeiras discussões sobre arte vêm daquilo que é chamado poética", explica o técnico. "Começa na Grécia Antiga, onde vários autores se debruçaram em estudar o que é o fenômeno artístico. Isso é algo que você normalmente tem de buscar na filosofia e na História, você não vai encontrar essa discussão num dicionário de teatro. E a idéia desse lançamento do Sesc é justamente permitir uma espécie de pequena viagem introdutória aos conceitos dos quais a arte se utiliza. É por isso que ele se estende por todas as áreas", afirma. No entanto, o intuito da publicação não passa pela idéia de dar um registro definitivo desses conceitos, algo que dispensasse outras fontes de pesquisa. Ao contrário, o objetivo é oferecer o fio da meada. "Não temos a pretensão de substituir pesquisadores da academia ou de oferecer algo que seja completo", volta o diretor regional, Danilo Santos de Miranda. "Mas certamente estamos oferecendo algo com o qual nós lidamos, ou seja, elementos do nosso universo, do nosso dia-a-dia, seja aqui em São Paulo, seja no interior. Verbetes que refletem e discutem essas realidades do cotidiano de nossas equipes técnicas, no seu treinamento e na sua ação. E tudo isso de forma organizada, sistemática e com a intenção de preencher uma enorme lacuna. Uma vez que, é fato, não existem no mercado obras que possam substituir com essa amplitude, com essa quantidade, as referências necessárias não somente para a pesquisa propriamente dita, mas sobretudo para a ação e prática efetivas das pessoas que lidam com ação cultural no cotidiano, seja nas ONGs, nas instituições ou na administração pública."
Colaboradores A escolha dos verbetes se deu, primeiramente, partindo de temas gerais, que permitiram um aprofundamento que chegasse a termos mais específicos. No entanto, mesmo os verbetes que possam parecer óbvios constarem de um dicionário de cultura - como música ou literatura, por exemplo - foram sendo descobertos ao longo do processo. Partiu-se de duas grandes matrizes, por assim dizer: os abrangentes conceitos de "cultura" e "arte". A partir desses dois troncos principais, foram surgindo os galhos, que, por sua vez, davam origem a outros. "Depois de terminado parcialmente o termo 'arte', por exemplo, ficou evidente a necessidade de trabalhar dois outros termos já imediatos: poética e estética", exemplifica Newton. "Desse modo, dentro da literatura, por exemplo, a partir do momento que eu tentei explicar o que seria ela ao longo da História, isso leva a outro verbete, o que se encarrega dos gêneros literários. O livro, na verdade, é uma espécie de labirinto, ou seja, você entra por um corredor, sai em outro e assim vai." Por sugestão de Danilo Santos de Miranda, o dicionário se encarregou também de cobrir - e aí de maneira mais histórica que conceitual - os últimos trinta anos das artes brasileiras. Isso porque agrupamentos artísticos com propostas conjuntas tendem, segundo explicação de Newton Cunha, a desaparecer no final dos anos de 1960, pulverizando conceitos e fazendo surgir nomes que, por si só, representavam movimentos que antes apareciam sob um termo. "A partir dos anos de 1970 praticamente já não existem mais escolas e movimentos artísticos", volta Newton. "É só lembrar, por exemplo, o que aconteceu na música popular brasileira: nós temos a bossa-nova na década de 1950 e o Tropicalismo em 1960, junto com a Jovem Guarda. A partir daí esses movimentos, que incluem um grupo de pessoas defendendo uma determinada estética ou proposta desaparecem. E esse é um fenômeno mundial, não só brasileiro." Assim sendo, tornou-se necessário que, ainda que na falta de um termo comum, fosse possível contar a história do que aconteceu depois. Por esse motivo, o dicionário terminou por trazer ainda mais um diferencial: a colaboração de professores e estudiosos de diversas áreas artísticas para esse apanhado histórico. Dentro disso, o verbete aparece co-assinado pelos professores Dilmar Miranda, especialista em música; Cássia Navas, em dança; Ismail Xavier, cobrindo cinema junto com Leandro Saraiva; Nelly Novaes Coelho, em literatura; Kátia Kanton, em artes plásticas; Maria Isabel Villac, em arquitetura; e Silvana Garcia e Fátima Saadi, em teatro.
Democracia
Nelly Novaes Coelho, escritora e ensaísta literária "O Sesc São Paulo está fazendo um trabalho magnífico com relação à cultura. Ele está dando chance e abrindo espaço para os mais variados campos da cultura. Desde a popular até a erudita, que é o caso deste dicionário, que já entra no mundo da erudição, um mundo que precisa ser conhecido. É um dos grandes trabalhos que o Sesc está oferecendo aos brasileiros; realmente inestimável."
Dilmar Miranda, professor "Eu posso dizer que esse dicionário é uma obra de referência. Qualquer pessoa que milita na área da cultura e das artes hoje - estudantes, professores e pesquisadores - não pode ficar sem esse dicionário. Trata-se de trabalho excelente, minuciosopara o qual eu tive o prazer de ser convidado para colaborar, o que fiz com bastante satisfação. Orgulho-me em ter participado disso. Uma pequena colaboração para uma grande obra."
Ismail Xavier, escritor e ensaísta "A maioria dos dicionários que a gente tem à disposição é muito específica; eles são ou literários, ou teatrais, ou de artes plásticas, ou de música - cinema tem menos -, mas de qualquer maneira a gente tem aqui um volume para consulta que abrange todos os segmentos da arte. O que significa uma contribuição muito original do Sesc São Paulo para a constituição de obras de consulta, de auxílio fundamental para estudantes, pesquisadores, enfim, avançando numa tradição que aqui no Brasil ainda engatinha, que é a produção de obras de referência."
Cássia Navas, professora "Eu acho de fundamental importância; primeiro porque o Sesc São Paulo decidiu fazer isso a partir de uma práxis - de um contato com as questões do dia-a-dia da arte e da cultura com as quais se deparam os técnicos da instituição. É uma coisa bem-vinda nesse sentido: a partir de uma práxis eles teorizaram e, agora, a partir de uma teoria, isso volta à prática. Ou seja, é um círculo que se fecha agora e que, imagino, será uma obra de consulta para vários tipos de gestores culturais. E isso nem sempre acontece assim, dentro dessa dinâmica tão viva. Depois, há a questão de o Sesc ter se lançado em algo que modernamente quase ninguém se lança, que é tentar falar de tudo. A gente vive num mundo ética, social e culturalmente fragmentado, no qual se falam de pedaços das coisas. Os próprios dicionários são assim, chegando às raias da especialização absoluta. E aqui não: a coragem em falar de tudo - ou quase tudo, porque tudo não existe - é uma coisa de se tirar o chapéu."
|