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Foto: Pixabay.

 

Na lista de compras entram comida, roupas, sapatos, livros, utensílios domésticos, aparatos tecnológicos... Mas você já parou para pensar na quantidade e na qualidade do que está comprando? Além disso, de que forma você descarta e reutiliza esse material? Erroneamente, pensamos que jogamos “fora” o que não nos serve mais, quando, na realidade, tudo o que é rejeitado é jogado dentro do planeta – nas águas, na terra, no ar. Segundo o último relatório da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), cada brasileiro gera, aproximadamente, 378 kg de resíduos por ano.

Em São Paulo, 7% é reciclado e 93% vai para o aterro sanitário de acordo com levantamento feito pelo Instituto Lixo Zero Brasil (ILZB). Ou seja: a conta não fecha. Então, de que forma é possível consumir e gerar menos impactos no meio ambiente?

O primeiro passo que determina quantidade e qualidade de resíduos produzidos responde pelo nome de “consumo consciente”. “Entendemos que não existe vida sem consumo, nem consumo sem impacto”, afirma Larissa Kuroki, coordenadora de Conteúdos e Metodologias do Instituto Akatu, organização não governamental sem fins lucrativos que trabalha pela conscientização e mobilização da sociedade para o consumo consciente desde 2001.

“Desenvolvemos o conceito de consumo consciente como sendo o ‘consumo com melhor impacto’.

Isto é, não devemos deixar de consumir ou consumir menos, mas sim fazê-lo de uma maneira diferente, sem excessos, reduzindo os impactos negativos e aumentando os impactos positivos de nossas escolhas de compra para o meio ambiente, a economia, a sociedade e para nós mesmos”, destaca.

No entanto, há muitos desafios para que esse comportamento entre em ação. Segundo a Pesquisa Akatu 2018 – Panorama do Consumo Consciente no Brasil, realizada em 12 regiões metropolitanas, a principal barreira para o consumo consciente é a necessidade de esforço. “Nessa categoria estão contemplados: a mudança de hábitos, a percepção de que os produtos são mais caros, ou que exigem mais informação sobre as questões ambientais e sociais, sendo mais difíceis de encontrar para comprar”, esclarece Larissa. Já a segunda barreira é a desconfiança. Ou seja, “a crença de que de nada adianta fazer a minha parte se os governos e as empresas não fizerem a deles”, acrescenta. 

Exemplos de preconceitos que precisam ser derrubados. "O atual cenário mundial ainda é insustentável, uma vez que chegar a consumir 70% mais recursos do que o planeta é capaz de regenerar em um ano mostra a urgente necessidade de ação para promover a transição para padrões mais sustentáveis de produção e consumo”, aponta Larissa.
 

De acordo com o Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis, entre 800 mil e um milhão de pessoas atuam nessa atividade

 

E na prática?

No dicionário, lixo é definido como: entulho, refugo, sujeira, impureza, detrito. Tudo aquilo que não recebe tratamento e que é encaminhado diretamente para os aterros sanitários. Porém, na prática, nem tudo o que é descartado é, de fato, lixo. Por isso, “um grande desafio é sensibilizar as pessoas sobre o conceito de que lixo é a gente que cria, pois junta tudo”, explica Flávia Lemes Cunha, uma das embaixadoras do ILZB. Ou seja, "se não houvesse a mistura de comidas com plástico, papel higiênico etc., e, se separássemos os recicláveis em papel, alumínio, plástico, papelão e vidro, estes não seriam ‘lixo’ e sim riqueza, porque poderiam ser reaproveitados e inseridos na cadeia produtiva”, complementa.

Organização da sociedade civil autônoma, sem fins lucrativos, pioneira na disseminação do conceito Lixo Zero no Brasil, o ILZB representa no país a Zero Waste International Alliance (ZWIA), movimento internacional de organizações que desenvolvem princípios Lixo Zero no mundo. O objetivo é articular, mobilizar e provocar novas práticas que consistam no máximo aproveitamento e correto encaminhamento dos resíduos recicláveis e orgânicos, bem como a redução – ou mesmo o fim – do envio desses materiais para os aterros sanitários e/ou para a incineração.

Na prática, adotar o conceito Lixo Zero é empregar os três “Rs”: Reduzir, Reutilizar e Reciclar. “Não podemos mais viver a economia linear: extrair, produzir, consumir e descartar. Estamos vivendo um colapso do planeta”, avisa Flávia. De fato, esse mesmo alerta foi feito em julho pela Global Footprint Network, organização internacional pioneira em calcular a “pegada ecológica”, fator que contabiliza o quanto de recurso natural é usado para atender as demandas atuais de consumo de um indivíduo ou população.

No primeiro semestre deste ano, a Terra atingiu o ponto máximo de uso de recursos naturais que poderiam ser renovados sem ônus ao meio ambiente. Isso significa que, a partir de agora, todos os recursos usados para a sobrevivência (água, mineração, extração de petróleo, consumo de animais, plantio de alimentos com esgotamento do solo, entre outros) contribuem para um saldo negativo anual da humanidade com o planeta.

“Não basta só reciclar. Temos que repensar como desenhamos nossos produtos e serviços; como consumir menos e recusar todo produto que não respeita a natureza. Ou seja, vamos dizer: ‘Não quero plástico de uso único’, a exemplo de canudos, copos, sacolas plásticas, isopor”, ressalta Flávia. Em São Paulo, por exemplo, a Assembleia Legislativa aprovou em junho uma lei que proíbe o fornecimento de canudos de material plástico nos estabelecimentos comerciais de todo o estado.

Uma pequena vitória num cenário que ainda demanda mais ações não só do governo, mas também de empresas e da sociedade. “Enquanto continuarmos a consumir produtos com embalagens que não têm como ser reaproveitadas ou recicladas, estaremos dizendo que a indústria pode continuar a fabricá-las”, afirma Flávia.
 


O Brasil produz mais de 11,3 milhões de toneladas de lixo plástico todo ano, mas apenas 1,2% é reciclado, segundo relatório da WWF "Solucionar a Poluição PLástica - Transparência e Responsabilidade".

 

Novos destinos

Além da possibilidade de diminuir o impacto ambiental ao dar um destino correto aos recicláveis, há um importante impacto social que precisa ser considerado. Regulamentada em 2010, a Política Nacional de Resíduos Sólidos inclui o incentivo à criação e ao desenvolvimento de cooperativas e outras formas de associação dos catadores de materiais recicláveis. Ou seja, prover um destino correto ao alumínio, vidro, papelão e plástico, entre outros, também significa gerar empregos para milhares de pessoas.

Segundo estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), com base nos dados do Censo 2010, constatou-se a existência de aproximadamente 388 mil catadores de materiais recicláveis em todo o território brasileiro. Entretanto, o Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR) acredita que entre 800 mil e um milhão de pessoas atuem nessa atividade.

“Essa diferença estaria no fato de que nem todos os catadores respondem ao Censo, pois muitos são moradores de rua ou vivem em regiões de risco e de difícil acesso. Além disso, muitos não assumem a condição de catador. Seja por desenvolverem outras atividades paralelas à catação ou pelo preconceito do qual são vítimas ainda hoje”, explica Alexandre de Souza, analista de projetos da Associação Nacional dos Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis (Ancat).

Visando derrubar esse preconceito, o projeto ReviraVolta, vinculado ao Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos, no bairro Ponte Pequena, zona central de São Paulo, dedica-se à reinserção social e profissional da população em situação de rua como catadores de materiais recicláveis. Para isso, são oferecidas oficinas de cidadania e de educação ambiental durante seis meses. Após esse período, a pessoa pode ser encaminhada para uma cooperativa. Mensalmente, passam pelo programa cerca de 40 a 50 pessoas desde 2013, quando o projeto foi oficializado.

“De modo geral, muitos ainda têm preconceito por trabalhar com resíduo, não reconhecem o valor que ele tem ou realizam esse trabalho porque não restou alternativa. Na sociedade também temos uma fraca educação ambiental, vem muito material contaminado e em condições difíceis de trabalhar”, explica Sheila Costa Marcolino, coordenadora do ReviraVolta.

Apesar dessas dificuldades, o ReviraVolta se orgulha por ter redirecionado um alto percentual de pessoas que viviam em situação de rua e que hoje são membros ou coordenadores de cooperativas. “Pessoas que conseguiram colocar o filho na escola ou que puderam adquirir a casa própria”, comemora Sheila. “Mesmo assim, sabemos que quando há políticas públicas voltadas para o desenvolvimento desses trabalhadores alcançamos ainda mais resultados significativos. E isso pode modificar não só uma vida, mas de tantas outras famílias.”

 

Primeiros passos

Atitudes para aplicar na rotina e evitar a produção de lixo

Quando criança, a catarinense Cristal Muniz observava e repetia o comportamento dos avós e dos pais. “Em casa, sempre separamos o lixo para reciclagem e jogamos o orgânico num cantinho do quintal pra virar adubo”, conta no blog Uma Vida sem Lixo. Criado em 2015, primeiramente com o nome Um Ano sem Lixo, o site já soma três milhões de acessos. Nele, de maneira simples e direta, ela fala sobre seu dia a dia e confessa: sempre usava tudo que consumia até o final, zelava pelo que tinha e optava por objetos usados. Além da página na internet, Cristal – que participa neste mês de uma atividade no Sesc Campo Limpo (leia boxe Menos é mais) – conta sua experiência e dá dicas no livro Uma Vida sem Lixo – Guia para Reduzir o Desperdício na Sua Casa e Simplificar a Vida (Alaúde, 2018).
 

 

Confira algumas atitudes práticas para seu dia a dia:

1 Aprenda a dizer não a:

•  Canetas, bloquinhos de papel, caderninhos, principalmente em eventos;

•  Saquinhos plásticos para carregar compras (leve o seu);

2 Pare de usar descartáveis como:

•  Copos plásticos: tenha sempre uma caneca ou um copo retrátil na bolsa para beber fora de casa sem gerar esse lixo;

•  Canudo: um dos maiores contaminantes de plástico dos oceanos atualmente pode ser trocado por um reutilizável de bambu, inox ou até vidro.

3 Conserte o que tiver estragado antes de descartar. Exemplo: costure o furo, o botão, cole a sola do sapato;

4 Quando precisar de coisas novas, tente comprar roupas, sapatos e acessórios de segunda mão sempre que possível.

(Fonte: www.umavidasemlixo.com)

 

Menos é mais

Programa investe em educação para incentivar a consciência em relação à geração e destinação de resíduos

Criado há nove anos, o Lixo: Menos é Mais compartilha conhecimentos e experiências que possam melhorar a qualidade de vida da atual e das futuras gerações. Para isso, esse programa visa incentivar a minimização de resíduos e a destinação socioambientalmente responsável do que é descartado a partir de ações educativas para o público interno, de funcionários do Sesc, e externo. Neste ano, nos dias 13 e 14 de setembro, serão realizadas diversas atividades em rede com o tema: Histórias Transformadoras.

O objetivo é sensibilizar e informar o público sobre questões que envolvem consumo e geração de resíduos; estimular a percepção sobre a responsabilidade de cada um em relação à geração e destinação de resíduos e promover a difusão de informações a partir do diálogo, das vivências e da troca de experiências.

Antes do descarte, todas as unidades do Sesc São Paulo fazem a pesagem dos resíduos e lançam os dados em um sistema de monitoramento chamado Gestão de Resíduos. Para a destinação ambientalmente responsável desse material, o Sesc possui parcerias com cooperativas e instituições no Estado de São Paulo.

“O Lixo: Menos é Mais foi criado para encontrar caminhos para a minimização e a destinação adequada de resíduos gerados no Sesc.

O mote do programa – ‘sua atitude é transformadora’ – indica que as mudanças necessárias para encontrar esses caminhos pressupõem estratégias de educação permanentes, além da gestão de processos que favorecem a sustentabilidade ambiental”, explica Márcio França, da Gerência de Educação para Sustentabilidade e Cidadania do Sesc São Paulo.
 

Confira algumas atividades deste mês:

CENTRO DE PESQUISA E FORMAÇÃO
Conhecendo a Rota do Lixo Reciclável
O que são estações de reciclagem? E quais os benefícios gerados pela separação de materiais? Nesta atividade é possível conhecer os caminhos do lixo reciclável que você separa e como ele é tratado na Estação de Transbordo Ponte Pequena. Durante a visita às Estação de Transbordo, acontecerá uma palestra no local com a equipe da empresa Loga. Depois, ao retornar ao CPF, os participantes ainda podem participar de uma roda de conversa com Sergio Bispo (foto). Conhecido como Bispo Catador, foi ele quem criou o projeto Kombosa Seletiva, que desenvolve novas práticas de profissionalização para o atendimento em eventos, condomínios, empresas e instituições, no ramo da reciclagem. (Dia 13/9)

 

INTERLAGOS
Oficina de costura
Promovida pela Pano Social, empresa que trabalha com moda sustentável e reinsere ex-detentos no mercado de trabalho, a oficina é voltada para a confecção de bolsas utilitárias, usando tecidos de uniformes descartados. (Dia 14/9)

 

BOM RETIRO
Conserto e reparo de objetos e equipamentos
Nesta atividade, o grupo Café Reparo difunde a cultura hacker com o objetivo de estimular a curiosidade de descobrir como as coisas funcionam e questionar as cadeias de consumo, uso e descarte dos objetos cotidianos. O público é convidado a trazer vestuário, equipamentos eletroeletrônicos e aparelhos diagnosticados sem conserto para reparar, reciclar ou ganhar um destino adequado. (Dia 14/9)

 

CAMPO LIMPO
Reduzir, Reutilizar e Reciclar: entendendo os 3Rs
A fim de conscientizar o público sobre os diferentes impactos que o ser humano causa no meio ambiente, três convidados vão falar sobre ações sustentáveis baseadas nas premissas dos 3Rs: Reduzir, Reutilizar e Reciclar. A escritora Cristal Muniz, criadora do blog Uma Vida sem Lixo, vai falar sobre “Reduzir”, compartilhando dicas objetivas para que todos consigam colocar em prática. Criadora da marca Loyal (foto), movimento de moda periférico a partir do brechó e da customização, Jaqueline Leal vai falar sobre a importância do “Reutilizar”. Enquanto o gestor ambiental Telines Basílio do Nascimento Júnior compartilhará sua experiência como catador por 12 anos, ao abordar o tema “Reciclar”. (Dia 13/9)

 

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