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Editor de humor

Foto: Leila Fugii
Foto: Leila Fugii

Antônio de Souza Mendes Neto, conhecido como Toninho Mendes, é artista gráfico, escritor, poeta e editor. Com uma carreira que passou pelas artes gráficas, diagramação, produção gráfica, edição e direção de arte, iniciou sua trajetória na imprensa alternativa, em jornais como Versus e Movimento. Entre os anos 1980 e 1990, esteve à frente da Circo Editorial, em que reuniu cartunistas e ilustradores como Angeli, Glauco, Laerte, Luiz Gê, Chico Caruso e Paulo Caruso em publicações como Chiclete com Banana, Piratas do Tietê e Geraldão. Atualmente, dirige o selo editorial Peixe Grande, pelo qual publicou os livros Quadrinhos Sacanas, Maria Erótica, Vira Lata, A História da Revista Grilo e E Depois a Maluca Sou Eu, da ilustradora Mariza Dias Costa. A seguir, os melhores trechos do depoimento de Toninho Mendes, no qual ele fala sobre cultura, quadrinhos e produção editorial.


Toninho Mendes esteve presente na reunião do Conselho Editorial da Revista E no dia 4 de dezembro de 2015.


CIRCO

A Circo não foi uma editora de quadrinhos e sim uma editora de humor e quadrinho de humor. Eu tinha o Angeli, o Laerte, o Luiz Gê, o Chico [Caruso], o Paulo [Caruso], o Glauco, além de mim. A gente tinha fama de louco, mas trabalhávamos muito. Gente louca não faz 10 mil páginas com a qualidade que a gente fez.

Na época, havia muito pouco quadrinho na banca, então uma coisa foi levando a outra. A revista Chiclete com Banana permitiu que eu fizesse a Geraldão, do Glauco, por exemplo. Uma revista puxou a outra, mas também foi nesse período que acontecia a inflação, então você vendia todos os exemplares de um número e não conseguia com esse dinheiro comprar o papel da edição seguinte. Nos anos 1990, a editora acabou, mas o que ficou da Circo não foi pouco. Ficaram personagens como a Rê Bordosa, Los Três Amigos, Piratas do Tietê, Dona Marta, entre outros.
 

CHICLETE COM BANANA

Quando fomos fazer o primeiro boneco [simulação da versão impressa de uma revista] da Chiclete com Banana, sentei com o Angeli e conversamos sobre a estrutura da revista. A Chiclete refletia muito a cabeça do Angeli, bastante a minha cabeça e tinha também muito da minha capacidade de realização. O Angeli ficava no estúdio, bolava as coisas, desenhava e vinha tudo para a minha mão. A genialidade do Angeli ficou comprovada ali. É muito difícil um autor de 30 anos fazer uma revista sozinho. Cada número tinha um convidado, como Luiz Gê, Laerte, Glauco, mas a capacidade de trabalho do Angeli era enorme.

A gente nunca se permitiu censurar nada. A primeira edição da Chiclete com Banana vendeu 28 mil exemplares e foi uma surpresa para todo mundo. Tinha o “Bob Cuspe para prefeito” na capa e foi naquele momento que a gente começou a testar os limites da abertura. Foi a primeira vez que alguém fez uma esculhambação desse tamanho, mas a gente não tinha vindo para explicar e sim para esculhambar. Se eu colocasse as revistas na banca hoje, talvez tivesse uma reação ‘superadversa’, porque houve um encaretamento do mundo.
 

LOS TRÊS AMIGOS

Ter três cartunistas [Angeli, Glauco e Laerte, que criaram e inspiraram os três personagens dos quadrinhos Los Três Amigos] trabalhando em uma mesma história foi um dos momentos mais misteriosos da história em quadrinhos universal. Eu, como testemunha ocular, sei bem como as coisas eram feitas. O processo de criação era inexplicável. Todo mundo era mais leve, mais divertido, menos amargo, então era uma palhaçada. Eles trabalhavam, normalmente, uma ou duas vezes em uma história, em reuniões de três, quatro horas.

Para criar, eles trabalhavam em três, sentavam e faziam um rabisco rápido, desenvolvendo a história mais ou menos juntos. Depois, havia duas formas de a história ser desenhada. Às vezes, o Glauco desenhava tudo que era dele naquela história, passava para o Angeli, que fazia a sua parte, e a arte final ficava com o Laerte. Em outras vezes, quando o cenário era mais importante, era feito o esquema contrário, e aí o Laerte desenhava tudo menos os bonecos dos outros.
 

CENÁRIO ATUAL

Existem dois momentos muito claros na história do humor ligado ao quadrinho e do humor ligado à imprensa, que são o Pasquim e a Circo. De alguma forma, essas pessoas tinham muito que dizer, que criticar, observar, sacanear.

Nos últimos 20 anos, houve uma mudança no perfil da imprensa, na qual o espaço para isso é muito pequeno, e existe o processo de desenhistas brasileiros trabalharem no exterior, fazendo super-heróis americanos. Além disso, há também o processo irreversível da internet e o fato de que todo mundo pode desenhar muito mais facilmente. É uma realidade nova no mundo.