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Ter menos, compartilhar mais

Foto: MUDA-SP (Movimento Urbano de Agroecologia de São Paulo) - Foto Circuito Fora do Eixo
Foto: MUDA-SP (Movimento Urbano de Agroecologia de São Paulo) - Foto Circuito Fora do Eixo

TER MENOS, COMPARTILHAR MAIS

Em meio a um modelo altamente consumista, a economia colaborativa ganha adeptos como alternativa de uso criativo de recursos e valorização dos laços sociais


Ensinar bordado em troca de aulas de inglês, pedir ao vizinho uma pipoqueira emprestada, trocar brinquedos que já perderam a graça por outros diferentes, jantar na casa de um chef de cozinha. Práticas desse tipo podem até parecer mais comuns em cidades pequenas, mas têm ocorrido com frequência em centros urbanos como São Paulo. Graças às facilidades tecnológicas, a chamada economia colaborativa – na qual se tem como foco o consumo coletivo, as trocas ou empréstimos – ganha adeptos como alternativa para quem busca ter menos e compartilhar mais.

Na capital paulista, há no mínimo cem iniciativas baseadas na economia compartilhada, em áreas como cultura, mobilidade, alimentação e moradia, segundo um mapeamento feito pelo Global Intelligence Group no Guia São Paulo Cidade Colaborativa 2015. Entre os exemplos, há desde escritórios de uso compartilhado até hortas comunitárias e mesas de pingue-pongue públicas. Na opinião do economista e professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Ladislau Dowbor, a proliferação dessas iniciativas indica uma mudança social: “A ideia de posse vai sendo pouco a pouco substituída pela ideia de compartilhamento e acesso. É a mudança de uma visão da sociedade que procura consumir de maneira mais inteligente e criativa. Se tenho uma piscina que não uso, por exemplo, por que não compartilhar o bem com meus vizinhos?”.

Apesar de diversas práticas fazerem parte da economia colaborativa ou compartilhada, há nuances dentro do mesmo modelo. Segundo a economista e consultora em economia criativa Ana Carla Fonseca Reis, é possível apontar algumas variáveis básicas: aquelas em que há pagamentos e não se coloca a ideia de posse em questão, como é o caso de quem aluga temporariamente um quarto de casa; as que trabalham com a ideia de posse compartilhada, como nos grupos de pessoas que se reúnem para comprar um bem em conjunto; e as que valorizam o acesso e não a posse, seja por meio de transações monetárias ou não, como no caso de redes de empréstimo, uso compartilhado ou trocas de produtos e serviços. Como exemplo do último tipo, estão iniciativas como o Tem Açúcar, site no qual é possível localizar gratuitamente pessoas que possam emprestar algo de que você esteja precisando – desde a tradicional xícara de açúcar até uma furadeira ou um carregador de celular.

A antropóloga Hilaine Yaccoub, especialista em antropologia do consumo, lembra que, apesar de a tecnologia ter colaborado para um resgate de redes de compartilhamento desse tipo, elas já existem desde que nos organizamos como sociedade. “O que acontece é que, hoje, muitas pessoas têm buscado um retorno a esse consumo mais coletivo e menos individual”, afirma. Hilaine acrescenta que em certas comunidades a economia compartilhada é peça fundamental há muito tempo. Durante suas pesquisas, ela morou quatro anos na favela da Barreira do Vasco, no Rio de Janeiro, onde percebeu a existência de redes para compartilhamento de utensílios domésticos, água, comida, veículos, serviços em geral e até para cuidados de crianças e idosos. Lá, a economia colaborativa, segundo observou Hilaine, já faz parte da rotina: “Sem perceber, comunidades da favela estão na vanguarda do consumo colaborativo”.
 

Tecnologia a favor

A economia colaborativa faz parte de uma mudança nos processos produtivos de modo geral, contextualiza Ladislau. “A economia tem se tornado imaterial. Prova disso é que hoje, em qualquer aparelho eletrônico, a maior parte do valor é o conhecimento incorporado, que é o principal fator de produção atual”, analisa. “Isso muda a lógica econômica e abre um imenso potencial de processos colaborativos. Repassar conhecimentos adiante não gera custos extras, por exemplo”, completa.

A professora de Economia na Era Digital da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP) e coautora de Empresas e Consumidores em Rede: um Estudo das Práticas Colaborativas no Brasil (Annablume, 2013), Dora Kaufman, explica que as tecnologias digitais e as redes sociais são centrais para entender o crescimento da economia colaborativa. “Se antes os indivíduos compartilhavam objetos e serviços de maneira mais restrita em seus círculos mais próximos, hoje as redes digitais promovem essas mesmas práticas em dimensões maiores, envolvendo participantes que nem sempre conhecemos”, compara. “As redes sociais digitais não só impulsionam as práticas colaborativas ao oferecer suas plataformas, como também trazem uma dimensão inédita, minimizam os fatores geográficos e temporais das comunicações, privilegiam os interesses e as habilidades dos participantes em detrimento a padrão de vida, gênero, cor, idade etc.”

Se podemos estar diante de uma revolução no consumo e se a ideia de colaboração algum dia será tão forte quanto a de compra, não é possível prever, diz Dora. “Existem pensadores que advogam que está se desenvolvendo, em paralelo à economia industrial, uma nova forma de geração de valor que passa pelas redes colaborativas em suas distintas modalidades”, explica. A pesquisadora informa que não se pode antecipar o resultado disso em longo prazo. “Atualmente, a economia colaborativa me parece uma prática que as pessoas estão reconhecendo como um valor positivo e que vem sendo adotada por indivíduos engajados em contribuir para uma sociedade mais igualitária, menos consumista e mais humana.”

 

POR ONDE COMEÇAR?

Uma lista de sites que facilitam a vida de quem quer participar dos círculos de compartilhamento
 

Quintal de trocas
quintaldetrocas.com.br
Site para troca de brinquedos, em que a criança envia fotos e uma cartinha contando sua história com um brinquedo, e escolhe outro para efetuar a troca.

 

Eat with
eatwith.com
Plataforma presente em diversos países, em que chefs de cozinha organizam refeições abertas ao público em suas próprias casas, em troca de valores mais em conta que o de restaurantes.

 

Tem açúcar?
temacucar.com
Site em que é possível pedir objetos, encontrar vizinhos que podem emprestar coisas, combinar as condições e avaliar a experiência depois.

 

Descola aí
descolaai.com
Plataforma para conectar pessoas dispostas a emprestar ou trocar objetos ou serviços. É possível atribuir notas aos participantes, avaliando o índice de confiança dos usuários.

 

Muda SP
muda.org.br
Em busca de uma nova maneira de viver na cidade, promove o mapeamento da criação de hortas comunitárias e de redes de consumidores de produtos orgânicos. 

 

 

DESAPEGO

Com diferentes produtos, feiras de trocas nas unidades unem sustentabilidade e socialização

Feira de Troca de Brinquedos
Sesc Itaquera
28/2, das 14h às 16h
As feiras de troca possibilitam entrosamento e socialização entre as crianças, de forma divertida. Muito mais do que trocar brinquedos, a experiência é enriquecedora por dar novos significados a objetos antigos e afirmar que as relações não precisam ser pautadas na compra.

 

Troca de Livros e Brinquedos
Sesc São Caetano
Último domingo de cada mês, das 9h30 às 13h30
Junto da programação da Rua de Lazer realizada todo último domingo de cada mês na Av. Kennedy, acontece uma feira de troca de brinquedos e livros.

 

Feira de Troca de Livros
Sesc Piracicaba
27/2, às 10h
Espaço para a troca de livros usados e fruição literária, com mediação do especialista em literatura e professor Mario Martinez, que, além de indicar boas leituras, lê para o público alguns trechos dos livros expostos para a troca.

 

Feira de Troca de Camisas de Futebol
Sesc Interlagos
Domingos até 14/2, das 10h às 16h
Uma oportunidade de obter a camisa que falta para a coleção e ainda conhecer um pouco mais sobre a história do futebol.