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Des|complicando o feminismo

Ilustração por Evelyn-Queiróz/Negahamburguer
Ilustração por Evelyn-Queiróz/Negahamburguer

Ano vai, ano vem, e a história é sempre a mesma. No dia 8 de março, conhecido como Dia Internacional da Mulher, a oferta de chocolates, flores, perfumes e outros presentes considerados “femininos” aumenta consideravelmente. A data, que deveria ser marcada relembrando a luta, resistência e militância de mulheres que fizeram história em busca da igualdade de gênero, é capturada pela publicidade e mercado, transformando-se em um dia comercial e lucrativo.

Com o objetivo de relembrar o significado real desta data e endossar discussões sobre igualdade de gênero e feminismo, o Sesc Santana realiza o projeto De|Generadas, que acontece entre 5 e 28 de março. A palavra degenerada possui a essência do projeto que nomeia: as características das mulheres exigidas pela sociedade foram modificadas – degeneradas – por aquelas que acreditam serem donas de si. Através de ciclos de conversas, performances, exibições de filmes e feira de produtos alternativos, a programação pretende oferecer ao público um panorama de práticas que atravessam o ativismo feminista.

Ainda se faz necessária a discussão sobre os direitos da mulher? Com quais modelos construímos nossas identidades? De que modo esses temas se ligam à recente produção cultural? Essas são questões que as atividades pretendem debater com as participantes, buscando empoderar mulheres e incentivá-las ao ativismo e militância feministas.

“Uma instituição como o Sesc atrai um público diverso, que dificilmente a universidade é capaz de atingir. Este é um público que, muitas vezes, nem as ações de extensão das universidades, nem as militantes virtuais conseguem atrair. Ao tratar de feminismo, o Sesc contribui para uma mudança no cotidiano de várias pessoas, principalmente mulheres”, diz Lola Aronovich, professora de Literatura em Língua Inglesa, autora do blog Escreva Lola Escreva e integrante da primeira mesa de debates, “Caminhos e legados”. Para ela, é importante que as pessoas que tenham uma visão distorcida do feminismo, endossada pela mídia, tenham o contato com o ativismo feminista a partir das programações. “Se o projeto for bem sucedido, as mulheres sairão de cada atividade no mínimo mais empoderadas, mais fortes e confiantes”, completa.

O dia 8 de março deve ser lembrado, não com flores e frases bonitas sobre como é bom e especial ser mulher (somente no dia 8, é claro!), e sim com discussões a respeito da igualdade de gênero, dos direitos das mulheres e de sua liberdade enquanto indivíduo, capaz de tomar decisões e fazer escolhas a respeito de seu corpo e sua vida. Devemos lembrar que queremos e lutamos por uma sociedade menos patriarcal e machista, que veja tanto mulher quanto homem como seres humanos, independentemente de sua identidade de gênero, orientação sexual, cor e classe social.

Muitas conquistas foram alcançadas – direitos ao voto, ao estudo, ao trabalho remunerado – mas o caminho ainda é longo e árduo. A legitimação do crime de feminicídio – para punir os assassinatos por questões de gênero, - a descriminalização do aborto – oferecendo o poder de escolha à gestante, que é a única a falar com propriedade sobre o impacto de um filho na sua vida, - a equivalência de salários – um recorte de gênero no senso do IBGE 2010 aponta que mulheres possuem maior escolaridade que homens e, mesmo ocupando cargos idênticos, ganham menos, - o fim da dupla jornada e da objetificação do corpo feminino, bem como a extinção do padrão estético, causador de tantas mortes e distúrbios psicológicos, são apenas alguns dos muitos direitos que ainda precisamos conquistar.

Busca-se, em ato libertário e simbólico, ressignificar a cultura vigente e abrir espaços para a igualdade. Se apenas da insubordinação pode vir a liberdade, degeneradas é o que todas desejamos ser.

Programação

Na primeira mesa de debate, “Caminhos e legados”, formada por Clara Avernuck, Lola Aronovich e Maria Lygia Quartim, será apresentado um panorama histórico de lutas pelos direitos da mulher e uma reflexão sobre o atual momento do ativismo feminista. Clara Averbuck é escritora, tem 7 livros publicados e já teve a obra adaptada para teatro e cinema. Foi uma das pioneiras da blogosfera brasileira, tendo iniciado sua trajetória literária publicando os seus textos na Internet. Hoje edita o site Lugar de Mulher. Lola Aronovich é, desde 2008, autora do blog Escreva Lola Escreva, maior blog feminista do país. É mestre e doutora em Literatura em Língua Inglesa pela Universidade Federal de Santa Catarina. Maria Lygia Quartim é socióloga, doutora em ciência política pela USP. Perseguida pela ditadura militar, exilou-se no exterior. Retornou ao Brasil em 1975 e foi uma das fundadoras do grupo feminista Nós Mulheres. É professora titular de Sociologia da Unicamp e pesquisadora do Núcleo de Estudos de Gênero – Pagu.

O segundo encontro, “Corpo e autonomia”, falará sobre o controle dos corpos femininos nos campos estético, sexual e comportamental, apresentando relatos e experiências de libertação e empoderamento. Participam dele, Adriana Facina, Bárbara Castro, Bruna Silveira e Nádia Lapa. Adriana Facina é graduada em História pela Universidade Federal Fluminense e doutora em Antropologia Social  pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde hoje é docente. Atualmente pesquisa produção cultural e práticas de letramento em favelas cariocas. Bárbara Castro é socióloga, membro do Instituto Think Olga, que nasceu do desejo de criar uma conversa mais honesta e acessível com as mulheres e criar conteúdo sobre o universo feminino livre de estereótipo. O instituto também criou e organizou a campanha Chega de FIU FIU contra o assédio sexual de mulheres em espaços públicos. Bruna Silveira é membro da Casa de Lua, ONG feminista que surgiu em 2013, com o propósito de despertar o feminino no mundo, valorizar as práticas de cuidado cotidianas e criar condições para as mulheres serem. Com graduação pela FMABC e residência pela USP, Bruna é pós-graduanda de Homeopatia pela ABRAH e militante da Consulta Popular. Nádia Lapa é jornalista, especializada em gênero e sexualidade pela UERJ e pós-graduanda em Educação Sexual pela Unisal. Nasceu em Manaus (1979) e publicou o livro Cem Homens em Um Ano em 2012, com as histórias do seu blog homônimo. Escreve a coluna Feminismo pra quê? na Carta Capital.

A terceira mesa, “Desvelando identidade – mulheres negras”, é formada por Giselle dos Anjos Santos, Regyany Silva e Rosana Paulino. O debate tratará da representação da mulher negra na mídia e nas artes, trazendo experiências de opressão e empoderamento para a discussão. Giselle dos Anjos Santos possui mestrado em Estudos Interdisciplinares sobre mulheres, gênero e feminismo pela Universidade Federal da Bahia, onde desenvolveu a dissertação “Mulheres negras em Cuba: representações sociais em tempos de crise (1990-2012)”. Além disso, é autora da publicação “Somos todas rainhas”, sobre a história das mulheres negras no Brasil. Regiany Silva é designer, moradora da zona leste, uma das integrantes do coletivo Nós, mulheres da periferia e correspondente comunitária do Blog Mural. Rosana Paulino é artista visual com produção ligada à questões sociais, étnicas e de gênero. Especialista em gravura pela London Print Studio, atualmente é doutora em Poéticas Visuais pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP). Seus trabalhos têm como foco principal a posição do negro e, principalmente, da mulher negra dentro da sociedade brasileira.

O último debate, “(Des)construções, gênero e representação”, traz discussões sobre a cultura patriarcal, experiências educacionais e políticas públicas para construção de uma cultura e sociedade mais igualitária. Participam da mesa Lin Arruda, Michele Escoura e Sylvia Cavasin. Lin Arruda é ativista lésbica transgênero. Se formou em artes visuais pela UNICAMP e pela Universidad Politécnica de Valencia, é mestre em Teoria crítica e história da arte pela USP.  Pesquisa o imaginário contra-artístico dissidente em projetos como  os fanzines Sapatoons Queerdrinhos, Monstrans: experimentando horrormônios e Transtorno de Anomalin. Michele Escoura é antropóloga, doutoranda pela UNICAMP e mestre pela USP. Pesquisadora da área de gênero e sexualidade, desenvolveu estudo sobre a relação entre as Princesas Disney e os referenciais de feminilidade entre crianças pequenas. É ainda ativista na área de direitos humanos e educação em sua atuação na ONG Ação Educativa. Sylvia Cavasin é cientista social, fundadora e coordenadora de projetos da ONG ECOS – Comunicação em Sexualidade e coordenadora da REGES – Rede de Gênero e Educação em Sexualidade. É autora e coautora de materiais sócio-educativos em educação para a sexualidade, saúde sexual e saúde reprodutiva, relações de gênero e diversidade sexual.

A programação completa do projeto pode ser encontrada no portal do Sesc São Paulo, bem como no evento do facebook. Curta, compartilhe e venha discutir feminismo e igualdade no Sesc Santana!

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