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Luis Fernando Verissimo
Luis Fernando Verissimo
O carisma da PALAVRA
Um dos escritores mais lidos do país, Luis Fernando Verissimo acredita ser possível tratar de qualquer assunto com leveza
A crônica que ao ser lida parece contada ao pé do ouvido. É dessa forma que Luis Fernando Verissimo formou sua plateia de leitores fiéis, que o acompanham seja nos jornais em que colabora seja nos livros que escreve. Desde a estreia como escritor, aos 37 anos, com O Popular (1973) – uma coletânea de textos publicados na imprensa –, não parou de contribuir para a literatura brasileira. Algumas de suas obras já são consideradas clássicas, além de ganharem o imaginário nacional ao serem adaptadas para a TV, como Ed Mort e Outras Histórias (1979), Comédias da Vida Privada (1994), As Mentiras que os Homens Contam (2000).
Apaixonado pela música, Verissimo toca sax no grupo ¿Jazz 6 – que na verdade é um quinteto. O tema também foi parar no papel, com a publicação do livro Jazz (2012).
Entre paixões cotidianas e o humor atento de quem não deixa escapar um detalhe, Verissimo continua maestro de sua arte, regendo com simplicidade a matéria-prima de seus livros, o carisma e a palavra. “Às vezes, a crônica é mais difícil de escrever do que o romance. Sempre comparo a crônica ou o texto curto à situação de estar num veleiro. Na verdade, um veleiro no qual nós mesmos dominamos as velas, o leme e tudo mais”, diz. “O romance eu comparo a um transatlântico, um navio cheio de personagens, no qual precisamos de técnica para fazer que cheguem ao ponto que queremos.”
Como se pode ver, parte desse carisma está presente neste depoimento concedido à Revista E.
Eu não pensava em ser escritor
Até os 30 anos eu não tinha bem definido o que faria da vida e nenhuma ideia em ser escritor. Já estava casado e tinha uma filha, mas não tinha um caminho definido.
Quando me convidaram para fazer um teste em jornal, comecei a trabalhar, eventualmente, em um espaço assinado e descobri minha vocação. Não vou dizer que tive uma formação literária, mas o fato de ser filho de escritor determinou que eu vivesse num ambiente em que o livro era importante. E, por causa disso, sempre fui um grande leitor. Quando comecei a escrever, mais ou menos sabia como se fazia aquilo, mas até os 30 anos não tinha nenhuma ideia de ser escritor e muito menos atuar como jornalista. Ser filho do Érico Verissimo me ajudou. Fui convidado para trabalhar no jornal de Porto Alegre por um amigo do meu pai. E o fato de ter um sobrenome conhecido obviamente abriu algumas portas ou pelo menos criou alguma curiosidade nas pessoas.
Permanência da crônica
Às vezes, a crônica é mais difícil de escrever do que o romance. Sempre comparo a crônica ou o texto curto à situação de estar num veleiro. Na verdade, um veleiro no qual nós mesmos dominamos as velas, o leme e tudo mais. O romance eu comparo a um transatlântico, um navio cheio de personagens, no qual precisamos de técnica para fazer que cheguem ao ponto que queremos.
A crônica não precisa, necessariamente, ter humor, porém as que fazem uso do humor são as mais atraentes. Penso que podemos tratar de qualquer assunto escrevendo de uma maneira mais leve.
Há uma história que eu sempre conto: ao ser entrevistado por uma repórter em Ouro Preto, ela me perguntou qual era o gérmen de uma crônica. E no fim da entrevista pediu que eu autografasse um livro, mas, antes de me entregar, escreveu: Luis, a sua braguilha está aberta. Foi a maneira que ela encontrou de me dizer que eu havia feito toda a entrevista com o zíper da calça aberto. Logo pensei que o episódio viraria uma crônica. Então, o gérmen de uma crônica pode ser até uma braguilha aberta. Qualquer assunto é assunto.
Projetos e rascunhos
Publiquei Os Últimos Quartetos de Beethoven e Outros Contos (Editora Objetiva, 2013) e não tenho nada planejado. Só continuar a escrever para os jornais. Mas acabou de ser lançado o programa de televisão chamado Amor Veríssimo, inspirado em minhas crônicas sobre o amor, o que eu achei muito engraçado, porque normalmente eu escrevo contra o amor. São casais se separando, brigando, mas eles conseguiram encontrar crônicas de amor entre os meus textos, as quais serão base para o programa.¿Sobre os desenhos, sempre penso no Millôr Fernandes, que foi não só um grande humorista, mas um grande pensador brasileiro. Entre todos os seus talentos estava o de desenhar. O meu desenho é rudimentar. Quando comecei a ter espaço no jornal, eventualmente, quando não havia inspiração para escrever o texto, eu desenhava. Comecei com a “tira das cobras”, que durou bastante tempo, até que me dei conta de que estava chegando aos 60 anos e não ficava bem um homem de 60 anos desenhar cobrinhas. Hoje eu faço a Família Brasil, publicada no Estadão e no Zero Hora. Continuam sendo desenhos simples e o que conta neles é o texto. Quando me perguntam, costumo dizer que é um desenho funcional.
“A crônica não precisa, ¿necessariamente, ter humor, ¿porém as que fazem uso do humor são as mais atraentes”