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Memórias das formas

fotos: Adriana Vichi

A história de São Paulo está representada na memória arquitetônica da cidade. Cada construção que ainda persiste sólida diz respeito a uma época e um contexto social que se interpõem na visão dos que passam pelas ruas. A capital especializou-se em reunir estilos variados num mosaico que aproxima o cidadão de suas origens.

O centro é o local que ainda mantém o passado quase intacto – ao transitar pela Rua Direita, Praça da República e Luz, conseguimos imaginar a participação de muitos imigrantes na reorganização do espaço público e arquitetônico da cidade. Como não lembrar da influência modernista ao olhar para os principais arranha-céus localizados na região? Influência marcada pela atuação de Le Corbusier no país em diálogo com arquitetos como Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Rino Levi, entre outros que aportavam na metrópole.

A memória está ligada diretamente à noção depreservação desse mesmo espaço urbano. Sem ações diretas nesse sentido, realizadas pelo governo em consonância com a população, a cidade tende a se transformar em um espaço ligado somente aos interesses econômicos, a exemplo dos edifícios corporativos que se multiplicam. “A arquitetura é um reflexo direto de um determinado contexto cultural vinculado a uma macroestrutura econômica.

Essas forças políticas são combativas e se reportam por meio dos edifícios e ruas que são alterados ou demolidos em detrimento de outros”, afirma o arquiteto Diego Matos. Até os anos de 1920, São Paulo era provinciana, ligada à economia do café. Foi a partir de 1930, com a atuação do engenheiro Prestes Maia na prefeitura, que a cidade deu início a um novo traçado, com um estudo de plano de avenidas e os primeiros edifícios altos.

“A cidade enfrentava problemas de trânsito por conta dos primeiros automóveis, e as ruas eram curtas. Prestes Maia propõe um projeto de circulação de anéis e vias expressas que permitiam o deslocamento sem que fosse necessário utilizar o centro”, explica a arquiteta e doutoranda pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP) Sabrina Fontenele, coordenadora, junto a Diego Matos, do curso sobre Prédios Personagens (ver boxe Cinco estrelas).

A partir daí, São Paulo se expande e há o incentivo à verticalização. “Foi permitida a construção do edifício Itália naquela altura (45 andares) por conta da ?negociação da prefeitura em construir grandes avenidas. O Prestes Maia também atuava diretamente com a iniciativa privada e ela estava começando a aceitar a arquitetura moderna no Brasil”, complementa Sabrina. A seguir, confira um pouco da história de São Paulo contada por meio de prédios que são verdadeiros personagens da cidade.

Edifício Sampaio Moreira: considerado o primeiro arranha-céu a romper com o padrão horizontal do centro velho, faz parte da memória afetiva da cidade.

Edifício Martinelli: projetado por Willian Fillinger e pelo italiano Giuseppe Martinelli em 1929, ?está localizado na Rua São Bento, um dos  pontos-chave da capital.

Edifício Ipiranga (antigo Hotel Hilton): A imponente arquitetura moderna serviu de cenário para um dos mais famosos hotéis da década de 70. Projetado em 1971 por Cristiani Nielsen.

Edifício Itália: Projetado pelo arquiteto Adolfo Franz Heep. Símbolo do desenvolvimento industrial de São Paulo durante a decáda de 1960.


Cinco estrelas

Alguns edifícios ícones carregam um pouco da história da capital

O projeto Prédios Personagens ocorre no Sesc Vila Mariana desde setembro, com o intuito de despertar no público um olhar mais atento aos marcos históricos da cidade. Foram mapeados 20 prédios do centro de São Paulo, entre eles, edifício Copan; antigo Hotel Hilton; edifício Altino Arantes (Banespão), para serem visitados em um passeio no dia 1º deste mês.

A atividade inclui a distribuição de um folheto com as 20 imagens desses prédios protagonistas feitas pela desenhista Andrea Aly, que os reproduziu com um traçado muito especial, além de apresentar ficha técnica com texto crítico dos arquitetos Sabrina Fontenele e Diego Matos. O projeto também é composto do curso Marcos da Arquitetura Eclética e Moderna de São Paulo, um recorte que proporciona a reflexão sobre as diferentes formas e estilos na malha edificada da metrópole e sobre o impacto da urbanização gerado pela presença desses edifícios na cidade.

Os arquitetos serão os orientadores do curso, que segue até o dia 4 de outubro. Outro desdobramento se deu por meio da série Foco e Pensamento – espaço dedicado à discussão e prática fotográfica que já dura cinco anos na unidade. Foco e Pensamento/ Paisagem, Arquitetura e Memória integra o projeto Prédios Personagens ao propor a discussão sobre a imagem fotográfica e a memória, por meio da arquitetura da cidade.

O fotógrafo Renato Negrão está à frente do curso, que vai até o dia 5 de outubro. “Há em São Paulo a ideia de que qualquer resquício de passado representa atraso. Nossa compreensão é a de que preservar de maneira inteligente esse patrimônio faz pensar nossa condição de cidadãos. E preservar é fazer com que esses edifícios continuem vivos, atuantes na cena cultural, e não transformá-los em construções inatingíveis”, define João Paulo Guadanucci, coordenador do Núcleo da Imagem e da Palavra do Sesc Vila Mariana.